As homenagens às vítimas dos atentados de Bruxelas foram perturbadas neste domingo por manifestantes nacionalistas que invadiram a praça transformada em memorial na capital belga, onde as operações antiterroristas continuam com novas buscas e interrogatórios.
A polícia precisou fazer uso de canhões de água para dispersar 200 manifestantes vestidos de preto que gritavam "somos hooligans", "estamos em casa", repetindo slogans violentos contra o grupo extremista Estado Islâmico, que reivindicou os ataques de terça-feira.
"Estado cúmplice do Daesh", gritaram ainda alguns nacionalistas, que lançaram objetos incendiários contra as forças de ordem.
Uma dezena de nacionalistas foi detida, segundo a polícia, e o primeiro-ministro belga, Charles Michel, "condenou firmemente os distúrbios"
Neste clima de tensão, uma "marcha contra o medo" prevista para este domingo precisou ser anulada, com as autoridades justificando que a polícia devia dar prioridade à luta antiterrorista.
Novas operações
Quatro pessoas foram colocadas sob custódia neste domingo após treze novas operações antiterroristas em várias cidades da Bélgica, cinco dias após os atentados de Bruxelas, anunciou a procuradoria federal.
Quatro operações de busca foram realizadas em Mechelen e uma em Duffel, duas cidades na região de Flandres, no norte.
Outras oito foram realizadas em vários distritos de Bruxelas.
"No total, nove pessoas foram encaminhadas para interrogatório" como parte da investigação terrorista, mas "cinco entre elas foram liberadas", de acordo com a procuradoria, que não indicou se essas operações estavam ligadas aos atentados de terça-feira, que fizeram 28 mortos na capital belga.
Os investigadores ainda tentam confirmar se o único suspeito indiciado em conexão direta com os ataques jihadistas de terça-feira, Faisal Cheffou, é, como acreditam, "o homem de chapéu" que plantou uma bomba no aeroporto de Bruxelas-Zaventem ao lado de dois homens-bomba, Ibrahim El Bakraoui e Najim Laachraoui.
Esses dois homens, bem como o suicida do metrô de Bruxelas, Khalid El Bakraoui, estão intimamente relacionados com os autores dos ataques de Paris em 13 de novembro.
Uma prisão na Itália e uma nova acusação na Bélgica ilustraram, mais uma vez, a estreita ligação entre as redes jihadistas francesa e belga, que veio à tona com os ataques que mataram 130 pessoas em 13 de novembro em Paris e 28 em Bruxelas na terça-feira, de acordo com um balanço revisado.
Um argelino de 40 anos, Jamal Eddin Wali, foi preso no sábado na Itália, a pedido dos tribunais belgas. Ele é suspeito, segundo a imprensa italiana, de envolvimento na falsificação de documentos usados por membros dos comandos de Paris e Bruxelas.
Novo caso franco-belga
Enquanto isso, um segundo suspeito foi acusado na Bélgica no âmbito de uma outra investigação, sobre o plano frustrado de ataque na França, segundo informou neste domingo a procuradoria federal belga.
O indiciamento de Abderamane A. por "participação num grupo terrorista", soma-se, neste novo caso franco-belga, ao de Rabah N.
Preso na quinta-feira perto de Paris, o principal suspeito deste plano de ataque, o ex-ladrão francês Reda Kriket, de 34 anos, segue em prisão preventiva na França. Armas e explosivos foram encontrados em um apartamento nos subúrbios de Paris depois de sua prisão.
Em Bruxelas, dezenas de pessoas continuam a se revezar neste domingo de Páscoa na Place de la Bourse, transformada em memorial desde os atentados suicidas de terça-feira.
Em pequenos grupos, acendiam velas, cantavam canções e prestavam homenagem em silêncio às vítimas, sob os olhares atentos da polícia.
"Toda noite eu venho aqui e permanecerei aqui até que a meia-noite em solidariedade. Temos de nos mostrar, e não nos esconder", disse Mohamed Said Si Ahmed Haddi, um belga de 50 anos de origem argelina. Para Yves Susanne, de 54 anos, "é preciso mostrar às crianças que não temos medo...".
Mas a grande marcha "cidadã" programada para este domingo de Páscoa para "mostrar para aqueles que querem nos dobrar que permaneceremos de pé" teve de ser cancelada a pedido das autoridades, que citaram o alto nível de alerta.
'Contra a parede'
A medida que a difícil tarefa de identificação das vítimas progride, o perfil dos mortos começa a ser esboçado. Jovens belgas, como o estudante de marketing Bart Migom, de 21 anos, que visitaria sua namorada nos Estados Unidos, ou Leopold Hecht, de 20 anos, cuja família doou seus órgãos na esperança de que possa "salvar uma vida".
Mas também, nesta cidade cosmopolita, expatriados, como os americanos Justin e Stephanie Shults, um jovem casal de 30 anos que se estabeleceu na capital europeia, assim como a italiana Patricia Rizzo, de 48 anos, que trabalhava em uma agência do Conselho Europeu de investigação.
Também há entre as vítimas passageiros em trânsito, como Elita Weah, de 41 anos, uma refugiada da Libéria que adquiriu a nacionalidade do seu país de adoção, a Holanda, onde era voluntária em um lar de idosos, e que ia para o funeral de seu padrasto nos Estados Unidos.
"É uma dor que não se pode descrever. Eu compartilho com todas as famílias das vítimas em Paris, Túnis e em outros lugares", declarou o jornalista belga Michel Visart, que perdeu sua filha Lauriane na explosão no metrô, à televisão RTBF para a qual trabalha.
"Eu acredito que a construção de muros, a exclusão ou o ódio significam ir contra a parede", declarou, lançando um apelo ao "respeito", à "tolerância" e ao "amor".