Jornal Estado de Minas

Depois de seis meses, Primavera Árabe enfrenta violência e incertezas

AgĂȘncia Brasil
Mais de seis meses após seu início, a Primavera Árabe – série de levantes populares que começou na Tunísia e se espalhou por vários países da região – enfrenta um impasse envolvendo violência, mortes, frustrações e dúvidas quanto a mudanças práticas. No começo do ano, os protestos eram vistos como uma onda pacífica de mudanças rumo a reformas, democracia e destituição de governos no poder havia décadas
Mas a Líbia passa por uma guerra civil, enquanto as manifestações na Síria e Iêmen são reprimidas com extrema violência e não há sinais de que os governantes renunciem. No Bahrein, as manifestações em favor da democracia foram reprimidas e extintas pelo governo. Ativistas e membros da oposição foram presos.

“Em pleno verão no Oriente Médio, a Primavera Árabe gera apenas dúvidas e suspeitas. Ninguém sabe o que realmente vai produzir, nem mesmo na Tunísia e no Egito, onde houve relativas mudanças e sucesso em tirar do poder os ditadores”, disse o analista Rami Khoury, diretor do Instituto Fares, da Universidade Americana de Beirute.

A Primavera Árabe começou na Tunísia causada por descontentamentos da classe média e pobre com desemprego, corrupção, pobreza e falta de liberdades políticas levou a levantes populares contra o então presidente Zine El Abidine Ben Ali, que estava no poder havia 23 anos. Após a renúncia de Ben Ali, no dia 14 de janeiro, um governo provisório foi nomeado e uma série de reformas políticas e econômicas anunciadas, incluindo eleições para uma Assembleia Constituinte para julho deste ano.

Mas as reformas econômicas têm sido lentas, de acordo com jornais tunisianos, e a população reclama da demora no julgamento de pessoas ligadas ao antigo regime, embora Ben Ali tenha sido julgado à revelia. Por outro lado, os grupos sociais mais secularizados começam a temer a força cada vez maior dos partidos de ideologia mais islamista, gerando dúvidas quanto ao futuro do secularismo no país.

Foram 18 dias de protestos inspirados na revolução na Tunísia, e ao menos 850 mortos, após forças de segurança abrirem fogo contra manifestações pacíficas nas ruas da capital, Cairo, e outras cidades do país considerado o mais importante e influente do mundo árabe. A pressão popular e interna entre os militares obrigou o presidente Hosni Mubarak a renunciar, encerrando 30 anos no poder. O Egito é governando por um governo provisório liderado por um conselho militar das Forças Armadas.

Na Líbia, a oposição conseguiu controle de várias cidades, pressionada por reformas e a renúncia do presidente líbio Muammar Khadafi – que há 42 anos está no poder. Renúncias de políticos locais e comandantes militares, antes aliados de Khadafi, deram um fôlego à oposição.

A crise na Líbia agravou-se com o ingresso dos militares da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), em março. Os confrontos geraram milhares de mortos e deixaram feridos no país. Analistas do Oriente Médio dizem que o fator militar foi determinante para os desfechos na Tunísia e no Egito. Segundo eles, os militares tunisianos e egípcios, obrigados ou não, escolheram o caminho de reformas e ficaram ao lado de suas populações ganhando respeito e admiração.

Na Síria, os protestos que começaram discretamente em março se intensificaram nos últimos dias registrando momentos de violência. Os manifestantes querem a renúncia do presidente sírio, Bashar Al Assad. Ao menos 1,5 mil pessoas morreram depois que o governo enviou tanques e soldados para acabar com os protestos em diversas cidades.

O Iêmen também é palco de um levante popular para tirar do poder o presidente Ali Abdullah Saleh que há 30 anos está no poder. Diferentemente de outros países muçulmanos que passam por revoluções, o Iêmen tem a agravante de ter grupos militantes armados e a presença da Al Qaeda em seu território.

Também há manifestações populares no Bahrein, reprimidas com a ajuda da vizinha Arábia Saudita. O Bahrein, que tem uma população majoritariamente xiita (cerca de 70%), é controlado pela família real sunita Al Khalifa. Os protestos em favor da democracia tiveram a adesão de sunitas também, mas o governo acusou a oposição de promover um levante xiita que visava a um golpe à monarquia.

Para analistas, os movimentos em favor da democracia no Bahrein foram dominados e não há a perspectiva de um retorno aos protestos como ocorre em outros países muçulmanos. Segundo eles, a Arábia Saudita, cautelosa, não permitirá uma volta de protestos no Bahrein.