O papa Bento XVI visitará a África esta semana, onde deve ser questionado sobre a posição da Igreja Católica a respeito do preservativo em um continente duramente castigado pelo HIV e a Aids. A chegada do Sumo Pontífice a Benin, país do oeste africano, nesta sexta-feira, marcará sua segunda visita à África.
A primeira, em 2009, a Camarões e Angola, causou protestos mundiais quando ele sugeriu que a distribuição de preservativos agravou o problema da Aids. Desde então, o Papa parece ter suavizado esta postura, afirmando em um livro, publicado no ano passado, que o uso do preservativo é aceitável "em alguns casos", principalmente para reduzir o risco de infecções por HIV. Não é de hoje que os católicos africanos se veem divididos entre a doutrina da Igreja e a realidade de uma doença mortal, que castiga milhões de pessoas. "O que o Papa disse é o ideal", explicou Lea Glago, jornalista e católica de 28 anos de Benin, referindo-se a comentários feitos em 2009. "Mas para ser honesta com você, eu não respeito isso e acho difícil respeitar. Não conheço ninguém ao meu redor que o faça", acrescentou. Organizações católicas de caridade são responsáveis por oferecer grande parte dos cuidados para as vítimas da Aids na África Subsaariana, onde vivem 22 milhões de soropositivos. O pragmatismo às vezes tem precedência sobre a análise do significado dos pronunciamentos do Vaticano. No pequeno reino da Suazilândia, na África Austral, país com a pior taxa de prevalência de HIV, com cerca de 26% da população adulta soropositiva, alguns missionários católicos dizem preferir se concentrar em salvar vidas. "Como um homem da Igreja, grande parte do que é feito não é oração. É uma resposta à crise", explicou o padre Martin McCormick, missionário e fundador da Hope House (Casa da Esperança), um abrigo para pacientes com Aids e seus familiares. McCormick também supervisiona 60 escolas católicas, onde os 8.000 estudantes são órfãos da Aids. "Se você tem 8.000 crianças famintas, não se volta para o Vaticano. Você pensa em dar uma 'resposta humana' ao que você vê à sua frente. Eu não penso em políticas ou filosofias", acrescentou. No mesmo país, a irmã Diane Dalle Molle, uma freira católica que há oito anos aconselha e examina pessoas para detecção do HIV, afirmou: "Nós podemos dizer a eles o que está disponível lá fora". "Nós não fornecemos preservativos, mas eles sabem onde consegui-los", explicou. Alguns, no entanto, decidem se ater ao dogma. Gift Mambipiri, líder do movimento estudantil católico do Zimbábue, afirmou que "a Igreja trata da vida e de salvar vidas. A abordagem holística prega abstinência e fidelidade total". Na Nigéria, o país mais populoso da África, o diretor da agência nacional antiAids, chamou a postura da Igreja Católica com relação aos preservativos de "irrealista". "Na realidade, muitas pessoas compreendem (o uso do preservativo), mas não querem ir contra a doutrina", explicou John Idoko, diretor da agência nigeriana de controle contra a Aids. Ele disse que no ano passado um grupo de católicos "fanáticos" levou sua agência, o Ministério da Saúde e uma agência de controle de drogas à Justiça por promoverem o uso de preservativos, alegando que estariam distribuindo camisinhas com buracos e incentivando a disseminação do HIV. O caso foi arquivado depois que os pleiteantes fracassaram em provar suas alegações. Na África do Sul, país com o maior número de casos de HIV do mundo, a Igreja Católica e suas clínicas, abrigos, programas de cuidados domésticos e orfanatos se viram na frente de batalha do combate à Aids. No gabinete da Conferência dos Bispos Católicos Sul-africanos, a irmã Victoria explicou que o Programa de Educação para a Vida se baseia na promoção da abstinência. "Não somos permitidos a ensinar sobre os preservativos", afirmou. "Sexo é para o casamento. Tentamos encorajar a abstinência. Nós enfrentamos a realidade, mas precisamos dizer a verdade", acrescentou.