O governo egípcio, instaurado pelo exército após a destituição do presidente islamita Mohamed Mursi, renunciou nesta segunda-feira com a aproximação de eleição presidencial à qual seu comandante, o novo homem forte do país, deve se candidatar.
O primeiro-ministro Hazem el-Beblawi apareceu na televisão estatal para anunciar a renúncia de seu gabinete, cujo trabalho em tempos de crise foi elogiado por ele, referindo-se a situação da segura e as dificuldades "econômicas" do mais populoso país árabe, mergulhado em uma espiral de violência desde a destituição e prisão do primeiro presidente democraticamente eleito do Egito, em 3 de julho, pelo exército.
Desde então, seus partidários e a Irmandade Muçulmana, à qual pertence, têm sido violentamente reprimidos.
Neste contexto, o chefe do exército, o poderoso ministro da Defesa e vice-primeiro-ministro do governo de Beblawi, o marechal Abdel Fattah al-Sissi, que arquitetou a queda de Mursi, deve, segundo pessoas próximas, anunciar em breve sua candidatura à presidência.Agraciado com a mais alta patente do exército, Sissi também deverá renunciar ao cargo que ocupa no governo e deixar a carreira militar para reunir todas as condições necessárias para se candidatar.
A eleição deverá ocorrer na primavera, de acordo com o "roteiro" estabelecido pelo exército após o golpe contra Mursi. O marechal Sissi, muito popular entre os egípcios, tem boas chances de vencer a disputa.
O único candidato declarado até o momento, o líder a esquerda Hamdeen Sabbahi, afirmou que teme um retorno a um poder autoritário, enquanto a repressão que já fez mais de 1.400 mortos, segundo a Anistia Internacional, e milhares de prisões entre os islâmicos, também tem atingido os jovens militantes progressistas. Para este ativista que se opôs a Mursi, e antes dele, a Hosni Mubarak, é a "revolução" que colocou um fim no início de 2011 a 30 anos de poder absoluto do "rais" que está agora em perigo.
Os jovens manifestantes de 2011 contra Mubarak e que protestaram contra Mursi no final de junho "sentem que a sua revolução foi roubada (...), porque muitos de seus companheiros foram presos e mortos", observou Sabbahi.
No início da tarde desta segunda-feira, um comunicado oficial anunciou que o governo "decidiu à luz das atuais circunstâncias que o país atravessa (...) apresentar a sua renúncia ao presidente da República Adly Mansur". "O governo assumiu durante os seis ou sete meses sua responsabilidade e dever", ressaltou Beblawi, e "não poupou esforços para tirar o Egito do mau momento que tem passado".
'Necessidade de sangue novo'
"Este não é o momento para interesses pessoais, a nação está acima de todos", acrescentou, elogiando a realização do referendo constitucional em meados de janeiro, que marcou a adoção do Lei Fundamental, a primeira etapa da "transição democrática" prometida pelo exército no início de julho.
Com uma percentagem de "sim" superior a 98%, este referendo, boicotado pela juventude, mobilizou cerca de 39% dos eleitores. O porta-voz do governo Hani Salah disse que a renúncia foi motivada pelo "sentido da necessidade de sangue novo" no governo. "O Egito está avançando, esta decisão não terá impacto sobre as relações externas e a estabilidade interna", prometeu, acrescentando que ainda não havia sido determinado quais ministros serão mantidos.
A equipe que renunciou anunciou dois pacotes de estímulo econômico financiados pelo Golfo, mas que enfrenta fortes críticas, mesmo entre os partidários do marechal Sissi que veem este governo como incapaz.
Quanto a Mursi, que responde à quatro processos na Justiça, um deles foi retomado nesta segunda-feira, antes de ser adiado à espera de uma decisão sobre um pedido dos advogados de defesa pela troca de juízes.