O belo-horizontino que cruza a Avenida Afonso Pena e não admira a arquitetura da cidade está perdendo uma vitrine a céu aberto que ajuda a contar a história da capital mineira. No Centro de Belo Horizonte, há pelo menos quatro estilos de construções com características bem distintas. Todos carregados de memórias.
Belo Horizonte foi idealizada com o início da República para ser a nova capital de Minas Gerais. Para isso, engenheiros e arquitetos chefiados por Aarão Reis planejaram a nova cidade com uma proposta arquitetônica bem definida. Década após década, novos estilos foram incluídos. E, atualmente, uma caminhada em linha reta de pouco menos de um quilômetro, entre a Praça Sete e o Palácio das Artes, revela construções de quatro estéticas da arquitetura: ecletismo, art déco, protomodernismo e modernismo.
Professor da pós-graduação de arquitetura na PUC Minas e PhD pela Universidade de Lisboa, o arquiteto Ulisses Morato tem chamado a atenção para esse novo olhar sobre o patrimônio arquitetônico do Centro de BH. Desde 2022, ele promove passeios que resgatam histórias esquecidas da capital mineira. Uma aula a céu aberto sobre a paisagem urbana presente na vida de milhares de pessoas que circulam pela Afonso Pena todos os dias.
"Oferecer uma visão mais ampla sobre a história da arquitetura faz com que a gente possa ter um novo olhar para o nosso patrimônio, valorizar e até questionar as qualidades e potencialidades das novas construções", afirma o arquiteto. Os passeios organizados por Morato pelo passado e o presente de Belo Horizonte incluem roteiros também pela Praça da Liberdade, Boa Viagem e Rua da Bahia.
Ecletismo
Detalhes e decorações em excesso deram ao estilo eclético a fama entre os modernistas de "bolo de noiva". Isso porque o ecletismo resgata referências de arquiteturas passadas em suas obras, como a arquitetura greco-romana e a estética gótica.
Nessa estética historicista, muitas vezes as colunas abrangem mais que dois pavimentos e os projetos são repletos de detalhes e cores. Na capital mineira, são exemplos do ecletismo:
- Banco Hipotecário e Agrícola (Atendimento integrado UAI): projeto de 1922, do arquiteto italiano Luiz Olivieri
- Câmera-Sete (Casa da Fotografia de Minas Gerais): construída em 1925 pelos arquitetos cariocas Antônio Cavalcanti e Roberto Magno de Carvalho
- Igreja São José: inaugurada em 1912, projetada pelo arquiteto Edgard Nascentes Coelho
- Condomínio Álvaro José dos Santos (Castelinho): inaugurada em 1920, a obra é do português Antônio da Costa Christino
- Automóvel Clube de Minas Gerais: projetada em 1927 pelo arquiteto Luiz Signorelli
- O Tribunal De Justiça: inaugurado em 1912, projetado pelo italiano Raphael Rebecchi
Art déco
Simetria pode definir o art déco, que na arquitetura se caracteriza pela valorização das formas cúbicas, com um destaque para os contornos lineares bem marcados, tanto na horizontal, quanto na vertical. Esses detalhes nas construções são marcados por meio de janelas retangulares, intercaladas a grandes espaços de parede/concretos também priorizando a forma. Mantendo assim a harmonia entre os elementos.
A palavra art déco é uma redução de arts décoratifs, expressão resultante da Exposição Internacional de Artes Decorativas e Industriais Modernas de 1925, em Paris. No Brasil, o estilo ganha traços nacionalistas, representados por ícones e esculturas, como uma das principais características.
Em BH, o período de maior incidência do art déco foi nas décadas de 1930 e 1940, sendo o segundo estilo a se manifestar na capital mineira. No Centro de BH, algumas construções se destacam no art déco:
- Cine Theatro Brasil: inaugurado em julho de 1932, projetado pelo arquiteto mineiro Ângelo Murgel
- Edifício Acaiaca: inaugurado em 1949, projetado pelo arquiteto mineiro Luiz Pinto Coelho
- Antigo Museu do Telefone: construção da década de 1930, projetado pelo arquiteto Romeo de Paoli
- Antigo Palácio da PBH: inaugurado em 1937, projetado pelo italiano Raffaello Berti em parceria com o mineiro Luiz Signorelli
Protomodernismo
Entre o art déco e o modernismo está o protomodernismo, que na transição de um estilo para o outro apresenta características de ambos os modelos. Foi o terceiro estilo arquitetônico a se manifestar em BH.
A simetria entre os contornos horizontais e verticais é mais flexível e nessa sutil ruptura com o estilo passado, a criatividade com outras formas geométricas começam aparecer. Novas tecnologias e materiais também começam a se manifestar. No Centro de BH é possível ver o estilo protomodernismo nas seguintes construções:
- Brasil Palace Hotel: projetado em 1941 pelo arquiteto mineiro Luiz Pinto Coelho
- Edifício Sulacap-Sulamérica: inaugurado em 1947, projetado por Roberto Capello
- Sede dos Correios: projetado em 1936 por José Story dos Santos
Modernismo
Quarto estilo a se manifestar em Belo Horizonte, o modernismo teve origem na Europa e Estados Unidos, no início do século 20. As influências da estética chegaram à arquitetura da capital mineira a partir da década de 1930.
Entre as características do estilo moderno, se destacam a criatividade ao explorar todas as formas geométricas e o abstracionismo, completa ruptura com o passado e pouca cor. Metais e painéis de vidro são elementos apresentados nessas construções. Além disso, os telhados são substituídos por terraços planos.
São exemplos da arquitetura moderna no Centro de BH:
- Edifício Clemente Faria (antigo Banco da Lavoura): projetado em 1946 pelo arquiteto Álvaro Vital Brasil
- Edifício Helena Passig: construção de 1953, do mineiro Raphael Hardy Filho;
- Banco Mineiro da Produção (atual P7 Criativo): imóvel projetado por Oscar Niemeyer, em 1953
- Edifício Joaquim de Paula: projetado em 1955 pelos mineiros Ulpiano Nunes Muniz e Oswaldo Santa Cruz Nery
- Edifício Guanabara: projetado em 1954 por Tarcísio Silva
- Edifício Bandeirantes: projetado em 1958 pelo arquiteto paulista Álvaro Vital
- Centro de Atendimento ao Turista: o antigo abrigo de bondes foi construído no início de 1950, por Tarcísio Silva