O governo da Austrália prometeu nesta terça-feira esclarecer por que um islamita de origem iraniana e com um histórico de extremismo e violência foi capaz de levar adiante uma "fantasia doentia" ao fazer reféns em uma cafeteria, em um cerco que durou um dia inteiro.
Um mar de flores tomava conta de um memorial improvisado perto do local do incidente, no coração do bairro financeiro de Sydney, onde os líderes da comunidade muçulmana se juntaram aos cidadãos locais em luto pelas duas vítimas do crime.
O primeiro-ministro australiano, Tony Abbott, admitiu que o atirador morto, identificado em reportagens como um refugiado de 50 anos chamado Man Haron Monis, estava livre apesar de ter sido acusado de crimes graves, incluindo ofensas sexuais e cumplicidade em assassinato.
"Pessoas decentes e inocentes foram pegas pela fantasia doente de um indivíduo profundamente perturbado e vimos as consequências dessa situação nas últimas 36 horas", disse aos repórteres.
"Como alguém que teve uma história tão longa e complicada não estava nas listas de vigilância adequadas e como pode uma pessoa como essa estar totalmente livre na comunidade?", questionou.
"Estas são perguntas que precisamos analisar com cuidado, calmamente e metodicamente para aprender as lições certas e agir de acordo com elas. Isso é o que vamos fazer nos próximos dias e semanas", disse.
Os dois reféns mortos no sequestro dramático no café de Sydney foram saudados como heróis dispostos a sacrificar suas vidas pelo próximo em uma cerimônia religiosa.
Tori Johnson, de 34 anos, gerente do Lindt Chocolat Cafe, palco da tomada de reféns pelo islamista radical, e Katrina Dawson, advogada de 38 anos e mãe de três filhos, morreram no momento em que a tropa de elite da polícia invadiu o local.
Durante uma cerimônia na catedral St Mary's, que fica perto do local da tragédia, o arcebispo Anthony Fisher citou o "coração partido" da cidade.
"Esta manhã ouvimos informações a respeito do heroísmo da vítima masculina da tomada de reféns", disse.
"Aparentemente, durante uma tentativa, Tori Johnson tomou a arma do sequestrador, mas tragicamente aconteceu um disparo que o matou. No entanto, isto precipitou a intervenção da polícia e, no fim, a libertação da maioria dos reféns", completou o religioso.
"Também, ao que parece, Katrina Dawson tentava proteger uma amiga grávida. Estes heróis estavam dispostos a sacrificar suas vidas para que outros pudessem viver", afirmou o arcebispo.
A polícia não confirmou a luta entre o gerente do café e o sequestrador e destacou que a investigação sobre os acontecimentos ainda está em curso.
Solitário e desequilibrado
O sequestrador foi identificado pela imprensa como Man Haron Monis, autoproclamado "xeque", de origem iraniana e com ficha judicial. As autoridades também destacaram o desequilíbrio mental do criminoso, aliado a uma "atração pelo extremismo".
Um ano antes de tomar o café de Sydney, Monis havia sido acusado de participar do assassinato de sua esposa, mas apesar de uma longa lista de agressões sexuais, um juiz decidiu libertá-lo sob fiança.
Sua esposa Noleen Hayson Pal, de 30 anos, foi vítima de um assassinato horrendo em abril de 2013: foi atingida por 18 facadas e queimada no oeste de Sydney.
Monis, que chegou à Austrália como refugiado do Irã em 1996, foi acusado de cumplicidade junto com uma namorada que tinha na época.
No entanto, um magistrado disse que o caso da promotoria era fraco e deu a ambos liberdade sob fiança, embora Monis já enfrentasse dezenas de acusações de agressões sexuais desde sua época de "curandeiro espiritual".
Além do primeiro-ministro Abbott, outras autoridades locais questionaram por que Monis estava livre.
"Pedimos às agência estatais e às agências federais que examinem cuidadosamente como este criminoso passou pelas brechas", afirmou o procurador-geral do Estado de Gales do Sul, Brad Hazzard.
O primeiro-ministro do Estado, Mike Baird, acrescentou: "Todos estamos indignados de que este indivíduo estivesse na rua".
Monis se tornou conhecido das autoridades australianas quando foi condenado por enviar cartas ofensivas a familiares de soldados mortos, há sete anos.
Além disso, tinha uma história turbulenta paralela aos seus embates com o sistema judiciário, protestando durante anos contra as injustiças que supostamente havia sofrido e impugnando as sentenças dos tribunais.
Um advogado que havia representado Monis no caso das cartas ofensivas disse que se tratava de um ideólogo extremista, mas que sua ação não era obra de um grupo organizado.
"Este é um indivíduo solitário, que age ao acaso", disse Manny Cnditsis à rádio nacional. "Não se trata de um acontecimento ou de um ato de terrorismo planejado. Trata-se de um homem conflitivo que fez algo intolerável", acrescentou.