Dezenas de manifestantes morreram nesta quinta-feira em Kiev, durante violentos confrontos que obrigaram o presidente ucraniano, Viktor Yanukovytch, a aceitar a proposta internacional que prevê eleições antecipadas no país.
Esta concessão foi a única arrancada pelos três ministros europeus que realizam uma mediação entre o governo ucraniano e a oposição: o chefe da diplomacia francesa, Laurent Fabius, e seus colegas alemão, Frank-Walter Steinmeier, e polonês, Radoslaw Sikorski.
A pressão aumentou quando Alemanha, Estados Unidos e Rússia se pronunciaram por "uma solução política" para a crise, que está criando uma tensão digna da Guerra Fria entre Moscou e os governos ocidentais.
"É preciso cessar o banho de sangue", assinalou um comunicado difundido por Berlim.
A violência tomou conta da Ucrânia nesta quinta-feira, com pelo menos 100 mortos em Kiev, segundo a oposição.
O ministério da Saúde comunicou 75 óbitos desde terça, elevando um registro anterior de 67 vítimas.
O ministério do Interior informou a morte de três policiais nesta quinta, que se somam aos dez agentes mortos nos dois dias anteriores. Em Lviv (oeste), os corpos de dois policiais foram encontrados numa base policial queimada, anunciaram as autoridades locais.
Armados com bastões, escudos com pregos, pedras e coquetéis molotov, centenas de manifestantes radicais enfrentaram a Polícia de Choque Berkut, que revidou com balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo. Mas, segundo testemunhas, atiradores estavam posicionados nos altos dos prédios com fuzis.
O ministério do Interior reconheceu, posteriormente, que agentes dispararam com munição convencional, alegando que estavam protegendo suas vidas.
Os disparos procederam tanto de policiais no solo quanto de agentes posicionados em prédios.
Imagens exibidas por uma rede de televisão ucraniana mostram homens armados com fuzis, aparentemente integrantes das forças de segurança. Um deles abre fogo contra um alvo não identificado, no centro de Kiev.
"Os manifestantes foram mortos de maneira muito profissional por atiradores emboscados que atingiam as vítimas no coração, na cabeça ou na carótida", afirmou a médica Olga Bogomolets, entrevistada pela rede Kanal 5.
Após uma trégua nos confrontos, manifestantes reforçaram as barricadas no centro da cidade com tapumes e pneus, e garrafas vazias foram levadas para serem transformadas em coquetéis molotov.
- "Cenário real" -
"O pior cenário que podíamos prever, o de uma guerra civil, infelizmente é muito real", declarou o primeiro-ministro polonês, Donald Tusk.
"Foi decidido com Yanukovytch a realização de eleições presidenciais e parlamentares este ano e a formação de um governo de união nacional nos próximos dez dias para mudar a constituição até o verão" (hemisfério norte), acrescentou Tusk, sem esconder seu ceticismo.
"Mas a experiência nos mostrou que os compromissos assumidos pela administração ucraniana raramente são respeitados", ressaltou.
Enquanto isso, outros ministros das Relações Exteriores da União Europeia, reunidos em Bruxelas, aumentaram a pressão, decidindo cancelar os vistos e de congelar os bens de autoridades ucranianas.
Depois que a crise na Ucrânia atingiu o auge, a chanceler alemã, Angela Merkel, o presidente americano, Barack Obama, e o presidente russo, Vladimir Putin, conversaram por telefone para discutir uma solução que acabe com o derramamento de sangue. Os três "concordaram que é preciso encontrar uma solução política para a crise na Ucrânia o mais rápido possível", indicou o governo alemão.
A Casa Branca se disse "escandalizada" com os ataques a tiros das forças de segurança contra os manifestantes na Ucrânia, e novamente exortou o presidente Viktor Yanukovytch a retirar os policiais do centro da capital.
O vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, advertiu Yanukovytch que Washington adotará sanções se funcionários do governo ucraniano ordenarem disparos contra os manifestantes opositores.
Biden falou com o líder ucraniano por telefone e "deixou claro que os Estados Unidos estão preparados para aplicar sanções contra os funcionários responsáveis pela violência".
Enquanto especialistas consideram que a Rússia é fundamental para que a crise seja solucionada, Moscou tem mantido uma posição muito firme. O chefe de governo, Dmitri Medvedev, explicou que seu país vai cooperar apenas com um poder que não aceita ser "pisado".
O Kremlin indicou durante a tarde que vai enviar seu representante, o delegado de direitos humanos Vladimir Lukin, a pedido da Presidência ucraniana, para participar de uma mediação com os opositores.
Mais cedo, a sede do governo, próxima à Praça da Independência, foi totalmente esvaziada. O prefeito de Kiev anunciou sua saída do partido do governo para protestar contra o "banho de sangue". Doze deputados da legenda de Yanukovytch também anunciaram que estavam se desligando do Partido das Regiões, em protesto contra a violência.
O Parlamento, que pela primeira vez conseguiu formar uma maioria anti-Yanukovytch, votou durante a noite uma resolução contra as medidas de combate ao terrorismo anunciadas na véspera pelos serviços especiais e ordenando o retorno dos soldados às suas bases.
"O afastamento imediato de Yanukovytch e os processos contra ele por assassinatos em massa de civis devem ser a única exigência do povo, da oposição e da comunidade internacional", declarou o opositora presa Yulia Timochenko em declaração divulgada no site do seu partido.
A onda de contestação no país começou em novembro de 2013 após a desistência do presidente ucraniano em assinar um acordo com a União Europeia, optando por se reaproximar de Moscou.
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