Jornal Estado de Minas

Único banco de DNA de desaparecidos na Espanha luta contra tempo

Após 40 anos sem ditadura, na Espanha só existe um pequeno banco genético para identificar os desaparecidos pela guerra civil e o franquismo. Mas trata-se de um projeto privado, lançado em 2011 por familiares sem nenhum apoio do estado.

Dois sobrinhos de desaparecidos, Roger Heredia e Joan Malagarriga, fundaram em 2011 este projeto para recolher amostras de DNA mais significativas de cada família e compará-las no futuro com os restos não identificados das valas comuns.

"Os familiares dos desaparecidos são muito maiores. Estão desaparecendo não apenas sem saber onde estão seus familiares, mas também sem deixar seu testemunho genético", denuncia Heredia, que trabalha como policial científico.

"Quanto nós, os filhos dos desaparecidos, morrermos, será como se nada tivesse acontecido", lamenta Eduard Martí Valls, que busca há décadas o corpo de seu pai republicano, assassinado em 1938.

Fruto destas pesquisas, escreveu em vários tomos manuscritos a história deste advogado republicano que guarda como um tesouro em sua casa, junto a seu cachimbo de madeira e as dezenas de cartas escritas a partir do front.

Prestes a completar 90 anos, Valls tem poucas esperanças de encontrar o corpo do pai antes de morrer. Por isso, registrou seu DNA neste banco de Barcelona - caso algum dia o cadáver seja exumado.

Criar um banco genético "é algo comum que já foi feito em vários países, Bósnia, Argentina, Guatemala...", disse Malagarriga.

Mas na Espanha, não existe uma instituição oficial parecida, apesar das estimativas apontarem em mais de 100.000 o número de desaparecidos pela guerra civil e a ditadura de Francisco Franco (1939-1975).

Sem subsídio público, Heredia e Malagarriga criaram este banco de DNA em colaboração com o laboratório de genética forense da Universidade de Barcelona. São as própias famílias que devem pagar os 150 euros de cada amostra.

As instituições "fecharam todas as portas para nós, nunca nos ouviram", lamenta Heredia.

Até o momento, dispõem em 87 amostras, número muito abaixo das 22.000 do banco de DNA criado após a chacina de Srebrenica na Bósnia ou as 9.000 do banco nacional de dados genéticos da Argentina.

"Na Espanha, estamos como quando Franco morreu, nada foi feito" para devolver os restos dos desaparecidos a seus familiares, garante Heredia, apesar de uma lei de memória histórica aprovada em 2007 pelo governo socialista.

Desde o ano 2000, foram recuperados os restos de 6.300 desaparecidos, mas essencialmente pelo trabalho de associações de vítimas.

"A lei não resolveu nenhum dos problemas que eram apontados", denuncia Emilio Silva, presidente da Associação pela Recuperação da Memória Histórica. "Fala em facilitar a recuperação dos desaparecidos. Mas os direitos humanos não devem ser facilitados, e sim garantidos".

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