A Turquia suspendeu nesta segunda-feira suas relações no mais alto nível com a Holanda, alegando o bloqueio do governo holandês para que os políticos turcos participem de encontros sobre o referendo no país, enquanto Estados Unidos e União Europeia tentam contornar a crise.
"Até que a Holanda não repare os danos que causou, as relações no mais alto nível e as reuniões previstas ao nível ministerial e a alto nível ficam suspensas", anunciou Numan Kurtulmus após uma reunião do conselho de ministros, acrescentando que Ancara rejeitou o retorno do embaixador holandês à capital turca enquanto "as condições expostas (para resolver a crise diplomática com a Holanda) não forem cumpridas".
Pouco antes do anúncio do rompimento, o governo americano pediu calma à Turquia e Holanda, recordando que "ambos são sólidos sócios e aliados na OTAN".
"Lhes pedimos que a situação não entre em mais uma escalada e que trabalhem juntos para resolvê-la, disse um alto funcionário do departamento de Estado.
A fonte afirmou que o governo de Donald Trump não interveio diretamente no conflito porque Turquia e Holanda são "democracias fortes" e "podem solucionar o problema entre elas".
A União Europeia e a Otan também tentavam nesta segunda-feira contornar a crise, em meio aos ataques de Ancara às autoridades holandesas por terem impedido dois ministros turcos de participar de comícios em apoio ao presidente Recep Tayyip Erdogan.
A UE apela à Ancara a "se abster de toda declaração excessiva e ação que possa exacerbar a situação", após o presidente Erdogan prometer que a Holanda "pagará um preço alto" pelo tratamento dado aos dois ministros turcos, que, segundo ele, recordam "o nazismo e o fascismo".
"É essencial evitar uma nova escalada e encontrar os meios de acalmar a situação", acrescentou a UE em uma declaração da chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini.
Apesar de o processo de adesão da Turquia à UE esteja em um impasse, Ancara continua a ser um parceiro estratégico do bloco, principalmente na gestão do fluxo de migrantes.
Mas um ministro turco citou nesta segunda-feira uma possível "análise" do pacto sobre a luta contra a imigração concluído há um ano.
"A Turquia deve reavaliar a questão", declarou o ministro dos Assuntos Europeus, Omer Celik, citado pela agência pró-governo Anatólia.
A crise foi desencadeada no sábado, quando a Holanda expulsou a ministra turca da Família, Fatma Betul Sayan Kaya, e negou a autorizar uma visita do chefe da diplomacia turca, Mevlut Cavusoglu.
Os dois diplomatas turcos iriam participar de comícios para promover entre os turcos nesse país o 'sim' no referendo constitucional previsto para 16 de abril na Turquia que visa a reforçar os poderes de Erdogan.
A presença de políticos turcos nesses comícios deu lugar nas últimas semanas a confrontações entre Ancara e várias capitais europeias, o que não aconteceu em período eleitorais anteriores.
Nesta segunda-feira, Erdogan atacou diretamente a chanceler alemã, Angela Merkel, que acusou de "apoiar terroristas".
"Senhora Merkel, por que está escondendo terroristas em seu país? Por que não está fazendo nada?" - questionou Erdogan em entrevista à TV A-Haber, acusando Berlim de não responder aos 4.500 comunicados realizados pela Turquia sobre supostos terroristas.
A Turquia acusa a Alemanha de dar abrigo a militantes da causa curda e a suspeitos procurados por envolvimento no fracassado golpe de Estado de 15 de julho.
Merkel considerou as acusações absurdas. "A chanceler não tem a intenção de participar de um concurso de provocações", disse seu porta-voz Steffen Seibert.
Na mesma entrevista, Erdogan acusou a Alemanha de "nazismo", ao avaliar que Merkel apoia seu homólogo holandês Mark Rutte na disputa com Ancara.
O secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, pediu aos países da Aliança Atlântica que "contribuam para uma desescalada das tensões" diplomáticas entre a Turquia e alguns países europeus.
"Eu incentivaria a todos os aliados a mostrar um respeito mútuo, a manter a calma e ter um enforque comedido para contribuir para uma desescalada das tensões", declarou Stoltenberg à imprensa.
Neste contexto de extrema tensão, a Holanda pediu nesta segunda-feira a seus cidadãos na Holanda que fiquem "vigilantes" e evitem "as concentrações e locais muito lotados".
Durante o fim de semana, houve várias manifestações diante das representações diplomáticas holandesas em Istambul e Ancara.
- Conquistar sua base nacionalista -
Segundo Soner Cagaptay, analista da Turquia no Washington Institute, "Erdogan busca inimigos estrangeiros imaginários para conquistar sua base nacionalista às vésperas do referendo. É simples assim e os holandeses caíram na armadilha, ao invés de ignorar o referendo a favor de Erdogan".
Nesta segunda, o ministro da Justiça turco, Bekir Bozdag, lançou uma nova advertência. "Não permitiremos que ninguém atente contra a honra da nação e do Estado turco", declarou.
"Vamos assistir à queda da Europa. A Europa está doente, ao contrário da Turquia", disse, por sua vez, o vice-premiê turco Nurettin Canikli.
Esta crise acontece antes das eleições legislativas previstas para quarta-feira na Holanda, onde o partido do deputado anti-Islã Geert Wilders se situa em segundo lugar, de acordo com as últimas pesquisas.
O chefe da diplomacia turca pôde, no entanto, participar em uma comício no domingo no leste da França, Metz. Erdogan agradeceu às autoridades francesas por autorizar a visita.
Já o primeiro-ministro dinamarquês, Lars Lokke Rasmussen, sugeriu no domingo que seu colega turco, Binali Yildirim, adie uma visita à Dinamarca prevista para o final de março por causa das tensões com a Holanda.
Na Alemanha, onde várias cidades cancelaram comício a favor de Erdogan nas últimas semanas, o ministro do Interior, Thomas de Maizières, disse opor-se à visita de ministros para essas concentrações.
"Uma campanha eleitoral turca não tem nada a ver aqui, na Alemanha", declarou em entrevista a um canal de TV.