Entrevista: Francisco Zorzete, arquiteto, restaurador e diretor da Companhia de Restauro
Restaurar a catedral de Notre-Dame é possível, mas a edificação nunca mais será a mesma, afirma Francisco Zorzete, restaurador e diretor de uma empresa especializada em reconstruções. "Restaurar conforme era originalmente, ou como foi um dia, é impossível", disse Zorzete ao jornal O Estado de S. Paulo.
É possível restaurar uma obra como essa?
Sim, sempre é possível restaurar. Tudo depende do tempo e do investimento. Eu não sei se é o caso da Notre-Dame, mas muitos patrimônios da humanidade e prédios históricos foram escaneados digitalmente, o que facilita a restauração. Veneza, por exemplo, está escaneada. Se ela afundar, é possível reconstruí-la inteira. Esse escaneamento permite recuperar os mínimos detalhes de uma edificação ou de uma escultura: filigranas de colunas, de janelas, vitrais, tudo em detalhes. Mas, mesmo sem isso, é possível reconstruir a catedral.
Como é feito esse tipo de escaneamento?
É como um scanner normal. É um escaneamento a laser. Você mapeia os pontos que quer reproduzir. Com uma máquina a laser, você escaneia uma escultura, uma obra, uma edificação. É exatamente como uma tomografia, que consegue retratar os mínimos detalhes. Dá para fazer isso com todos os tipos de obra.
Quanto tempo demoraria para reconstruir essa catedral?
É muito difícil dizer com precisão. A restauração após o incêndio na Estação da Luz e no Museu da Língua Portuguesa, por exemplo, demorou quatro anos. Tudo depende do investimento feito e do mapeamento da obra, dos dados disponíveis sobre ela. Às vezes, fico frustrado, porque começo uma restauração e, enquanto pesquiso os detalhes da edificação, da estrutura, dos materiais, um prédio ao lado já foi construído e inaugurado. O tempo de uma restauração desse tipo é diferente. Demora porque é preciso investigar todos os detalhes originais, da pintura, dos materiais, fazer a retrospecção, consultar a iconografia, encontrando os detalhes.
A recuperação é fiel ao projeto original?
O incêndio é muito prejudicial, ele consome tudo, todos os detalhes. Restaurar conforme era originalmente, ou como foi um dia, é impossível. Os materiais já não existem mais, o prédio terá modernizações para se enquadrar em padrões de segurança, sistema de incêndio, energia, ar-condicionado, é preciso adaptar o prédio histórico aos padrões de segurança atuais. É possível chegar próximo, esteticamente, à parte formal da edificação, aquilo que se via. Mas nunca serão como foram um dia, internamente, as estruturas e o madeiramento.
Quanto custa um restauro desses?
É quase impossível dar esse número com precisão sem conhecer os detalhes. Posso dizer que um prédio histórico em São Paulo, por exemplo, cheio de detalhes, com glamour, uma arquitetura mais rococó, com elementos decorativos, costuma sair cerca de R$ 7 mil o metro quadrado de restauração. Mas tem coisas que são impossíveis de pôr preço, ainda mais uma obra de séculos atrás.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.