Diego Amorim - Enviado especial
Roma – Ele jamais reconheceria, mas dom Odilo Scherer, enfim, assumiu ontem pela manhã a condição de nome forte para suceder Bento XVI. Candidato? Nem pensar. O termo é rechaçado por ele. Mas o arcebispo de São Paulo não conseguiu ignorar as dezenas de câmeras e microfones de jornalistas do mundo inteiro que lotaram uma pequenina igreja de estilo barroco próximo ao Palácio Quirinale, em Roma. “Tanto jornalista para participar da missa. Que maravilha”, repetia, num dia inspirado, em que mostrou seu forte carisma, que pareceu convencer os fiéis.
Mesmo sem perder o jeitão sério, o descendente de alemães, de 63 anos distribuiu sorrisos, cumprimentos, hóstias e bênçãos. Em troca, recebeu flashes, aplausos e incentivo dos poucos fiéis que participaram da celebração. “Se ele for papa, vamos rezar muito”, dizia a religiosa brasileira Maria Salete de Oliveira, 64, uma das primeiras na fila da comunhão. Ela e mais duas freiras carmelitas acordaram cedo e viajaram uma hora somente para ver dom Odilo.
Todos que ali estavam queriam vê-lo. Cinegrafistas bateram boca na disputa pelo melhor ângulo. No empurra-empurra, quase caíram perto do altar, enquanto o cardeal tentava chegar à sacristia. Às 10h32, após ele deixar a igreja pela porta dos fundos, o sino tocou, o cântico arrastado começou e dom Odilo entrou em procissão pelo corredor do templo, com veste roxa e mitra na cabeça. Começava uma das missas mais disputadas da vida do padre gaúcho, ordenado 37 anos atrás.
Após incensar o altar e fazer o sinal da cruz, o cardeal saudou os presentes, incluindo o embaixador brasileiro na Santa Sé, Almir Franco. Foi o único momento em que falou em português. O rito tradicional da missa, toda rezada em italiano por dom Odilo (que morou oito anos em Roma), só engatou depois de ele pedir oração pela Igreja, em “tempos de dificuldades, mas também de muita alegria”. Tranquilo e visivelmente animado, chegou a dizer que era um dia de “vibração e festa”.
Os 22 minutos de homilia foram acompanhados atentamente por um rebanho atípico. O silêncio dos jornalistas com gravadores ao alto só era interrompido pelos cliques das máquinas a cada gesto mais brusco do cardeal. Nas entrelinhas dos comentários sobre as leituras bíblicas, esperava-se alguma associação com a tal “candidatura”. Dom Odilo não titubeou. Aproveitou que era o centro das atenções para pregar. Falou do amor de Deus, de perdão, de misericórdia. E só.
A palavra conclave voltou a ser mencionada apenas nas preces dos fiéis, um momento padronizado da missa. No texto em questão, lido ontem nas missas celebradas em todo o mundo, clamou-se pelo Espírito Santo para iluminar a escolha do novo papa e pediu-se por Bento XVI, “que guiou o povo de Deus com caridade apostólica”. Na distribuição das hóstias, um sacerdote italiano se prontificou a ajudar dom Odilo, mas somente um ou outro topou comungar de mãos que não as do homem cotado para ser papa.
Antes de concluir a cerimônia, o cardeal brasileiro ainda abençoou um casal que completava 70 anos de casado. “Eu não tinha nem nascido”, brincou. Com o último amém, começou um novo tumulto ao redor de dom Odilo. Às pressas, após saudar uma emissora de TV alemã, ele voltou à sacristia e de lá, pela garagem da igreja, entrou em uma van com vidros escuros. “Tchau, tenham um bom domingo”, limitou-se, quando instigado por jornalistas a dizer algo em português.
Igrejas titulares
Todo cardeal, quando nomeado pelo papa, “apadrinha” uma das igrejas de Roma e ganha uma “igreja titular”, apesar de não exercer nela função alguma. É um gesto simbólico, para representar que cada cardeal colabora diretamente com o
Sumo Pontífice e auxilia a
Santa Sé nas atividades pastorais.