O cantão (região administrativa) de Zurique, no norte da Suíça, se tornou o destino de muitas pessoas de outros países que desejam pôr fim às suas vidas de forma pacífica. Mas uma votação neste domingo poderá acabar com isso.
O suicídio assistido, prática em que uma pessoa portadora de doença terminal ou deficiência grave recebe auxílio para pôr fim à vida, é legal na Suíça há décadas.
Pesquisas de opinião recentes no país mostram que a prática ainda desfruta de amplo apoio entre os suíços, muitos dos quais acreditam que um indivíduo tem o direito de decidir quando e como morrer.
Por isso, a proposta de proibição completa, defendida pelo profundamente religioso partido União Democrática Evangélica, tem poucas chances de ser aprovada.
'Direitos humanos'
''Quando falamos em direitos humanos, acho que isso inclui o direito de decidir sobre a morte também'', afirma o morador de Zurique Christian Bretscher.
Bretscher é contrário às duas propostas e traz a sua própria experiência de suicídio assistido para a campanha.
Há sete anos, sua mãe optou pelo suicídio assistido em vez de seguir vivendo uma vida comprometida pela artrite. Ela pediu ao seu filho que a apoiasse. Ele o fez e não se arrepende.
''O momento em que minha mãe percebeu que era possível ela ir, quando ela segurou aquele copinho (com uma droga fornecida por uma entidade de suicídio assistido) e pensou: 'Sim, eu posso deixar esse mundo', foi um momento de tamanha felicidade e gratidão aos olhos de minha mãe (que eu) nunca me esquecerei.''
Bretscher está convencido de que a maneira pela qual sua mãe morreu foi a melhor solução, não apenas para ela, mas para aqueles que ela deixou.
''Normalmente, as pessoas morrem em algum momento em algum lugar, em hospitais, longe de seus parentes. Para nós, foi muito diferente. Estou certo de que para a minha mãe foi uma maneira linda de dizer adeus a nós. E, para mim, foi uma maneira linda de dizer adeus à minha mãe.''
Turismo
Mas se os eleitores de Zurique parecem propensos a apoiar o direito dos cidadãos suíços como mãe de Bretscher em escolher suas mortes, não está claro se o cantão aceitaria continuar oferecendo esse mesmo direito a cidadãos de outros países, onde o suicídio assistido é ilegal.
Nos últimos anos, Zurique tem povoado as manchetes pelo seu ''suicídio de turismo'', feito por pessoas gravemente doentes da Grã-Bretanha e da Alemanha que têm vindo à região para morrer com o auxílio da organização de suicídio assistido Dignitas.
Por isso, um veto no referendo pode significar que a Dignitas tenha de interromper os serviços oferecidos a clientes estrangeiros.
O governo suíço também está revisando leis federais relativas ao suicídio assistido, e estará acompanhando os votos em Zurique com muita atenção.
A aprovação da proposta de restringir o suicídio assistido aos residentes permanentes ou mesmo um voto próximo a essa decisão, pode influenciar a maneira do governo de pensar.
A descoberta no ano passado de urnas no lago Zurique contendo as cinzas de estrangeiros que teriam recorrido à prática causou choque.
Existem ainda preocupações relativas à rapidez com que pacientes de outros países podem realizar um suicídio assistido; muitos chegam a Zurique e podem recorrer à prática dentro um ou dois dias.
Ativistas contrários ao procedimento, como Hans Peter Haering, da União Evangélica, acreditam que isso não contribui positivamente para a imagem de Zurique.
''Em outros países, dar assistência a suicidas é errado. É ilegal. Então, eu me pergunto por que estamos fazendo na Suíça coisas que são proibidas em outros países. Não é digno de nossa parte. É como os segredos de nossos bancos. Todos estão se perguntando porque é que nós permitimos isso''.
O criador da entidade Dignitas, Ludwig Minelli, se recusou a dar declarações antes da realização do referendo.
Mas em uma entrevista à BBC em junho do ano passado, ele descreveu o direito de escolher o momento e a maneira de morrer como sendo ''o derradeiro direito humano'' e se manifestou contra iniciativas que acabem com esse direito.
`Responsabilidade´
A maior organização de suicídio assistido de Zurique, a Exit, já tem a política de tratar somente pessoas que são residentes permanentes na Suíça.
Bernard Sutter, vice-presidente da organização, diz que é triste que as pessoas tenham que viajar a outros países para morrer.
“Ajudar alguém em um suicídio assistido é uma responsabilidade muito grande” explica.
“Antes de poder ajudar alguém, precisamos conferir cada pequena coisa. É importante que os vejamos muitas vezes, que vejamos o diagnóstico e que examinemos todo o histórico médico deles. Mas se alguém vem de longe, talvez não saibamos sua língua e não tenhamos maneiras de viajar para outro país para visitá-lo no hospital. Então como podemos fazer nosso trabalho seriamente?”
Por isso, apesar de continuar apoiando o direito de escolher sua hora de morrer, ele e outros suíços começam a ficar impacientes com o turismo do suicídio.
“Não podemos resolver os problemas do resto da Europa com a morte. E achamos muito tristes que as pessoas tenham que viajar milhares de quilômetros para irem morrer em um país liberal.”
Pesquisas recentes entre os eleitores suíços mostram que a maioria deles apóia a prática do suicídio assistido, mas 66% são contra o turismo do suicídio.