Por séculos, ciência e religião trilharam caminhos por vezes paralelos, mas quase sempre sem se cruzar. Na manhã desta terça-feira, uma declaração do Papa Francisco alinhou uma das maiores polêmicas entre as duas. Em um evento na Academia Pontifíca de Ciências, o líder da Igreja Católica afirmou que a Teoria da Evolução está correta e não é incompatível com a ideia cristã de que Deus criou o mundo.
“Quando lemos sobre a criação do mundo em Gênesis, corremos o risco de imaginar que Deus era um mágico com uma varinha capaz de fazer tudo. Mas isso não acontece. Deus criou os seres humanos e permitiu que se desenvolvessem de acordo com leis internas que Ele deu a cada um para que alcancem sua realização”, disse.
Por séculos, a leitura literal do livro de Gênesis da Bíblia cristã explicou a criação do mundo. Nos últimos dois séculos, no entanto, a comunidade científica adotou uma versão bem diferente, que é a ideia vigente sobre como se deu a origem da vida no planeta e como ela se desenvolveu.
Para o Papa, Deus continua na ponta da origem do universo, como um criador que deu liberdade à sua criação de se desenvolver e evoluir. Segundo ele, o Big Bang – teoria que diz que o universo foi criado a partir de uma explosão cósmica, cerca de 13,7 bilhões de anos atrás – não contradiz a intervenção do criador divino, mas a exige. “A evolução da natureza não contrasta com a noção de criação, como a evolução pressupõe a criação de seres que evoluem”, completa.
O Papa Pio XII foi quem abriu as portas para a ideia da evolução na Igreja Católica. João Paulo II foi mais longe e disse que a evolução era um fato comprovado. Francisco avança mais e sugere que a evolução estava dentro dos planos divinos.
“Quando, no sexto dia da narrativa do Gênesis, o homem foi criado, Deus dá ao ser humano outra autonomia, uma autonomia que é diferente daquela da natureza, que é a liberdade”, disse o Papa Francisco. “Ele diz ao homem para designar tudo e seguir em frente com a história. Isso o torna responsável pela criação, para que ele possa administrá-la, a fim de desenvolvê-la até o fim dos tempos.”, explica.
Debates
A polêmica da criação do mundo vem sendo alvo de debates intensos na comunidade cristã, especialmente entre cientistas cristãos. No ano passado, o projeto “O Teste da Fé” reuniu depoimentos de cientistas protestantes de áreas como genética, biologia, física e matemática que acreditam que as duas teorias se complementam.
Para a idealizadora do projeto, a britânica Ruth Bancewicz, Gênesis não é um livro científico e não deve ser entendido como tal. Para ela, a estória contada nos primeiros capítulos usa uma descrição geral para dizer que Deus foi responsável pela concepção do mundo. A interpretação literal seria como afirmar que "às 9h Deus fez um arbusto, às 9h15 Ele fez uma árvore". Cientificamente, não haveria minutos suficientes para todo o trabalho.
Entre os defensores do 'casamento' estão a coordenadora do Centro de Voos Espaciais da NASA, Jennifer Wiseman, e Francis Collins, ex-diretor do Projeto Genoma Humano. Complementam os depoimentos neurobiólogos, físicos, astrônomos, matemáticos e doutores em teologia, de universidades como Cambrigde, Oxford e o Massachusetts Institute of Tecnology (MIT). Apesar de acreditar na evolução proposta por Darwin, muitos dos pensadores refutam a ideia de que a teoria seja válida para explicar tudo referente ao homem e à experiência humana.