(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas CONSTRUÇÃO CIVIL

Desabamento no Planalto completa 1 ano sem respostas; relembre

Causas de colapso de prédio que matou uma pessoa em bairro de BH ainda são desconhecidas


20/09/2023 04:00 - atualizado 20/09/2023 05:29
432

Construção na Região Norte de BH
Construção na Região Norte de BH veio abaixo em setembro de 2022, quando estrutura de cinco andares com histórico de problemas ruiu. Moradora que já ocupava o imóvel morreu (foto: Jair Amaral/EM/D.A Press - 21/9/2022)


O desabamento de um prédio, supostamente construído em cima da estrutura de uma casa, no Bairro Planalto, Região Norte de Belo Horizonte, completa um ano nesta quinta-feira (21/9) sem que as causas do colapso, que matou uma pessoa, tenham sido esclarecidas. Apesar de estar regular na data do acidente, a obra já havia sido embargada e o engenheiro responsável chegou a ser autuado pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Minas Gerais (Crea-MG) por irregularidades na construção, um ano antes. Problemas que, pelo menos a julgar pelos dados oficiais da fiscalização municipal, têm aumentando consideravelmente na capital. No caso do Planalto, a perícia da Polícia Civil ainda não foi concluída e não há previsão para o término das análises.

Desastres como esse levantam a discussão sobre um desafio crônico: a eficácia da fiscalização e o risco de obras cujos responsáveis ignoram a legislação ou medidas de segurança. Apenas neste ano, mais de 3 mil construções foram alvo de autuação em Belo Horizonte por irregularidades, volume quase 10% superior ao registrado no ano passado, segundo dados informados ao Estado de Minas pela prefeitura da capital.

Escombros caíram sobre casa ao lado
Escombros caíram sobre casa ao lado, que teve estrutura comprometida e foi condenada. Hoje, só resta o terreno (foto: Edésio Ferreira/EM/D.a Press)


De janeiro a setembro deste ano, o Executivo municipal fiscalizou 3.834 obras, entre intervenções em imóveis, lotes e vias públicas. As autuações representam impressionantes 84,8% desse total, e somam 3.252 registros. Mas apenas 314 construções foram interditadas temporariamente. Outras 2.136 foram notificadas e 802, multadas. No ano passado, foram 2.976 atuações, o que aponta um crescimento de 9,2% no comparativo com 2023.


Questionada pela reportagem, a prefeitura não detalhou a quantidade de vistorias e autuações em imóveis privados, residenciais ou comerciais. Apesar do aumento do número de punições este ano e do altíssimo percentual de irregularidades, especialistas e moradores ouvidos pelo Estado de Minas apontam falhas na fiscalização e cobram monitoramento constante do poder público para prevenir a multiplicação de desastres como o que terminou em morte no Bairro Planalto.

Apesar de ter alvará de construção válido até 2025, a construção que desabou há um ano na Rua Professor Gentil Sales, esquina com Rua Newton Pereira, entrou em colapso matando Lourdes Pereira Leite, aos 73 anos. O marido dela, então com 75, e as filhas do casal, uma de 45 e uma de 40, foram socorridos com vida.

A construção era um sonho do proprietário, que almejava deixar o imóvel como fonte de renda para a filha mais nova, que tem síndrome de Down. Além da garagem, o edifício tinha quatro andares com apartamentos e estava em fase final de acabamento. Uma família morava no andar térreo, mas, felizmente, não estava em casa no momento do acidente.

Ilma Pereira, Vizinha dos imóveis atingidos
Vizinha dos imóveis atingidos, Ilma Pereira cobra mais atenção ao setor: %u201CPor que deixam as coisas acontecerem para depois fiscalizar?%u201D (foto: Edésio Ferreira/EM/D.a Press)

O pesadelo dos vizinhos

O prédio do Bairro Planalto desabou sobre uma casa ao lado, cujos moradores, marido, mulher e filho, estavam viajando na época. Eles ficaram sabendo do desabamento por meio de ligações dos vizinhos. Os escombros da construção permaneceram no local por meses. Com isso, o imóvel, que poderia ter sido recuperado, foi condenado pela Defesa Civil e precisou ser demolido.


Desde setembro, a vida da família virou um transtorno. Um mês após a tragédia, o imóvel foi invadido. Os ladrões arrombaram o portão duas vezes e levaram lustres da casa. Hoje, a família mora de aluguel no mesmo bairro, e aguarda os desdobramentos do caso. “Construímos com muito sacrifício, trabalhando a vida inteira. Quando tivemos a moradia pronta, aconteceu isso”, relatou a moradora Sueli Abreu Cunha à reportagem do Estado de Minas.

