O maior terremoto da história do Japão deixou ainda mais incertas suas perspectivas econômicas. A potência industrial, que acaba de ceder à China o posto de segunda economia do planeta, já encontrava dificuldades para sair de uma estagnação que se arrasta por mais de uma década. Analistas passaram agora a avaliar também o impacto, sobre as contas públicas, da necessidade de investir pesado na reconstrução das áreas atingidas – sem falar nos prejuízos em diferentes cadeias produtivas.
Os cálculos sobre as perdas geradas pelos tremores da sexta-feira ainda variam muito. A maioria dos especialistas aposta numa conta de até US$ 10 bilhões, sem considerar consequências para exportações e balanços corporativos. As áreas agrícola, siderúrgica, energética, pesqueira, eletrônica e automotiva foram as mais afetadas. Só as companhias de seguros devem desembolsar US$ 50 bilhões para cobrir apólices japonesas.
"O baque inicial do desaparecimento de pessoas, capitais e patrimônio será fortemente sentido na economia. Mas não é exagero afirmar que o esforço de recuperação terá rápido efeito positivo, gerando emprego e renda, com injeção de vultosos recursos públicos e privados", disse o economista Cláudio Considera, do Instituto Millenium. Para ele, o episódio trágico pode acabar sendo uma resposta ao persistente impasse da baixa demanda agregada do Japão, agravada por efeitos tardios da crise bancária de 2009 e pela propensão do japonês a poupar. A exemplo do ocorrido no terremoto de Kobe, em 1995, empresas e bancos poderão resgatar aplicações no exterior para investir no próprio país.
Também é provável que a gorda poupança doméstica se alie ao dinheiro captado no exterior, por empréstimos e lançamentos de títulos públicos, na tarefa de sanar feridas do desastre natural. Por ter território relativamente pequeno e densamente povoado, o Japão é "todo estratégico" para a economia, sublinha Considera. Sendai, maior cidade do Nordeste e local mais próximo do epicentro dos sismos, tem 9,4 milhões de habitantes e é destaque na agricultura. Além de reunir portos importantes para exportações de manufaturados e de apoio à indústria pesqueira, a região é conhecida como "celeiro do Japão", por ter amplos cultivos de arroz, um dos mais importantes ingredientes do prato do japonês.
Os três maiores fabricantes japoneses de automóveis – Toyota, Nissan e Honda – anunciaram que suas 12 fábricas no país continuarão paradas nesta segunda-feira, por falta de provisões. Desde sexta-feira, as montadoras suspenderam a produção em algumas unidades, por medida de segurança. Há receio de um recuo nas exportações de veículos e autopeças nos próximos meses.
Apesar da aposta geral na conhecida reação dos japoneses diante das tragédias, a maior dúvida ainda está na capacidade do governo central para pagar suas dívidas. Considera vê, contudo, espaço para mais endividamento. Em dezembro, as autoridades econômicas admitiram que a situação fiscal do país estava "à beira do abismo". A dívida bruta do setor público já passou de US$ 10 trilhões, correspondendo a mais do dobro (220%) do Produto Interno Bruto (PIB), a soma de todas as riquezas produzidas no ano.
Sem fôlego
Estagnada há 15 anos, a economia tem sido tocada por uma série de incentivos oficiais ao consumo doméstico, incluindo juros negativos. Enquanto o deficit orçamentário crescia, os investimentos do Estado recuavam. Apesar disso, o banco central do Japão avisou logo após o terremoto que fará o máximo para garantir estabilidade do mercado.
Ernesto Lozardo, professor de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV), acredita que o país tem recursos suficientes para reparar os danos de infraestrutura e de capital produtivo, empreitada que deverá consumir quatro anos. O especialista também descarta riscos ao suprimento energético do Japão, mesmo com o desligamento de duas grandes termelétricas nucleares. O corte na geração de eletricidade será compensado com importações de gás, carvão e petróleo.
Lozardo acha que as projeções de crescimento para a economia mundial e japonesa neste ano não deverão mudar em função da catástrofe, que o economista considera menor que o problema financeiro do país. O PIB do Japão cresceu 3,9% no ano passado, recuperando parte do tombo de 5,2% sofrido em 2009. O resultado foi de US$ 5,47 trilhões. Mas foi a maior expansão entre os sete países mais industrializados. A estimativa para 2011 é crescer 2%. Como terceiro maior importador de commodities (carente de quase todas elas) e quarto importador geral, o primeiro reflexo do terremoto foi sobre as cotações de matérias-primas, que recuaram na sexta-feira.