A Polícia Federal lançou nesta sexta-feira uma vasta operação contra uma rede formada por inspetores sanitários e grandes frigoríficos para vender carne e outros alimentos adulterados - e, em alguns casos, "maquiados" com ácidos e produtos cancerígenos - tanto para consumo interno como para exportação.
O escândalo atinge em cheio outro setor-chave da economia brasileira, depois do abalo sofrido pelas grandes construtoras envolvidas no megaesquema de propinas do Petrolão.
"Os funcionários públicos (...), mediante o recebimento de propinas, facilitavam a produção de alimentos adulterados, emitindo certificados sanitários sem realizar qualquer inspeção", indica um comunicado da PF.
Uma parte desses subornos era revertida para partidos políticos, segundo o comissário Mauricio Moscardi Grillo, que identificou entre os beneficiários o PMDB, do presidente Michel Temer, e seu aliado PP, os dois envolvidos no Petrolão.
Entre os investigados, figuram executivos de grupos importantes como JBS - dona das marcas Big Frango e Seara Alimentos - e BRF - dona da Sadia e Perdigão -, de acordo com os processos revelados pela justiça federal de Curitiba, base da operação.
A justiça também determinou o bloqueio de um bilhão de reais das empresas investigadas.
As ações dos grupos envolvidos desabaram durante a tarde na bolsa de São Paulo.
A operação, fruto de anos de investigações, mobilizou 1.100 agentes para executar 309 ordens judiciais, incluindo 27 de prisão preventiva, em sete estados: Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, São Paulo, Minas Gerais, Goiás e o Distrito Federal.
Os produtos adulterados eram vendidos no mercado interno e no exterior.
Na lista de pessoas investigadas, figuram Flavio Cassou, executivo da JBS, assim como Roney Nogueira dos Santos, gerente de Relações Internacionais da BRF, e José Roberto Pernomian Rodrigues, diretor e vice-presidente dessa firma, de acordo com o comunicado da Justiça do Paraná.
A JBS indicou, em um comunicado, que três de suas unidades de produção (uma no Paraná e duas em Goiás) foram revistadas, mas destacou que "não houve qualquer medida judicial contra seus executivos" e que a sede de São Paulo não foi revistada.
Destacou que o funcionário incriminado é "um veterinário da companhia, mas que foi cedido ao ministério da Agricultura", conforme a legislação.
A BRF afirmou, por sua vez, que "está colaborando com as autoridades" e que seus produtos "não representam qualquer risco para os consumidores, no Brasil e nem nos mais de 150 países em que estão presentes".
O ministro da Agricultura Blairo Maggi ordenou "o afastamento imediato de todos os envolvidos nas acusações".
O Brasil é o primeiro exportador mundial de carne bovina e de frangeo.
- 'Produtos cancerígenos' -
Nos frigoríficos de pequeno porte foi detectado o uso de "produtos cancerígenos para maquiar o aspecto do produto avariado, o odor", afirmou o comissário Mauricio Moscardi Grillo em coletiva de imprensa em Curitiba.
"Inúmeras crianças de escolas públicas estaduais do Paraná estão se alimentando de merendas compostas por produtos vencidos, estragados e muitas vezes até cancerígenos para atender o interesse econômico desta poderosa organização criminosa", acrescentou.
Também foi identificada a presença de salmonela em produtos que foram colocados à venda através do pagamento de propina.
Um contêiner da BRF foi bloqueado em um porto da Itália, quando detectada a presença dessa bactéria, informou, sem maiores detalhes.
A Confederação da Agricultura (CNA) pediu que sejam investigadas com rigor as acusações e mostrou preocupação em relação ao impacto do escândalo.
"Não é justo que a imagem (dos produtores rurais) seja manchada pela ação irresponsável e criminosa de alguns", afirmou.
A operação, a maior da história da PF, foi apelidada "Carne Fraca" em referência à expressão popular que "demonstra a fragilidade moral dos agentes públicos que deveriam velar pela qualidade dos alimentos", explica o comunicado.
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