O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, completa 100 dias no cargo, nesta segunda-feira (10), com uma longa lista de conflitos mundiais que se agravam e muitas perguntas sem resposta sobre o rumo da diplomacia americana.
Esse primeiro-ministro de Portugal e diretor do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) assumiu o cargo máximo da organização em 1º de janeiro com a promessa de mudar o organismo e torná-lo mais efetivo na hora de enfrentar as crises mundiais.
Desde então, as guerras na Síria, no Iêmen e no Sudão do Sul pioraram, e o governo do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, impôs o primeiro de uma série de cortes orçamentários que poderão afetar a organização internacional.
O suposto ataque químico da semana passada levou a um novo patamar os horrores da guerra da Síria, que entrou em seu sétimo ano, e levou Washington a atacar uma base aérea no centro do país.
Enquanto isso, o processo de paz promovido pela ONU continua em ponto morto.
Os quatro alertas de fome no Sudão do Sul, no Iêmen, na Somália e no norte da Nigéria preocupam os trabalhadores humanitários da ONU, em um momento em que as doações econômicas não cobrem as necessidades para evitar que a situação se agrave ainda mais.
A isso, somam-se os lançamentos de mísseis por parte da Coreia do Norte, os combates na Líbia, as tensões eleitorais na República Democrática do Congo e a maior crise de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial.
Apesar desse panorama desolador, Guterres tem sido elogiado por oxigenar uma organização que caiu na irrelevância sob a direção de seu antecessor, Ban Ki-moon.
"É um diplomata muito mais eficiente do que Ban Ki-moon, e um chefe muito mais exigente", comentou o especialista em ONU Richard Gowan, do European Council on Foreign Relations.
"Em muitos casos, Guterres tentou estabilizar crises que estavam se descontrolando com Ban", acrescentou.
Guterres viajou para o Oriente Médio, para o Golfo e para a África, e participou pessoalmente da diplomacia por trás dos bastidores para conseguir que os líderes aceitassem prioridades compartilhadas para lidar com os conflitos.
- Laços com EUA
Apesar de Trump ter reduzido o papel da ONU ao de um "clube", o esforço de Guterres foi reconhecido pela embaixadora dos Estados Unidos, Nikki Haley, uma das vozes que mais se têm ouvido na Política Externa norte-americana.
Suas reformas se concentram em reduzir custos e modernizar a complicada burocracia, o que converge com os apelos feitos por Nikki para que a ONU mostre seu "valor para o contribuinte americano".
Responsável por 22% do orçamento central da organização (de US$ 5,4 bilhões) e por 28,5% da rubrica dedicada às missões de paz (de US$ 7,9 bilhões), os Estados Unidos são o maior contribuinte da ONU.
"Quanto mais Guterres conseguir reformar o sistema da ONU, melhor será sua relação com os Estados Unidos", avalia o professor de Diplomacia Martin Edwards, da Seton Hall University.
"Dada a retórica e a falta de direção do governo Trump, mantê-lo comprometido com a ONU é um grande golpe diplomático" de Guterres, acrescentou.
O bloqueio da Casa Branca ao candidato de Guterres como enviado de paz para a Síria, o palestino Salam Fayyed, foi, porém, um golpe que mostrou como os Estados Unidos podem obstaculizar a agenda do chefe da ONU.
Washington reduziu em US$ 32,5 milhões sua contribuição ao Fundo de População da ONU, que proporciona planejamento familiar em 150 países e pretende retirar tropas de algumas missões de paz e fechar outras.
Guterres ainda tem de se reunir com Trump, ou com seu secretário de Estado, Rex Tillerson, para discutir qual caminho seguir.
Tillerson visitará a ONU pela primeira vez em 28 de abril, quando presidirá uma sessão do Conselho de Segurança dedicada à Coreia do Norte.