Outro imóvel também foi atingido e teve que ser parcialmente interditado. No local, funcionava um salão de beleza, que paralisou as atividades até a regularização dos danos na estrutura.

A casa de Ilma Cristina Pereira, de 57 anos, vizinha da que foi condenada e demolida, não chegou a ser atingida, mas ainda tem rachaduras nos muros pelo impacto do desabamento. O imóvel foi vistoriado pela Defesa Civil, que assegurou não haver riscos estruturais.

Ainda assim, ficou o susto. “É uma tristeza. Foi muita pressão psicológica”, conta Ilma. Os vizinhos, segundo ela, já haviam denunciado a obra, que durante anos foi tocada sem supervisão de profissional capacitado. Hoje, ela cobra maior atuação da prefeitura e de entidades responsáveis pela fiscalização do setor.

“Deveria haver mais fiscalização nas obras. Um erro em uma construção pode custar a vida de pessoas. O desabamento quase acertou minha casa. Por que deixam as coisas acontecer para depois fiscalizar?”, questiona.

Procurada pela reportagem do Estado de Minas para se posicionar sobre a investigação das causas do desabamento no Planalto, a Polícia Civil de Minas informou, em nota, que, “devido à complexidade do caso, o inquérito policial ainda está em andamento. Em momento oportuno, outras informações serão divulgadas”.

Clemenceau Chiabi Presidente do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia
(foto: Fabi Araújo/Divulgacao)

"É um risco que o construtor assume ao não contratar um profissional formado para a realização do projeto e execução da obra"

Clemenceau Chiabi Presidente do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia


Histórico de irregularidades

A construção do prédio que ruiu no Bairro Planalto havia sido embargada em 2016, dois anos após o início das obras, por irregularidades no licenciamento urbanístico, laudo que é aprovado após a aferição da edificação quanto aos parâmetros de ocupação do terreno previstos no Plano Diretor. Os trabalhos no imóvel permaneceram paralisados até 2021, quando a situação foi regularizada, de acordo com a prefeitura.

A obra em si estava regular, com alvará de construção válido até 2025, mas a presença de moradores no imóvel, ainda em obras e sem liberação municipal para ocupação, não deveria ocorrer. A edificação não tinha certidão de baixa de construção, documento popularmente conhecido como “Habite-se”. Além disso, em 2021, o responsável técnico pelo andamento da construção também foi autuado pelo Crea-MG pela falta de identificação em relação ao serviço em execução, já que a placa de obra disponível na edificação indicava outro profissional.

Fiscalização e informalidade

O desabamento que custou uma vida, além de prejuízos e transtornos a vizinhos, expõe a fragilidade da fiscalização e o desrespeito a exigências de segurança. Na avaliação de especialistas, a capacidade de vistoria atual é reduzida, seja por um efetivo insuficiente ou por projetos que não avançam.

“Nós já tivemos vários acidentes do tipo em Belo Horizonte. Falta de acompanhamento e fiscalizações podem multiplicar tragédias como essa. Temos uma série de programas ligados a riscos sanitários, geológicos, mas não vemos essas coisas sendo implementadas de fato”, afirma Roberto Monte-Mór, pesquisador do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Uma saída viável, para o especialista, seria o investimento em educação. “Para ampliar a capacidade de reação da população frente a situações de crise, é necessário movimento de esclarecimento, de capacitação. Não podemos, diante da situação brasileira, jogar tudo nas costas do Estado. É preciso que haja envolvimento das empresas e da sociedade civil”, avalia.

O cenário reflete ainda outro problema crônico: a falta de investimento em políticas de habitação. Conforme o presidente do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia (Ibape), Clemenceau Chiabi, mesmo sendo planejada, Belo Horizonte tem um grande volume de edificações que integram a chamada “cidade informal”.

O termo, explica, é usado para se referir ao conjunto de construções erguidas sem obedecer a regras ou sem as devidas autorizações. “A pessoa entra no lote e começa a construir por conta própria. Nesses casos, é um risco que o construtor assume ao não contratar um profissional formado para a realização do projeto e execução da obra”, disse, em entrevista ao Estado de Minas.

A preocupação em números


O saldo das fiscalizações em obras de BH em 2023

3.834 obras fiscalizadas pela PBH
3.252 autuadas pela fiscalização municipal
2.136 receberam notificações
314 sofreram embargo
802 foram multadas 


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)