A despeito das críticas da ONU – que advertiu o Uruguai pela violação de tratados internacionais e por agir individualmente em um tema que demanda esforços conjuntos –, Carneiro sustenta que a experiência uruguaia e o debate em diversos países vão exigir de organismos multilaterais a revisão de convenções sobre o tema, provocando mudanças de padrões “das relações internacionais e da jurisprudência”. A estratégia de combate aos efeitos colaterais do tráfico, por meio da legalização da maconha, foi aplaudida pela Organização dos Estados Americanos (OEA) e pelo México e a Guatemala. Chile, Argentina e Paraguai – o maior produtor da droga na região, que manifestou temor do narcotráfico – reagiram com cautela.
No Brasil, o debate sobre o experimento uruguaio e seus possíveis reflexos na fronteira dividiu parlamentares e ministros. Na avaliação de Ilona Szabo, coordenadora do Secretariado da Comissão Global de Política sobre Drogas, o fato de o mercado uruguaio ter pouca importância para o tráfico internacional não dá condições para que a nova política impacte a região em termos de aumento da produção ou de mudanças na rota do narcotráfico. “Justamente porque o país (Uruguai) tem problemas relativamente pequenos com a violência e o tráfico, se comparados com o restante da região, o presidente Mujica resolveu implementar uma política que, com outras estratégias, ajudaria a prevenir e a reduzir a criminalidade no país”, observa Ilona.
Ela pondera que o paradoxo da discussão sobre os efeitos sociais do mercado de drogas é a proibição, “mais permissiva do que a regulação”. “Quem quiser comprar drogas o faz sem regra, restrição de idade ou controle de qualidade, literalmente em todas as cidades do planeta. Dessa forma, não é provável que as pessoas se desloquem até o Uruguai para comprar maconha”, avalia. Ilona e Carneiro consideram que a experiência deve afastar o consumidor de maconha dos traficantes que oferecem drogas mais pesadas e lucrativas, como a cocaína, e retirar o lucro do mercado ilegal, além de seu potencial para a violência. “Espera-se que, ao tirar tamanho lucro dos traficantes, o poder deles de corromper agentes públicos, comprar armas e ampliar redes ilegais diminua. Isso, certamente, teria impacto na violência”, argumenta Ilona.