Brasil, Chile e Uruguai se preparam para retirar tropas do Haiti

AFP

Brasil, Chile e Uruguai, os países latino-americanos que lideram os capacetes azuis no Haiti, se preparam para a retirada de suas tropas do país, ao fim de 13 anos de missão, desgastados pelas consequências dos desastres naturais, dos escândalos sexuais e das sequelas do cólera.

"Fora tropas do Haiti", lê-se em um muro em frente ao palácio legislativo do Uruguai, lembrando o acalorado debate em torno do tema pelos parlamentares uruguaios, que esperam tomar uma decisão em abril sobre a retirada de seus mais de 250 soldados deslocados para o país caribenho.

No Brasil, o Ministério da Defesa disse à AFP que aguardará a determinação da ONU e parece relutante a considerá-la concluída.

"Essa foi uma missão muito importante para o Brasil porque coincide com o tempo em que o governo Lula buscava posicionar-se como líder no mundo e ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, lembrou à AFP María Cristina Rosas, acadêmica da Universidade Nacional Autônoma do México e autora de vários livros sobre missões de paz.

"O governo brasileiro atualmente não passa por seu melhor momento, sua imagem internacional deteriorou-se e o país precisa continuar fortalecendo sua projeção", avaliou.

Já o Uruguai não parece tão resistente a mudanças.

"No dia 15 de abril estaremos em condições de regressar", anunciou Jorge Menéndez, ministro da Defesa uruguaio, em dezembro.

Para Gonzalo Novales Mayol, presidente da comissão de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados uruguaia, o Haiti não está pronto para ficar sozinho.

"Acho que isso poderia ser feito paulatinamente até que nosso país irmão Haiti consiga consolidar uma democracia", disse à AFP Novales Mayor, do opositor Partido Nacional.

Jovenel Moïse assumiu a presidência do Haiti em fevereiro, depois de uma longa crise que começou com a anulação das eleições em 2015 e passou também por seu adiamento um ano depois, por conta dos danos provocados pelo furacão Matthew.

O Chile também anunciou a partida de seus quase 350 soldados do Haiti, o país mais pobre da região América Latina e Caribe.

"É hora de concluir a participação dos efetivos militares que estão na Minustah (Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti)", disse há cerca de um mês Marcos Robledo, ministro da Defesa chileno.

A decisão de retirar os militares da primeira missão de paz na América Latina liderada por países da região terá que ser ratificada pelos congressos nacionais.

- Fonte de tensão -

A ONU chegou ao Haiti em 1990 com uma missão de observação nas primeiras eleições do país, vencidas por Jean Bertrand Aristide, derrubado por um golpe militar no ano seguinte.

As missões foram mudando suas características até chegar na Minustah, em 2004, uma missão de paz que, segundo especialistas, chegou a reunir até 20.000 militares no terreno.

Nesse tempo o Haiti passou por calamidades. Um terremoto em 2010 resultou na morte de 220.000 pessoas, incluindo o chefe da missão dos capacetes azuis. Depois do terremoto veio a epidemia de cólera, que matou mais de 9.000 pessoas, e em outubro do ano passado o furacão Matthew, que deixou 550 vítimas fatais.

A imagem da missão da ONU foi abalada pelo contágio do cólera, introduzido por soldados do Nepal no país após o terremoto, e pelas denúncias de centenas de mulheres haitianas que, em 2015, admitiram ter mantido relações sexuais com capacetes azuis em troca de serviços e de bens materiais.

"Pelo ponto de vista das ONGs na América Latina (que denunciam os abusos dos capacetes azuis e a falta de interesse dos governos da região), pode-se dizer que chegou o momento de a Minustah se retirar", disse à AFP Juan Battaleme, especialista em segurança regional e diretor do curso de Relações Internacionais da Universidade Argentina da Empresa.

Para o especialista, os capacetes azuis se transformaram em uma "fonte de tensão no Haiti", sem levar melhores condições de segurança.

A missão no Haiti está entre as quatro mais denunciadas de casos de abuso sexual no mundo, , segundo a ONU, que pretende nomear um defensor dos direitos das vítimas.

Depois que os Estados Unidos anunciaram um corte na ajuda econômica dada à organização, o secretário-geral Antonio Guterres propês em documento concluir a Minustah até outubro, com a retirada dos 2.370 militares que atualmente estão no país, substituindo-os por 295 policiais.

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