Jornal Estado de Minas

Monumentos que desmoronam - a Itália pede socorro

AFP
Fragmentos que se soltaram do Coliseu de Roma e desabamentos em Pompeia, além de cortes no orçamento da cultura e um cinema em crise: a Itália, aniquilada pelos custos de manutenção de seu enorme patrimônio, vem sendo obrigada a pedir ajuda ao setor privado e ainda à União Europeia.
Quarto destino turístico mundial depois da França, dos Estados Unidos e da Espanha, a Itália sempre teve orgulho de seu patrimônio cultural, enriquecido por séculos de história - da era romana ao barroco, passando pelo Renascimento.

Mas, hoje a península, estrangulada pelo peso de sua dívida colossal e pelos planos de austeridade em sequência, não tem conseguido manter seu enorme tesouro.

Em Roma, em meados de janeiro, partes se desprenderam pela enésima vez do Coliseu, monumento que simboliza a capital, apesar de cercado pelo trânsito e enegrecido pela poluição. E, assim, o maior anfiteatro romano recebe, cada vez pior, seus seis milhões de visitantes.

Por falta de dinheiro, o governo fez um apelo ao setor privado para patrocinar a restauração desta construção excepcional, e foi atendido pelo rei italiano dos sapatos, o proprietário do grupo Tod's, Diego Della Valle, que prometeu investir 25 milhões de euros.

Mas, Della Valle ameaçou no dia 12 de janeiro retirar-se do projeto, após a abertura de uma investigação sobre possíveis irregularidades... O assunto ainda está longe do final, enquanto que a restauração, propalada há três anos, teria começado em março.

Além do Coliseu, "todo o patrimônio italiano precisa atenção", advertiu a associação nacional de arqueólogos italianos pedindo "recursos adequados".

Desabamentos em Pompeia

É o caso perto de Nápoles, onde o célebre sítio arqueológico de Pompeia, classificado como patrimônio mundial da Humanidade pela Unesco desde 1997, foi palco, em dois anos, de uma série de desmoronamento, com o último deles destruindo a casa de Loreius Tiburtinus, uma das mais belas da cidade.

Aguardando uma solução do tipo "Coliseu", Roma obteve uma ajuda de 105 milhões de euros da União Europeia, como parte de um plano de manutenção e restauração, programados para pelo menos quatro anos.

Esta situação gravíssima pode piorar, uma vez que o Estado italiano dedica apenas 0,21% de seu orçamento à cultura, contra, por exemplo, 1% na França, ao mesmo tempo em que a península assegura possuir a metade do patrimônio cultural mundial.

O orçamento anual de 1,8 bilhão de euros não serve senão para preencher brechas, deixando para as artes a parte mais pobre.

Em 2011, 'La Scala' e o 'Piccolo Teatro de Milan', duas instituições prestigiosas de nível internacional, se viram, assim, com 17 milhões de euros a menos.

O administrador francês do 'La Scala', Stéphane Lissner, fez um apelo ao governo de Mario Monti para "não sacrificar" a cultura ao pacote de austeridade, destacando que o percentual consagrado à cultura pelo governo italiano é um dos "mais baixos da Europa".

O Fundo Único para o Espetáculo (FUS), que subvenciona os teatros italianos, atingiu, em 2011, um teto histórico: 231 milhões de euros, ou seja uma queda de 50% em relação a 2010! Só para a cidade de Roma, 31 estabelecimentos podem fechar... As cifras são de dar vertigem.

Em relação ao cinema, há uma verdadeira debandada: a associação profissional de autores para o cinema e a televisão "100autori" expressou no dia 13 de janeiro "grave preocupação com as novas reduções de orçamento e cancelamentos de projetos".

Uma situação confirmada por Gustav Hofer, um jovem documentarista que, para seu segundo trabalho, precisou "ir ao exterior para buscar financiamentos". "Na Itália, são dedicadas apenas algumas migalhas para os documentários", lamentou ele.

Esta é a mesma opinião de Camillo Esposito, dirigente da pequena sociedade de produção Capetown: "é difícil achar financiamento e fazer a distribuição de um filme que não seja comercial".

O quadro pintado não é muito tranquilizante: "há alguma coisa que não funciona, não se sabe mais como fazer dinheiro com nossa cultura nacional", constatava amargamente o escritor Umberto Eco numa carta ao governo publicada no ano passado.