Paris começa a voltar à normalidade depois de uma série de atentados que deixaram ao menos 128 mortos e 250 feridos na sexta-feira à noite. No entanto, para muitos belo-horizontinos que moram ou estão em viagem ou a trabalho na capital francesa, os momentos de pânico dificilmente serão esquecidos. “A ficha demorou a cair. Depois, a sensação foi de um mal-estar terrível. Ficamos em choque e não conseguimos dormir à noite e a minha mulher teve pesadelos”, relata o arquiteto Rafael Yanni, de 43 anos, que estava com a mulher em um restaurante do Boulevard Voltaire, a uma quadra de onde aconteceu um dos atentados. O casal faz parte de em um grupo de 40 brasileiros que participavam de um evento sobre tecnologia, com mais 5 mil pessoas de várias partes do planeta. Muitos brasileiros, segundo ele, acompanhavam uma partida de futebol entre França e Alemanha, no Stade de France, em Saint-Denis, onde bombas explodiram.
Na manhã deste sábado, Rafael e a mulher, a empreendedora Renata Ávila Alamy, de 39, enfrentaram o medo e saíram às ruas. Disseram ter encontrado alguns supermercados e lojas abertos, mas com a segurança reforçada. “Todos os clientes têm suas bolsas e sacolas revistadas, até mesmo as pessoas idosas”, conta Rafael. Shows foram cancelados, praças e parques estavam fechados, segundo ele. “Não encontramos restaurantes abertos”, comentou. O arquiteto disse ter percebido mudanças no comportamento dos parisienses. “Eles, que não têm o costume de ficar olhando muito para as pessoas, agora estão atentos, desconfiados, observando tudo”, disse.
Neste sábado seria o encerramento do evento que Rafael participava, mas foi cancelado. Na quinta-feira, as atividades acabaram e muitos colegas dele decidiram ir ao Stade de France. “Eu e a minha mulher preferimos ir ao restaurante no Boulevard Voltaire, que fica a dez quadras da casa de espetáculo Bataclan, onde estava a maioria dos mortos. Muitos da minha turma vieram à Europa pela primeira vez e ficaram mais assustados. Alguns anteciparam a volta”, conta o arquiteto, que recebe apoio de amigos que moram em Paris e, por isso, está mais tranquilo. “Mesmo assim, mudamos alguns hábitos, como não sair mais à noite”, disse.
A sensação do arquiteto agora de alívio. “Depois dos atentados, olhei o mapa do local onde a gente estava e era a ponta de uma linha de ataque”, comentou Rafael, que também está hospedado próximo ao restaurante Petit Cambodge, onde um homem usando uma arma automática abriu fogo.
Rafael conta que ele e a mulher haviam marcado encontro no restaurante com um brasileiro que mora há oito anos em Paris e que trabalhou como garçom no evento em que ele estava. “Ele escutou barulho de metralhadora quando entrava no restaurante. Minutos depois, começou uma grande movimentação de ambulâncias e de carros de polícia nas ruas. As pessoas foram orientadas a não sair do restaurante. Meu cunhado me mandou uma mensagem do Belo Horizonte preocupado com agente. Depois, a família toda começou a mandar mensagens, preocupada”, disse.
O jornalista Etiene Egg, de 35, que mora em Paris há três anos com a noiva, conta que por sorte resolveram ficar em casa na noite do atentando, vendo filmes. “Ouvimos muitas ambulâncias, helicópteros, carros de polícia durante toda a noite. As redes sociais foram os principais meios de comunicação para saber notícias dos amigos brasileiros ou de outras nacionalidades que também residem aqui. Pela manhã, tudo estava calmo, silencioso, estranho. Uma espécie de luto que foi quebrado apenas pelas conversas com os vizinhos e relatos incessantes dos informativos de TV sobre o ocorrido. É incrível a capacidade dos franceses, que são conhecidos pela frieza nas relações com estranhos, se transformarem ao ponto de abrir a própria casa para que as pessoas que estivessem nas ruas pudessem se abrigar de alguma forma até que tudo se acalmasse. É interessante também perceber que, apesar de estarem horrorizadas com tudo o que aconteceu, não se dão por vencidas”, relata o mineiro.
Segundo Etiene, os franceses compreendem que é um momento delicado, mas não aceitam se entregar ao medo e continuam indo para as ruas. “Os principais centros comerciais, mercados, monumentos e museus, entre outros locais de grande aglomeração, estão fechados. Os noticiários repercutem cada detalhe, principalmente a declaração do presidente de que esta foi uma ação de guerra e que a França e que os cidadãos franceses vão mostrar que são muito maiores do que tudo isso”, disse.
De acordo com o mineiro, o discurso é de união, apesar dos inevitáveis comentários que tratam de maneira preconceituosa a presença de imigrantes em território francês. “Mas isso fica abafado sob as discussões que realmente pretendem contribuir para a resolução do problema que vem gerando todo este medo e fazendo vítimas. As pessoas demonstram de maneira esperançosa que é preciso lutar contra isso, não se esconder”, afirmou.
Outra mineira que ficou assustada é Fernanda Cristo, de 28, que é especialista em comunicação corporativa e mora em Paris. Na manhã deste sábado, ela precisou sair de casa para ir ao supermercado e percebeu que a rotina já começa a voltar ao normal. “As pessoas já saem às ruas. A minha sorte é que moro no sul de Paris, longe de onde tudo aconteceu”, disse.
Fernanda conta que viu pessoas saindo com crianças, em restaurantes, mas os cinemas, parques e museus permanecem fechados. “Mesmo assim, está todo mundo abalado. Hoje, uma amiga minha iria oferecer um jantar na casa dela e todo mundo desistiu de ir, mesmo porque o clima não está para festa. Acho que nem é por medo, não. É por tristeza, mesmo”, lamenta Fernanda. Ela conta que vários amigos brasileiros estavam bem próximos dos locais dos atentados. “Tenho uma amiga que estava dentro do estádio na hora da explosão”, comentou.