Jornal Estado de Minas

Partido Liberal Democrata do Japão volta ter maioria no parlamento

O Japão orgulha-se de suas credenciais democráticas

Jorge Macedo - especial para o EM
Na última terça-feira, os trabalhos na Dieta Nacional do Japão, como é conhecido o Parlamento, foram retomados. O Partido Liberal Democrata (PLD), que há décadas só manda menos do que a bem treinada burocracia do país, voltou a gozar de maioria em ambas as casas. A coalizão que sustenta o primeiro-ministro Shinzo Abe deve levar à frente, com renovado vigor e senso de urgência, a agenda de mudanças. Segurança e reforma econômica são as duas obsessões do nacionalista Abe.
O governo japonês quer o mais rápido possível instituir a sua versão da NSA (a agência de segurança nacional norte-americana que irrita o governo brasileiro com sua eficiência). Até dezembro, Abe quer ver aprovada a criação de um Conselho de Segurança Nacional, uma mímica da versão norte-americana. A estratégia de segurança japonesa, altamente atrelada aos EUA desde a derrota do país na Segunda Guerra Mundial, está passando por uma revisão impulsionada pela ótica de crescente nacionalismo. A ideia é de aumentar a cooperação com os EUA ao mesmo tempo em que diminui sua dependência dele. A propósito, o Japão já é o país com o quinto maior orçamento de defesa do mundo).

O discurso nacionalista de líderes como Abe conseguiu achar na competição com a China o medo e o viço necessários para realizar várias complicadas reformas. O crescimento chinês assusta o Japão e o faz desesperar-se com sua própria falta de crescimento. Daí a importância de reformas econômicas que tirem o Japão da estagnação em que se encontra. Estagnação que mudou gradualmente a condução política do país. No áureo período de larga expansão da economia, o Japão era um país regido por uma burocracia altamente bem formada, e as instituições políticas tinham pouco poder real. Pouco mais do que uma feira das vaidades – a doença funcional de artistas e políticos – é o que durante muito tempo foi a disputa política do país. O caminho da pátria, no entanto, estava traçado com clareza e qualidade e era levado à frente por sólidas instituições baseadas em eficiência e mérito.

Entre o fim da Segunda Guerra e os anos 1990, o Japão foi, por assim dizer, a China da vez. Entre 1960 e 1990, a média de crescimento da economia foi de 6,14% ao ano, passando às vezes por invejáveis ciclos de crescimento acima de 10% ao ano, como entre 1966 e 1969. Essas três décadas alçaram o Japão aos píncaros da economia mundial. Mas aí, na última década do século 20, o país começou a estacionar. De 1992 – após o irrompimento de gravíssima crise por causa de uma bolha econômica – até o presente, a economia japonesa cresceu, em média, preocupantes 0,82% ao ano. É evidente que é muito mais difícil crescer quando o Produto Interno Bruto I(PIB) per capita já é de país rico, que é o caso do Japão desde então. Mas a dificuldade japonesa vai muito além disso e é hoje uma doença da abundância.

Com o arrastar da estagnação, a política foi gradualmente ganhando espaços de influência. Afinal, esse ajuste de rumo na magnitude necessária só pode ser feito, em um país democrático, por caminhos políticos eleitorais. O Japão orgulha-se de suas credenciais democráticas, mas um olhar mais agudo mostra que o jogo democrático maior do país ocorreu por muito tempo majoritariamente dentro de um único partido, o PLD, e pouco importava quem fosse eleito. Essa realidade vem mudando, mas nem tanto.

O PLD governou o país ao longo dos últimos 60 anos, salvo por cinco anos a partir da crise de 1990/1991. O que é semelhante ao resto do mundo é que todas as vezes que a oposição foi ao poder no Japão o foi em momento imediatamente posterior à eclosão de alguma grave crise econômica. Atualmente, o principal partido de oposição, o Partido Democrático do Japão (PDJ), e o único com possibilidades concretas de brigar para liderar o governo do país, é em muitos aspectos uma mera dissidência do PLD.

O aumento do poder dos políticos e a eleição de líderes carismáticos como Junichiro Koizumi, na primeira metade dos anos 2000, e agora Abe, pela segunda vez no poder, é um movimento que merece atenção, pois abala a previsibilidade burocrática dos país pós-1945. A meritocracia dos mandarins é uma das facetas que chegaram da China ao Japão. Vinda via confucionismo, junta-se aos ideogramas como uma das características principais que mostram que esses países que tanto se estranham têm mais em comum do que querem às vezes admitir. Nos últimos anos, as tensões entre os dois vêm aumentando rápida e constantemente, e a disputa com a China é a força que aglutina e move toda a política de Shinzo Abe. Todavia, ao misturar questões econômicas com as de segurança nacional, Abe pisa em terreno incerto. Menos por estar atento ao princípio de que vizinho competitivo ajuda mais do que atrapalha.