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Estado de Minas

Os esquecidos banquetes canibais da Revolução Cultural chinesa


postado em 12/05/2016 14:37

No auge da Revolução Cultural chinesa, os convidados de macabros "banquetes" devoravam os órgãos de suas vítimas "contrarrevolucionárias", cenas de horror que foram apagadas da memória oficial, meio século depois deste período sangrento.

Lançada em 16 de maio de 1966 por Mao Tsé-Tung para acabar com seus adversários, a Revolução Cultural esteve marcada por um frenesi de violência, afundando o país no caos provocado pelas lutas políticas.

Adolescentes, os "guardas vermelhos" espancaram seus professores até a morte, os conflitos internos dividiram famílias inteiras, as facções mataram umas às outras. Mas o regime comunista continua mantendo em um silêncio obstinado os piores excessos cometidos naquele momento.

Em Wuxuan, localizada em uma isolada zona rural da província de Guangxi (sudeste), a barbárie chegou ao seu grau máximo quando os corações, fígados e genitais das vítimas eram cortados e cozidos para que seus carrascos os comessem.

Atualmente, a cidade oferece um panorama muito diferente: lojas de iogurte, pescadores à sombra das altas copas verdes e cartazes vermelhos exaltando o Partido Comunista chinês.

No entanto, foi ali que, há cinquenta anos, ao menos 38 pessoas foram vítimas do canibalismo organizado, informou à AFP, pedindo o anonimato, um responsável que participou no início dos anos 1980 de uma investigação oficial sobre estes crimes.

"Levando ao extremo o princípio da luta de classes se chegou ao canibalismo", explicou. "Os assassinatos eram espantosos, pior que os das bestas".

"Durante esta década catastrófica, Guangxi (...) foi o símbolo de uma crueldade e de uma selvageria chocante", escreveu este aposentado do Partido em um manuscrito consultado pela AFP.

"Pessoas foram decapitadas, espancadas até a morte, enterradas vivas, apedrejadas, afogadas, fervidas, massacradas em grupo, esvaziadas de suas entranhas (...), detonadas com dinamite. Todos os métodos foram utilizados".

Fanatismo político

Diferentemente das cenas de canibalismo ocorridas durante a fome do "Grande Salto Adiante" (1958-1962), os episódios de violência de Wuxuan eram motivados por puro fanatismo.

"É um canibalismo provocado por acontecimentos políticos, um ódio político, em nome de uma ideologia e de rituais políticos", explicou à AFP X.L. Ding, professor da Universidade de Ciências e Tecnologia de Hong Kong.

Segundo os professores universitários, o isolamento geográfico, a brutalidade do chefe regional do Partido Comunista, a pobreza e uma multiplicação das facções permitiram que o horror se tornasse realidade em Wuxuan.

Perguntados pela AFP, alguns habitantes da cidade negam saber de algo ou respondem com um silêncio embaraçoso.

O cidadão Luo acredita, no entanto: "Canibalismo? Sim. Eu estava lá, eu vivi aquilo". Mas rapidamente acrescenta que Wuxuan se modernizou enormemente desde então: o passado "já não significa nada".

Romper o silêncio

Os rumores sobre os massacres em Guangxi - 150.000 mortos, segundo alguns balanços - levaram as autoridades a realizar uma investigação oficial quinze anos depois.

Suas conclusões nunca se tornaram públicas. Mas o jornalista Zheng Yi lançou um surpreendente livro, "Estrelas Vermelhas", publicado no exterior no início dos anos 1990 e proibido na China.

Quando o funcionário entrevistado pela AFP publicou em uma revista de baixa tiragem as conclusões da investigação, lembrando que ao menos uma centena de pessoas haviam participado de atos de canibalismo, enfrentou uma forte resistência.

Funcionários regionais aposentados contestaram raivosamente, enviando sua resposta às altas instâncias comunistas. "Acusavam-me de ser anti-Partido e antissocialista" e exigiam uma autocrítica, lembra.

Zheng Yi, que vive exilado nos Estados Unidos, mostra-se preocupado pelo silêncio que continua cercando a bárbara violência da Revolução Cultural.

"Como o governo nunca permitiu uma análise histórica em profundidade do período, é impossível afirmar que tenham sido tiradas lições" do ocorrido, declarou à AFP.


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