Jornal Estado de Minas

Retirada francesa do Afeganistão desejada por Hollande preocupa Cabul

AFP
A retirada francesa do Afeganistão até o final de 2012, como planejado pelo novo presidente François Hollande, não agrada a Otan nem Cabul, apesar das últimas declarações tranquilizadoras, em razão da instabilidade na região onde estão os franceses.
Nesta segunda-feira, no dia seguinte à eleição de Hollande, o governo afegão informou, por meio de seu Ministério da Defesa, que as forças da segurança estão "bem preparadas" para "assumir as responsabilidades da segurança em 2013", com destaque para Kapisa (nordeste), único território onde o Exército francês mantém o controle, em caso de uma saída antecipada dos franceses.

A Isaf, força da Otan no Afeganistão que apoia Cabul contra a insurgência Talibã e que conta com 3.400 soldados franceses (de um total de 120.000 homens), disse não estar preocupada. "Temos planos de contingência. Nosso comando está sempre preparado para qualquer tipo de situação", disse o tenente-coronel Jimmie Cummings, porta-voz da ISAF.

Mas, reservadamente, as autoridades afegãs e ocidentais consideram problemática e arriscada uma saída antecipada francesa de Kapisa, o que significaria a transferência do controle de uma província muito instável para forças afegãs frágeis.

Kapisa, região dividida entre diferentes grupos étnicos, é "um corte na garganta", uma "área difícil de ser controlada", ressalta uma fonte da segurança ocidental.

Localizada a apenas duas horas da capital, constitui "um eixo natural que contorna Cabul", segundo a mesma fonte. "Quando não se quer passar pela estrada principal, controlada, passa-se por lá", acrescenta. Daí uma forte presença de talibãs e traficantes.

Em meados de abril, o general Emam Nazar, que comanda a 3ª Brigada do Exército afegão, estimou que existam 800 insurgentes espalhados por Kapisa, incluindo mujahedines estrangeiros, "paquistaneses e árabes". Os combates são frequentes. "Durante trinta anos, foram travadas disputas significativas entre todas as comunidades de Kapisa. Rivalidades, principalmente relacionadas às fronteiras, estão vivas há anos. A área é de insurgência cotidiana. Quando os franceses se forem, os moradores continuarão a lutar entre eles", suspira a fonte ocidental. "Do ponto de vista militar, não é prático retirar as tropas até o final de 2012", afirma um funcionário do ministério de Defesa do Afeganistão. Para ele, esta decisão francesa é mais uma "promessa eleitoral do que uma decisão prática".

Estes observadores consideram, por razões práticas, ser impossível uma retirada total francesa em um prazo tão curto. "Se retirarmos todas as tropas de combate, quem, em seguida, irá proteger os comboios, para que eles retornem em segurança para Cabul? Será necessário colocar outros homens", observa a fonte da segurança.

Com 1.500 contêineres e 1.200 veículos, entre eles cerca de 500 veículos blindados e 14 helicópteros para repatriar à França, o Exército francês deverá contar com uma logística especial, já que 23.000 soldados americanos também devem voltar para casa até o final de setembro. "Em seguida, teremos de ver como implementar a transição em Kapisa. Ela deve durar cerca de 18 meses, período durante o qual a coalizão ficará responsável por apoiar as forças afegãs", acrescenta. Se os franceses falharem, outros membros da coalizão vão precisar substituí-los nesta província perigosa. Nestas condições, o Ministério da Defesa do Afeganistão tem uma certeza: os franceses "não vão sair neste ano".

O antecessor de Hollande, o atual presidente Nicolas Sarkozy, quadruplicou as tropas francesas no país, até chegar a 4.000 soldados. Após a morte de vários soldados, em meados de janeiro, finalmente decidiu por uma retirada das tropas francesas até o final de 2013, em vez de 2014 como o planejado pela Otan.

François Hollande, que em diversas ocasiões reafirmou seu objetivo de retirar os combatentes franceses até o final de 2012, informou que explicará a sua estratégia aos membros da Otan durante uma reunião prevista para acontecer nos dias 20 e 21 de maio, em Chicago.

O ministro das Relações Exteriores de Sarkozy, Alain Juppé, duvidou da proposta e disse nesta segunda-feira: "O novo presidente da República pensa que pode realizar esta retirada até o final de 2012, veremos se ele irá conseguir um acordo com os nossos parceiros durante a reunião de Chicago".