Rodrigo Craveiro
Ao mesmo tempo que as manobras militares aconteciam, a Casa Branca colocava em xeque a ameaça representada pelo ditador Kim Jong-un, que declarou guerra ao vizinho e prometeu “dissolver” o território norte-americano. “Apesar da dura retórica que estamos ouvindo de Pyongyang, não estamos vendo mudanças na posição militar norte-coreana, como mobilizações em larga escala e posicionamento de forças”, afirmou o porta-voz da Presidência dos Estados Unidos, Jay Carney. “Não vimos ação que apoie a retórica. (…) Deixo para os analistas avaliarem o significado dessa desconexão entre a retórica e as ações”, acrescentou.
A presidente sul-coreana, Park Geun-hye, não parece disposta a esperar sinais concretos. Ela aumentou ontem o tom beligerante e mandou um recado claro e direto aos vizinhos comunistas. “A razão da existência do Exército é proteger o país e o povo de ameaças. Se houver qualquer provocação contra a Coreia do Sul e contra seu povo, haverá uma resposta poderosa e imediata, sem quaisquer considerações políticas”, declarou. “Como comandante-em-chefe das Forças Armadas, confio no julgamento dos militares sobre provocações abruptas e de surpresa, por parte da Coreia do Norte. (…) Por favor, cumpram com sua missão de zelar pela segurança do povo, sem se distrair um minuto", emendou a presidente, citada pela agência de notícias Yonhap.
“É preciso ter em mente que, tanto Park quanto o norte-coreano Kim Jong-un são líderes novos e tentam estabelecer sua credibilidade, por meio da liderança militar. Na prática, a presidente da Coreia do Sul terá a palavra final sobre uma eventual retaliação”, afirmou Steven Weber, professor de ciência política e de relações internacionais da Universidade da Califórnia-Berkeley. Ele alerta para o risco de os envios do radar e do destróier à costa norte-coreana serem interpretados como um convite à guerra. "As manobras defensivas de um país geralmente parecem ofensivas para o outro lado", observa.
Diretor do Centro para Estudos Coreanos da Columbia University (em Nova York), o historiador Charles K. Armstrong adverte que uma resposta poderosa de Seul a uma provocação de Pyongyang, ou até mesmo um ataque preventivo poderia escalar a tensão até uma guerra aberta. “Seria uma catástrofe para ambas as Coreias”, sustenta, em entrevista por e-mail. Ele também aposta que o regime de Kim Jong-un vai considerar a presença do radar naval norte-americano e do destróier como uma “ação provocativa” e mais um sinal da “política hostil” americana para com a Coreia do Norte. Um cenário que, segundo Armstrong, obrigará Pyongyang a intensificar ainda mais suas ameaças, levando os Estados Unidos a anunciarem novas ações militares. Um círculo vicioso perigoso e imprevisível.
Em sua edição de ontem, o jornal The Washington Post afirmou que autoridades norte-americanas e especialistas independentes concluíram que a Coreia do Norte deu passos incomuns para ocultar detalhes da arma nuclear testada em fevereiro. Duas análises da detonação de 12 de fevereiro confirmam que os efeitos da explosão foram excepcionalmente contidos, com poucos traços radioativos liberados na atmosfera. Um provável indicativo de mudança do projeto da bomba atômica, com o uso de urânio altamente enriquecido em seu núcleo.
Palavra de especialista
Histórico de provocações
Steven Weber - professor da Universidade da Califórnia-Berkeley
Os norte-coreanos têm um histórico de provocar a Coreia do Sul, inclusive com ataques mortíferos contra alvos menores. A melhor forma de pensarmos sobre o atual panorama na Península Coreana é visualizarmos uma competição de tomada de riscos. Pyongyang tenta levantar o perigo de uma guerra, a fim de aumentar o seu poder de barganha. Trata-se de um jogo perigoso, que funcionou para os norte-coreanos no passado. Os Estados Unidos farão tudo o que puderem para melhorar sua capacidade de defesa na região, enquanto tentam se abster de realizar manobras que possam ser consideradas agressivas e provocadoras, por parte da Coreia do Norte.
Uma situação muito perigosa
Charles K. Armstrong - diretor do Centro para Estudos Coreanos da Columbia University
Não acho que a Coreia da Norte deliberadamente tentará provocar o Sul. No entanto, ela podem responder ao que vê como uma provocação — exercícios militares sul-coreanos no mar, por exemplo — com algum tipo de ataque em pequena escala. Isso é o que a Coreia do Norte fez em novembro de 2010, quando bombardeou uma ilha sul-coreana. Infelizmente, o que cada lado vê como dissuasão é visto pelo outro lado como provocação. Permanecemos em uma situação muito tensa e perigosa. A Coreia do Sul adotou, desde ontem, um novo nível de retórica. Em parte,
é uma tentativa da presidente Park Geun-hye de mostrar que
ela é uma líder forte e que se levantará contra as ameaças norte-coreanas.