O novo governo italiano liderado pelo moderado Enrico Letta prestou juramento neste domingo, em uma cerimônia que foi marcada pela ação de um homem que abriu fogo próximo à sede do governo.
Letta, incumbido na quarta-feira pelo presidente Giorgio Napolitano de formar um governo apoiado em uma inédita coalizão de partidos da esquerda e da direita com a qual pretende tirar o país da crise econômica e política, foi o primeiro a jurar sobre a Constituição. Depois, foi seguido pelos 21 ministros de seu gabinete.
A cerimônia, que começou às 09h30 GMT (06h30 de Brasília), durou menos de meia hora, enquanto os meios de comunicação locais informavam sobre um tiroteio em frente ao Palácio Chigi, sede do governo, a 1 km de distância, que deixou dois carabineiros feridos.
Um dos carabineiros sofreu um ferimento no pescoço, o outro na perna. O autor do tiroteio também está hospitalizado. Uma bala atingiu de raspão uma pedestre, que recebeu atendimento médico.
O autor dos disparos é um calabrês (sul da Itália) de 49 anos que, segundo testemunhos recolhidos pela AFP no local dos incidentes, se apresentou em frente ao Palácio Chigi vestido de terno e gravata, antes de abrir fogo a 5 metros de distância dos carabineiros.
"É o gesto de um louco desequilibrado", afirmou o prefeito de Roma, Gianni Alemanno, diante da imprensa. Os dois carabineiros feridos e a pedestre "não estão em estado grave", acrescentou.
Trata-se de um ato isolado de um desempregado que queria se suicidar, disse o novo ministro italiano do Interior, Angelino Alfano. Segundo o funcionário, "não há preocupação pela situação geral de ordem pública", embora tenha informado que "a vigilância dos alvos de risco foi reforçada".
"Ainda assim é muito preocupante (...). É preciso ver quem é esta pessoa, por que escolheu este momento e este local, não é uma coincidência", disse no canal Sky TG24 Fiorenza Sarzanini, jornalista do Corriere della Sera.
No entanto, o dia havia começado sob o sinal da esperança levando-se em conta o caráter inovador do governo Letta, fruto de uma aliança sem precedentes entre a direita e a esquerda, que se destaca por uma idade média relativamente baixa (53 anos, 10 anos a menos que o governo Monti) e por uma forte presença feminina (7 de 21).
O novo executivo, formado após dois meses de paralisia política, é resultado de uma divisão equilibrada, com nove ministros do Partido Democrata, principal grupo de centro-esquerda, cinco do Partido de Silvio Berlusconi, o Povo da Liberdade (direita), três centristas e quatro tecnocratas.
"Esta é a primeira tentativa explícita de pacificação da Itália" com a formação de uma "coalizão completamente inédita que deixa para trás 20 anos de inimizade" entre a direita e a esquerda, ressaltou o editorialista político do Corriere della Sera, Massimo Franco.
De acordo com a maioria dos analistas, este governo era - como afirmou o presidente Giorgio Napolitano - "o único governo possível" após as eleições legislativas de 24 e 25 de fevereiro, nas quais a esquerda ganhou a maioria absoluta na Câmara de Deputados, mas não no Senado, câmara sem a qual é impossível governar e que está dividida em três blocos: PD, PDL e o Movimento 5 Estrelas (M5S).
A sáida dos "bigs", os pesos pesados da política que tanto a direita quanto a esquerda buscavam impor, como o ex-primeiro-ministro de esquerda Massimo D'Alema ou o ex-ministro de direita Renato Brunett, também surpreendeu os editorialistas.
A falta de experiência de alguns ministros pode ser uma fraqueza, mas também uma força, segundo o diretor do La Stampa, Mario Calabresi, já que "serão julgados pelo que farão, e não por seu passado".
Antes do tiroteio, que ofuscou em parte a cerimônia, os italianos se mostravam otimistas.
Para Biagio, de 70 anos, este governo "era a única possibilidade para governar a Itália". Mas os novos ministros devem - segundo ele - fazer "coisas boas para o povo, e não apenas para os políticos" e, "sobretudo, eliminar seus privilégios", disse à AFP.
No entanto, vários jornais de esquerda, como o il Fatto Quotidiano, expressaram sua preocupação acerca da influência que Berlusconi poderia ter sobre o executivo, já que seu braço direito, o próprio vice-primeiro-ministro Alfano, é o número dois do governo.