Lobo solitário e com 'impulso homossexual'

Clientes da boate alvo do ataque relatam que o assassino ia ao local há três anos. Ex-agente do FBI vê mente perturbada

Rodrigo Craveiro



Brasília –
O técnico em tomografia computadorizada Ethan Marc Hanna, 45 anos, costuma frequentar a boate Pulse, famosa entre o público LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros), em Orlando (Flórida).

No último fim de semana, ele foi à casa de praia com o namorado, onde comemoraram os 60 anos do sogro. “Fomos acordados por volta das 3h de domingo por amigos que perguntavam se estávamos a salvo”, lembra. Dois dias depois do tiroteio em massa que matou 49 pessoas e o atirador e feriu 53, Ethan se lembra de ter conversado com o atirador Omar Mateen pelo Grindr, o mais conhecido aplicativo para encontros e bate-papo entre homossexuais. Durante todo o dia de ontem, ele tentava recordar a senha para recuperar as mensagens. “O perfil dele estava em branco. Ele sempre se comunicava com as pessoas com um ‘Alô’”, disse. Além de visitar sites gays, Mateen era cliente assíduo da Pulse — de acordo com testemunhas, ele podia ser visto com frequência no local desde 2013 e teria insinuado o desejo de manter um relacionamento homossexual.

Sitora Ali Yusufi, ex-mulher de Mateen, admitiu que ele pode ter escondido a própria orientação sexual.
“Ele pode ter sido gay, mas escolheu ocultar sua real identidade com raiva e vergonha”, afirmou ela, que hoje vive com um brasileiro em Boulder, no Colorado. Sitora Yusifiy, relatou que o homem que invadiu a boate gay Pulse, em Orlando, era violento, instável e com “impulsos homossexuais”. Imigrante do Uzbequistão, Sitora conheceu Mateen pela internet, viveu com ele por quatro meses e disse que só conseguiu escapar de Omar porque a família dela a resgatou.

A mulher afirmou aos policiais norte-americanos não acreditar que o ex-marido tenha qualquer tipo de ligação com organizações terroristas. As afirmações de Sitora Yusifiy foram feitas ao SBT, que transmitiu entrevista com ela na noite de segunda-feira. O brasileiro Márcio Dias, noivo de Sitora e com quem ela agora mora, contou que a companheira lhe disse que Mateen “tinha tendências homossexuais” e que o pai do autor do massacre em Orlando por várias vezes chamou o filho de “gay”. Mário acrescentou que Sitora informou isso aos agentes do FBI aos quais prestou depoimento e que os policiais pediram a ela que não revelasse essas informações para mídia norte-americana.


Frequência Ty Smith, cliente assíduo da Pulse, declarou ao jornal Orlando Sentinel ter se deparado com o criminoso dentro da boate por cerca de 10 vezes. “Algumas vezes, ele ficava no canto, bebendo. Outras vezes, ficava tão bêbado que se tornava barulhento e beligerante”, afirmou. “Quando você é gay e nasce num lar homofóbico, em algum momento você começará uma jornada rumo à supressão ou à honestidade. Este homem pode não ter se afastado da cena gay pelo fato de ser quem ele era. Ele escolheu ficar à ‘margem’ de nossa família e continuou sendo desonesto com a família em que nasceu”, aposta Ethan. Vários clientes da Pulse admitiram, no Facebook, que o semblante de Mateen era “muito familiar”.

Até o fechamento desta edição, as autoridades norte-americanas privilegiavam a tese de que Mateen era um “lobo solitário”, inspirado por motivações jihadistas e radicalizado na internet. A situação de Noor Zahi Salman, 27 anos, viúva de Mateen, pode se complicar nas próximas horas.
O FBI, a polícia federal dos EUA, anunciou que ela levou o marido até a Pulse e o acompanhou até um negociante de armas, de quem ele comprou uma pistola semiautomática 9mm e um fuzil de assalto ponto 223. Os policiais querem entender se Salman conhecia o plano da matança.

Ex-agente do FBI especializado em traçar o perfil de criminosos, Clint Van Zandt explicou ao Estado de Minas que Omar Mateen era motivado por temas ligados à saúde mental. “A ex-mulher disse que ele era bipolar. Também carregava estrita interpretação da religião, decorando versos contrários à homossexualidade”, comentou. “Provavelmente, era um homossexual que não saiu do armário, com um conflito em torna da identidade sexual. Expressava ódio dos negros, dos gays, dos judeus e de algumas mulheres. Espancava a ex-esposa e tinha dificuldades nos relacionamentos sociais”, acrescentou.

Para o contador John Eden, 26, sobrevivente da Pulse, Mateen provavelmente acessava aplicativos de namoro gay para conhecer os alvos do ataque. “Eu não creio que ele era gay. Acho que é uma mentira para fazê-lo parecer um homossexual que nos atacou e para minimizar o fato de ser um muçulmano”, disse à reportagem. O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, viajará amanhã a Orlando para visitar sobreviventes e apresentar suas condolências.
Ontem, ele fez questão de dirigir algumas palavras à comunidade LGBT. “Quero recordar a vocês que não estão sós. O povo americano e nossos aliados e amigos em todo o mundo estão com vocês”, declarou, no terceiro discurso sobre a chacina.


Um sobrevivente do ataque em Orlando deu um depoimento emocionado à imprensa, durante coletiva no hospital. Angel Colon, 26, contou que se fingiu de morto para não ser atingido pelo fuzil AR-15 de Mateen. “Eu estava pronto para apenas ficar deitado no chão para que ele não percebesse que eu estava vivo”, disse. Foi baleado na perna, pisoteado pelas pessoas e arrastado por um policial em meio a sangue e estilhaços.

 

 

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