Jornal Estado de Minas

Em Minas, parentes e amigos buscam notícias de familiares que vivem no Japão

Valquiria Lopes

Yumi Abeki e sua irmã Sanae Abeki acompanham o noticiário na TV japonesa NHK - Foto: Euler Junior/EM/D.A Press. Bra

O terremoto de 8,9 graus na escala Richter, que provocou um enorme tsunami no Japão, também abalou o estado emocional de muitos mineiros que têm parentes e amigos vivendo naquele país. A dona de casa Ana Suga, de 74 anos, moradora de Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, acordou às 9h de ontem com o telefone tocando. Eram os cinco filhos dela, duas noras e uma neta de 2 anos, que moram no Japão, avisando que estavam bem. “A minha filha foi logo dizendo para eu ficar calma, que não ficasse apavorada, pois todo mundo estava bem. Eu ainda nem sabia da tragédia”, disse a dona de casa, que ligou a televisão e entrou em desespero ao ver a onda de destruição. “Meus filhos disseram que ainda havia pequenos tremores e eles se protegiam debaixo da mesa”, disse a dona de casa.

Veja o infográfico da tragédia

Os parentes de Ana Suga vivem na cidade de Oisumi, no estado de Gunma. “A fábrica de agulhas de injeção na qual minha nora trabalha foi toda destruída. Ela estava no local, e o chefe mandou que todos colocassem capacetes e que procurassem abrigo. Quando ela chegou em casa, distante cinco quarteirões, estava tudo revirado, com muita coisa quebrada. Balançou tanto que a comida da geladeira ficou toda misturada”, disse Ana Suga.

Os outros parentes dela trabalham todos numa fábrica de ignição de carro. O filho Aloísio Masani Suga, de 38, contou que as luzes do seu local de trabalho começaram a piscar e logo depois tudo começou a tremer forte. “Todos os funcionários foram dispensados”, contou a mãe, que não conseguiu manter a televisão ligada. “As imagens são assustadoras. Vi navios sendo arrastados pela onda gigante ainda com gente dentro. Estou com muito medo”, disse Ana Suga, que não para de rezar.

Ao contrário da dona de casa, o japonês Hirohisa Kimura, de 79 – que mora em Belo Horizonte há 50 anos e é presidente do Conselho Deliberativo da Associação Mineira de Cultura Nipo-Brasileira – ainda não tinha conseguido falar com seus cinco irmãos que moram em sua cidade natal, Kiyiu, no estado de Gunma, fica a 90 quilômetros de Tóquio. “O tsunami não chegou lá, só o tremor”, disse Hirohisa, que passou toda a manhã acompanhando a tragédia por um canal de televisão japonês, em sua casa, e ao mesmo tempo verificando num mapa as regiões atingidas. “A sorte é que a minha cidade natal fica na parte mais central do país e a destruição maior foi ao Norte”, disse. Mesmo assim, ele disse que não iria se sossegar até falar com os parentes. “A angústia é muito grande. Tragédias acontecem no mundo inteiro, mas quando é no lugar onde eu nasci, com irmãos morando lá, a preocupação aumenta”, disse Hirohisa, mostrando a fotografia da casa onde nasceu, com mais de 1 mil anos.

Enquanto morou no Japão, Hirohisa conta ter presenciado vários terremotos, mas nenhum de intensidade tão alta como o de ontem. “Esse foi um dos maiores”, acrescentou. Pelo menos 300 mil brasileiros trabalham no Japão, segundo ele, a maioria no sul do país. “Por meio da associação, conheço muitas famílias que têm pais, filhos e netos trabalhando lá. Vou procurar saber a situação de todo mundo”, disse Hirohisa.

Ainda de acordo com ele, o Japão é bem preparado para enfrentar tragédias como a de ontem. “A população sempre é alertada com antecedência. Nas cidades grandes, há treinamentos. As rádios e as TVs anunciam a chegada de um tsunami e as pessoas se afastam do mar. Elas guardam em casa quites de primeiros socorros e de sobrevivência”, disse Hirohisa. Mas ontem, segundo ele, a intensidade do tsunami superou as expectativas.

