Anos de mensagens ameaçadoras nas redes sociais, uma condenação por assédio e uma vida solitária: investigadores nos Estados Unidos tentavam determinar o que levou um homem com este histórico a atacar um jornal em Annapolis e matar cinco pessoas.
Jarrod Ramos, de 38 anos, o suspeito de realizar nesta quinta-feira um massacre na redação do jornal The Capital Gazette de Annapolis, a capital do estado de Maryland, tem um olhar desafiador nas fotografias distribuídas pela Polícia.
Na sexta-feira, ficou em silêncio durante a curta audiência judicial que resultou em sua detenção, sem direito à fiança, acusado de cinco homicídios dolosos de quatro jornalistas e uma assistente de vendas.
Nascido em 21 de dezembro de 1979, este homem de pele branca, testa ampla e cabelos longos teve uma "infância boa", contou sua tia, Vielka Ramos, ao jornal The Baltimore Sun, proprietário do Capital Gazette.
"Era muito inteligente. Tentava se comunicar com as pessoas, mas era solitário", disse. "Não ficava perto de ninguém".
- "Jarrod quer ser seu amigo" -
Morador de Laurel, subúrbio de Maryland, no meio do caminho entre Washington e Baltimore, Ramos, um ex-funcionário público federal, teve uma briga com um jornal por um artigo que descrevia em detalhes um caso de assédio contra ele.
Em 2011, o jornalista Eric Hartley escreveu um relato estremecedor sobre uma denúncia de assédio que uma ex-colega do ensino médio de Ramos apresentou contra ele.
No artigo, intitulado "Jarrod quer ser seu amigo", descreveu como Ramos usou o Facebook para contatar a mulher, agradecendo-lhe "por ser a única pessoa" que alguma vez o saudou ou foi amável com ele na escola.
Trocaram mensagens, mas as de Ramos se tornaram hostis e vulgares. Ele disse à mulher que se matasse, fez contato com seu empregador e tentou fazer com que a demitissem.
Ramos acabou se declarando culpado de crime de assédio perante um tribunal. Conseguiu evitar a prisão, mas foi posto em liberdade condicional.
Em 2012, Ramos, que segundo registros trabalhou para o Escritório de Estatísticas Trabalhistas dos Estados Unidos durante seis anos, apresentou um processo por difamação contra o jornal e Hartley.
A demanda também incluía Thomas Marquardt, ex-editor do jornal, segundo o The Baltimore Sun.
- "Deixem-me em paz" -
Ramos começou, então, a fazer "ameaças vagas" aos jornalistas e ao jornal, contou Marquardt à MSNBC. Eram tão assustadoras que foi mostrada aos funcionários do Capital Gazette uma foto de Ramos e pediu-se que ligassem para o 911, número do serviço de emergências nos EUA, se o vissem na redação.
Levou anos para a ação de Ramos contra o The Capital Gazette avançar na Justiça. Quando um juiz de apelação decidiu a favor do jornal em 2015, Ramos intensificou as críticas, com comentários considerados ameaçadores pela Polícia.
"Adoraria que o @capgaznews deixasse de ser publicado, mas seria melhor que Hartley e Marquardt parassem de respirar", tuitou em 7 de fevereiro de 2015.
Outros tuítes dirigiam impropérios aos jornalistas e faziam alusões ao ataque de 2015 contra a redação do jornal Charlie Hebdo, em Paris.
Ramos também voltou-se para a política: em setembro de 2015 escreveu sobre o então candidato à Presidência Donald Trump. "Ao se referir a @realDonaldTrump como 'não qualificado', o @capgaznews poderia acabar mal (outra vez)", tuitou.
O assédio 'online' continuou até o começo de 2016, quando Ramos parou de tuitar, até minutos antes do tiroteio, quando escreveu: "Deixem-me em paz".
- "Vai vir e atirar em nós" -
Ramos abriu foto na quinta-feira com uma rajada de escopeta contra a porta de vidro da sala de redação. Jornalistas e editores se esconderam debaixo das mesas de escritório, e um deles lembrou no Twitter o horror de ouvi-lo recarregar sua arma e recomeçar a atirar.
Marquardt, que não trabalha mais no The Capital Gazette, lembrou do choque que sentiu com as ameaças de Ramos, em 2013, tanto que chamou a Polícia. "Temia por minha vida, temia pela vida da minha família e temia pela vida dos meus funcionários", disse.
Segundo relatou ao Sun, ele falou com os advogados do Capital Gazette sobre a apresentação de uma ordem de proteção, mas decidiu não fazê-lo temendo agravar a situação.
"Lembro de ter dito aos nossos advogados: 'Esse é um cara que vai vir e atirar em nós'".