Sindhupalchowk, no sopé do Himalaia, tem mais mortos do que toda a cidade de Katmandu. Até agora, 1.476, somando apenas os que já foram identificados. Em boa parte de Sindhupalchowk, onde o Estado esteve ontem, não há duas casas lado a lado que não tenham sido destruídas.
Não há luz, a água está acabando. Nos acampamentos, crianças e adultos sobrevivem de biscoitos e macarrão instantâneo comido cru. Dezenas de feridos se amontoam em cobertores no chão, à espera de transferência para a capital. Sem saber para onde ir ou o que fazer, moradores escalam as pilhas de pedras do que um dia foram suas casas para recuperar um pouco do que tinham.
Foi apenas na quarta-feira, quatro dias após o terremoto, que a ajuda internacional começou a chegar a esses distritos.
Comandante do grupo do Exército que coordena as buscas em Chautara, o major Deepak explica que essa é a parte mais difícil: "Em alguns lugares nem o helicóptero vai. Temos de andar horas a pé para resgatar essas pessoas".
Os feridos são levados para uma tenda, onde são atendidos pelos médicos que ficaram. Mas sem energia elétrica e equipamentos básicos, tudo o que os médicos podem fazer é enfaixar pernas, braços e cabeças e separar os casos mais graves para encaminhar a Katmandu. Saraswoti Thapa, de 45 anos, acabava de sair da tenda médica com a filha Aruna, de 5 anos. A menina, que caiu ao caminhar pelo acampamento no escuro, levou pontos e teve a cabeça enfaixada. "Não tem raio-x. Temos de rezar para não ser mais nada mais grave", disse o pai.
Em Chautara, praticamente a população inteira, cerca de 8 mil pessoas que vivem nas encostas do Himalaia, não tem mais onde morar. Boa parte foi embora, para a casa de parentes. A maioria vive em tendas, mas sem roupas para enfrentar o frio noturno nas montanhas ou utensílios para cozinhar.
Na tarde de ontem, ajudada pelos homens da família, Rashana Sahi, de 25 anos, tentava salvar o possível dos escombros de sua casa. A pilha a seu lado tinha cobertores e travesseiros, uma panela, uma bolsa de roupas. Na sua mão, uma pulseira de pérolas falsas e um pente.
As autoridades locais estimam que 60 mil casas do distrito tenham sido destruídas, mais da metade da região. Em algumas áreas, a realidade é bem pior. Em uma pequena vila às margens da estrada que leva até Chautara moradores se acomodam em pilhas de tijolos. Nenhuma casa ficou em pé e todo vilarejo está coberto de entulhos. Só ali 183 mortos foram retirados dos escombros pelos próprios moradores.
"Ainda tem mais. Estamos sentindo o cheiro nos escombros, podem ser pessoas ou animais. Estamos fazendo o trabalho sozinhos, mas não conseguimos mais", explicou Chatur Giri, de 56 anos, líder do conselho de moradores do vilarejo. Por ali, a ajuda ainda não chegou. A comida, macarrão e biscoitos, é o que sobrou do estoque de uma das lojas.
Protestos
Eram 16 horas quando o prefeito de Chautara, Krishna Poudel, tentou entrar discretamente ontem na prefeitura. Não conseguiu. Em minutos, uma multidão enfurecida cercou o local.
Exigiam, aos gritos, que a prefeitura entregasse lonas para tendas que supostamente estariam guardadas - o que não era verdade. Conhecidos pela tranquilidade, os nepaleses estão perdendo a paciência com a resposta tímida e confusa do governo. Pela manhã, centenas de nepaleses cercaram o Parlamento exigindo mais transporte de Katmandu para o interior. Em várias partes do país, moradores de pequenas vilas fecharam as estradas exigindo atendimento..