Jornal Estado de Minas

Morre Roberto Bolaños, criador do Chaves, que marcou a infância latino-americana

AFP

O legendário comediante mexicano Roberto Gómez Bolaños, conhecido no Brasil como o personagem Chaves, morreu nesta sexta-feira, aos 85 anos, informou a rede de televisão Televisa.

"Faleceu Roberto Gómez Bolaños", informou a Televisa, iniciando uma programação especial em homenagem ao ator, que enfrentava há anos problemas respiratórios e vivia no balneário de Cancún.

Segundo Joaquín López-Dóriga, principal âncora do telejornal da Televisa, Gómez Bolaños faleceu nesta localidade turística, onde vivia afastado há vários anos devido à saúde debilitada.

Em suas últimas aparições públicas, Gómez Bolaños sempre se deslocava com o auxílio de uma cadeira de rodas.

Na casa do ator estavam a segunda esposa, a atriz Florinda Meza - estrela de suas séries -, dois irmãos e alguns dos seis filhos.

"Obrigado por tanto, Pai.

Te amo", escreveu no Twitter o filho Roberto Gómez Fernán, produtor de televisão.

"Dizer adeus seria bobo, um até breve apenas será...", escreveu a filha Paulina Gómez.

Um porta-voz da Televisa disse à AFP que a rede de televisão fará uma homenagem a Bolaños no próximo domingo, no Estádio Azteca, que tem capacidade para 105 mil pessoas.

No sábado, o corpo deverá ser velado na sede da Televisa, na Cidade do México, em uma cerimônia fechada ao público.

O presidente mexicano, Enrique Peña Nieto, enviou uma mensagem de pêsames à família de Bolaños, acrescentando que "o México perdeu um ícone, cujo trabalho transcendeu gerações e fronteiras".

"Estou em estado de choque, jamais pensei que isto fosse me afetar tanto (...). Vou lembrar sempre do seu sorriso", disse, chorando, o ator Édgar Vivar, o "Seu Barriga", da série Chaves.

Gómez Bolaños fez rir gerações de crianças latino-americanas, com personagens inesquecíveis como 'Chapolin Colorado' e 'Chaves', que usava do humor para revelar os profundos temores que o assombravam desde criança.

Por causa de sua prolífica escrita, que rendeu roteiros para rádio, televisão, cinema, teatro e inclusive vários livros, Gómez Bolaños foi apelidado por um colega de 'Chespirito', um pseudônimo que aliava a comparação com o talento do dramaturgo Shakespeare e um diminutivo que refletia a sua baixa estatura.

O comediante nasceu em 21 de fevereiro de 1929 em uma família de classe média da Cidade do México. Seu pai, um boêmio amantes das artes, trabalhou como desenhista e ilustrador para importantes jornais, mas a vida desregrada provocou sua morte precoce, quando o pequeno Roberto tinha apenas seis anos.

"Desde criança, minha característica principal sempre foi o medo. Lembro que sentia medo de olhar debaixo das camas (...) e, quando jovenzinho, foi pior, por isso fui briguento", contou Bolaños em uma das muitas entrevistas que concedeu.

- Dos gramados para os palcos -

Quando adolescente, Bolaños sonhava ser jogador de futebol e se destacou em torneios escolares de boxe, que disputava escondido da mãe. Aos 22 anos, começou a estudar engenharia mas se aventurou a escrever anúncios em uma agência de publicidade e logo estreou como roteirista em programas de rádio, televisão e cinema que ganharam fama.

Mais tarde, aproveitou a ausência de algum ator nas gravações para fazer graça diante das câmeras, dando os primeiros passos para o comediante que interpretaria personagens nascidos em sua própria imaginação.

Aos 40 anos, Bolaños estreou na televisão mexicana com o programa "Chespirito" que, com interpretações diversas, ficou no ar por 25 anos ininterruptos em horário nobre. Após alcançar níveis inéditos de audiência, foi exportado para o restante da América Latina e para a Espanha.

- "Foi sem querer, querendo" -

Espremido em um justíssimo macacão vermelho e short amarelo, o 'Chapolin Colorado', um de seus personagens mais famosos, foi uma espécie de super-herói latino-americano, ou melhor, um anti-herói que Bolaños encarnou para contar as aventuras incríveis de um personagem que se fazia valer de seus duvidosos poderes sobrenaturais.

"Mais ágil que uma tartaruga, mais forte que um rato, mais nobre que uma alface, seu escudo é um coração", dizia uma voz, em off, para apresentar o personagem.

"A coragem não consiste em não sentir medo, mas em superar o medo.

'O Chapolin Colorado' o fazia, consciente de que era pequeno, frágil, bobo, incapaz (...) Mas enfrenta o problema. Esse é um herói", disse Bolaños, já transformado em lenda.

O comediante também deu vida ao pusilânime 'Chómpiras', um ladrãozinho sem talento, o 'Doutor Chapatín', que não gostava de ser lembrado que era velho, ou o maluco 'Chaparrón Bonaparte'.

Mas seu personagem mais celebrado foi 'Chaves', um menino órfão e pobre que vivia dentro de um barril, em uma vila suburbana, e repetia a frase "foi sem querer, querendo" para se desculpar de suas travessuras.

A pena de Gómez Bolaños, que vivia afastado no balneário de Cancún (sudeste), onde morreu após anos sofrendo de doenças respiratórias, ultrapassou os limites dos livretos, como demonstra o telefilme "El Chanfle" e a peça de teatro "11 y 12", que protagonizou e produziu.

Além disso, escreveu os livros "Diário do Chaves" (2005) e sua autobiografia, "Sem Querer Querendo: Minhas Memórias" (2007).

- Dissabores da vida de 'Chespirito' -

Na vida pessoal, Bolaños casou-se pela primeira vez com Graciela Fernández, com quem teve seis filhos, cinco mulheres e um homem, Roberto, que dirigiu e produziu telenovelas.

Mas a vida itinerante que o sucesso trouxe para 'Chespirito' acabou com este relacionamento e ele decidiu unir-se a Florinda Meza, uma atriz que colaborou com ele desde o começo e o acompanhou até o final de seus dias. Ela foi intérprete da Dona Florinda, um dos personagens principais de 'Chaves'.

Um dos pontos obscuros de sua biografia foram as amargas disputas com os atores Maria Antonieta de las Nieves (a 'Chiquinha') e Carlos Villagrán (o 'Quico'), disputando a autoria e os direitos de seus personagens, em pleno auge de Chaves'.

Gómez Bolaños garantiu não guardar rancor dos colegas e manteve seu característico senso de humor até o fim.

"Para que querem o meu perfil se sou mais bonito de frente?" - diz a apresentação de sua conta no Twitter, que abriu aos 82 anos e tem mais de seis milhões de seguidores.

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