SENDAI De uma das áreas mais afetadas pelo tsunami, a cidade de Sendai – capital da província de Miyagi, localizada na costa Nordeste do Japão – o aviso de que tudo estava bem veio por e-mail. Depois de muitas tentativas sem sucesso, a dona de casa Yasuko Araki, de 61 anos, foi informada por uma sobrinha que mora em Tóquio de que os familiares residentes em Sendai estavam todos vivos. “Tentamos ligar várias vezes para eles, mas o sistema de telefonia está todo parado. Minha sobrinha disse que no e-mail eles contaram que tudo foi embora, então imagino que devem ter perdido os móveis ou até mesmo a casa, já que a cidade foi muito afetada”, conta Yasuko, que vive com o marido e os filhos no bairro Belvedere, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte.

A notícia da tragédia chegou logo cedo para a família. “Vi na TV, no início da manhã, imagens do tsunami carregando navios, automóveis, carregando tudo para dentro da cidade. Ainda não acredito que isso aconteceu com o Japão. Fiquei muito assustado”, contou o marido de Yasuko, o engenheiro Shojiro Araki, de 73 anos, que, há 47 anos, mudou-se do país oriental para o Brasil.

Há pouco tempo morando em Sendai, o volante Max Carrasco, de 24 anos, ex-Ipatinga e atual jogador do Vegalta Sendai, contou em entrevista à TV Alterosa os momentos de pânico vividos pela população da cidade. “Não vi a onda que invadiu o aeroporto já que moro um pouco distante de lá. Mas a cidade tremeu, os prédios balançaram, as pessoas caíram no chão. Prédios, casas e postes desabaram”, contou o jogador que é mineiro de Belo Horizonte. Segundo o volante, a tragédia provocou um susto muito grande em toda a família. “Apesar de todos os problemas do Brasil, não passamos por isso. Foi um susto muito grande. Não conseguimos dormir direito. Agora estamos tentando manter a calma”, disse.

Com o sistema de telefonia em pane, a internet também serviu para tranquilizar mais uma família na capital mineira. No Orkut, o nissei Paulo Cin Nakao, nascido em Belo Horizonte e atual morador da cidade de Aichi, na Região Central do Japão, postou em seu perfil: “Estamos todos bem”. Notícia que tranquilizou o irmão dele, Yoshitada Nakao, de 48 anos, proprietário de um restaurante japonês na Região Centro-Sul da capital.

Pelo Facebook, a estudante de Belo Horizonte Milleanni Dominguez, 26 anos, que está na cidade japonesa de Tsukuba, descreve o medo que sentiu no momento que a terra tremia. "Pessoas, eu estou bem, mas estou apavorada... tudo caiu na minha casa... coisa quebrada.. barulho de sirene o tempo todo.. pessoas fora de casa.. e não para de ter réplicas.. mas eu tô bem!!". Ela salientou ainda a dificuldade em se comunicar pelo telefone com os pais e alguns amigos. "Estou conseguindo falar pela internet com os meus pais, graças a Deus. Eles estão desesperados. Os telefones aqui estão cortados". A estudante mineira afirma que ainda sente tremer o chão e que as únicas informações vêm pela interne da emissora NHK. "A informação que a gente tem é que está para vir outro terremoto de magnitude 7 e que é para todos ficarem preparados", comenta. De Tóquio, os primos do japonês Akio Yokoyama, de 69 anos, proprietário de um restaurante japonês no Bairro Santa Tereza, na Região Leste de Belo Horizonte, contaram sobre a situação no país. “Estamos bem, mas todos assustados. O chão continua a tremer”, disse o primo de Yokoyama por telefone.

Sem notícias

No Bairro Jaraguá, na Região da Pampulha, em Belo Horizonte, a falta de notícias ainda preocupa a família do massoterapeuta Koichi Abeki, de 75 anos. “Desde 6h30 estamos acompanhando as notícias no canal japonês NHK e já ligamos para todos os nossos familiares. Tem quatro irmãos e vários sobrinhos lá. Com dois irmãos ainda não consegui nenhum contato. Eles foram fora da área do terremoto, mas mesmo assim estamos preocupados”, contou Abeki. As filhas Yumi Abeki, 36, e Sanae Abeki, 38, contaram ontem sobre a aflição da família. “É muito ruim ficar sem saber o que aconteceu porque os telefones estão cortados e não é fácil obter notícias. Esperamos que tudo esteja bem”.