Jornal Estado de Minas

Contra desperdício, ONG propõe reuso de lixo têxtil nova-iorquino

A indústria da moda gera toneladas de resíduos têxteis a cada ano, principalmente na maior cidade americana, Nova York, que realiza duas semanas de moda por ano. A grande maioria termina no lixo ou é incinerada.

Mas uma organização sem fins lucrativos fundada há dois anos propõe um alternativa para acabar com o desperdício de tecidos na Big Apple.

A cada dia, aproximadamente 1.350 kg de retalhos da indústria têxtil nova-iorquina chegam ao depósito da Fabscrap no Brooklyn, em um imenso complexo de armazéns que pertenceu ao exército americano.

Cerca de 250 marcas já trabalham com a Fabscrap, que também recebe tecidos de designers de interiores e departamentos de vestuário. Tem de tudo: retalhos de luxuosos tecidos de Oscar de la Renta e Marc Jacobs, de marcas conhecidas como J. Crew e de novos estilistas novaiorquinos que lançaram sua primeira coleção.

Apesar da Fabscrap ter recolhido no ano passado 68 toneladas de retalhos, sua fundadora, Jessica Schreiber, de 30 anos, diz que há potencial para crescer, já que a empresa atende a um terço da indústria da moda em Nova York.

"Depois da Semana de Moda temos muito trabalho. As marcas fazem uma grande limpeza após cada temporada", diz Schreiber em entrevista à AFP em meio a uma imensa montanha de sacos de lixo pretos repletos de retalhos que aguardam classificação.

- Valiosa informação a compartilhar -

O trabalho de classificação é realizado principalmente por voluntários que em troca de três horas de trabalho podem levar para casa 2,5 quilos de retalhos grátis.

Os pedaços muito pequenos são levados para uma trituradora e usados como isolamento térmico, enchimento de colchões, em tapetes ou para fazer mantas usadas em mudanças.

Os tecidos com elastano, que não podem ser triturados, são usados como enchimento de sacos de boxe.

No total, cerca de 54% dos tecidos recebidos são reciclados, 41% reutilizados a partir da revenda por apenas 10 dólares o quilo (menos para estudantes) e 5% terminam efetivamente no lixo.

Os clientes são em geral estudantes de moda, artistas ou amantes da costura com baixo orçamento.

Uma tarifa cobrada das marcas cobre os gastos de transporte, do aluguel do depósito, os custos de operação e a trituradora.

"A indústria da moda está recebendo uma pressão crescente para falar de sustentabilidade e tornar mais transparente sua cadeia de fornecimento", diz Schreiber.

A Fabscrap disponibiliza a seus clientes a informação de quanto quilos de seus tecidos foram reciclados e reutilizados, e calcula sua economia nas emissões de CO2.

As marcas utilizam depois esses números, considerados "muito tuitáveis" para mostrar seus esforços para proteger o meio ambiente.

- Maior concorrência: o lixo -

"Sabia que havia muito desperdício na indústria têxtil, mas não que era uma montanha!", disse Molly Boord, voluntária da empresa de 23 anos que cursa estudos étnicos na Universidade Columbia e começou a costurar na máquina a pouco tempo.

A Fabscrap surgiu para preencher uma necessidade: Schreiber trabalhava no departamento de saneamento da cidade de Nova York, gerenciando um programa para reciclar as 200.000 toneladas de roupas, sapatos, acessórios e roupa de cama e mesa que os moradores da cidade jogam no lixo a cada ano.

Muitas marcas pediam sua opinião sobre o que fazer com seus resíduos têxteis que não eram classificados como vestimenta, mas o governo municipal não se ocupa dessa parte.

Schreiber, que tem mestrado em Clima e Sociedade na Universidade Columbia, decidiu então fundar a Fabscrap.

Durante um ano e meio, ela mesma recolheu os pesados sacos de retalhos, que transportava para seu pequeno apartamento, primeiro em um táxi, e depois em uma caminhonete alugada. Ela os classificava, revendia, e levava o resto para trituradora.

Agora emprega outra três mulheres jovens, e a empresa cresceu tanto que teve que se mudar para um depósito maior.

Ainda que existam outras iniciativas de reciclagem têxtil nos Estados Unidos e na Europa, a Fabscrap é a única associação que aceita todo tipo de tecidos de qualquer tamanho, e faz coleta em domicílio.

"Nossa maior concorrência é com o lixo", diz Schreiber.

"Se não existíssemos, muito de tudo isso iria parar no lixo. Parte seria incinerado", e parte doado, mas não há escola de moda ou arte que possa receber esse volume, explica.

A voluntária Beck Dillenberger, estudante do famoso Fashion Institute of Technology de Nova York, separa em baldes diferentes seus retalhos: algodão, lã, tecidos mistos, elastano.

A indústria têxtil "deve ser sustentável", diz essa jovem de 26 anos que confessa ser uma colecionadora de tecidos.

"Me sinto bem em ajudar".

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