Manifestantes invadiram o Conselho Legislativo (Parlamento) de Hong Kong nesta segunda-feira, 1º, aniversário da devolução da cidade ao controle chinês em 1997, em meio à revolta generalizada com um projeto de lei que permitiria extradições à China, aprofundando o caos na cidade.
Dezenas de pessoas entraram no edifício, mas não está claro quantas ainda estão em seu interior. Policiais do batalhão de choque equipados com capacetes, escudos e bastões usaram spray de pimenta para tentar impedir a invasão. No momento da entrada da multidão, no entanto, as forças de segurança aparentemente recuaram para evitar confrontos mais violentos.
"Quando ouvi que havia enfrentamento do lado de fora (do Parlamento) fiquei realmente preocupada", disse Amy Siu, uma contadora de 37 anos que participa da manifestação. "Me preocupo pela segurança desses jovens", completou.
Um grupo pequeno, composto na maioria por estudantes que usavam capacetes e máscaras, usou um carrinho de metal, barras e pedaços de andaime para quebrar o vidro reforçado e avançar contra o complexo do governo. Outros manifestantes cobriram estes com dezenas de guarda-chuvas para impedir que as câmeras gravassem seus rostos e pudessem ser identificados posteriormente.
"Eu não acuso os jovens (de estarem errado), eu acuso o governo", disse um manifestante de 80 anos que se identificou apenas com seu sobrenome, Yeung.
Os manifestantes, alguns com filme plástico ao redor dos braços para proteger a pele em caso de uso de gás lacrimogêneo, voltaram a paralisar partes do polo financeiro asiático ao ocupar ruas que já haviam interditado com barreiras de metal. Outros estavam erguendo barricadas com canos de ferro nas ruas de acesso para repelir a polícia e vasculhando ruas próximas em busca de grades.
Em uma dessas ruas adjacentes, Sam Mu, um artista local, tremulava bandeiras negras. "É o símbolo da queda de nossa cidade", disse. "As liberdades da nossa cidade estão diminuindo, estamos caminhando para o autoritarismo."
Raiz do descontentamento
As manifestações refletem o temor dos moradores de Hong Kong ante a crescente influência do governo da China, com a ajuda dos líderes do mundo das finanças na cidade.
A líder de Hong Kong, Carrie Lam, suspendeu em 15 de junho o projeto de lei de extradição, que permitiria que pessoas fossem extraditadas para a China continental para serem julgadas em tribunais controlados pelo Partido Comunista, mas não chegou a descartá-lo, como exigido pelos manifestantes.
Apoiada por Pequim, Carrie se aferra ao cargo em um momento de reação inédita contra o governo e uma série de protestos em massa que representam o maior desafio popular ao líder chinês, Xi Jinping, desde que ele chegou ao poder, em 2012.
"Este é o fim de Hong Kong. Se Carrie Lam continuar sendo chefe do nosso Executivo, só vemos uma verdadeira escuridão adiante", disse uma dona de casa de 60 anos de sobrenome Lau, que tem um passaporte estrangeiro. "Então queremos lutar pelos jovens."
Os manifestantes também exigem a renúncia de Carrie, assim como a retirada das acusações contra as pessoas detidas nos protestos das últimas semanas.
Os ativistas, em sua maioria jovens estudantes, prometem continuar sua campanha de desobediência civil. "Aconteça o que acontecer, não vamos desanimar", disse Jason Chan, um contador de 22 anos. "A resistência não é uma questão de um dia, é a longo prazo", prometeu.
Erosão das liberdades
O movimento, que nasceu da rejeição ao projeto de lei sobre extradições, ganhou força e passou a denunciar as ações do governo local, depois que muitos cidadãos de Hong Kong perderam a confiança ao considerar que o Executivo tem permitido a erosão de suas liberdades.
Hong Kong foi transferida do Reino Unido para a China em 1997, mas o território ainda é administrado sob um acordo conhecido como "um país, dois sistemas".
Desta maneira, os habitantes do território desfrutam de direitos raramente vistos na China continental. Muitas pessoas, no entanto, sentem que lentamente Pequim vai deixando o acordo de lado.
A cada aniversário da devolução, ativistas locais organizam grandes manifestações para exigir direitos democráticos, incluindo a possibilidade de escolher o Executivo local por sufrágio universal.
Em anos recentes, os ativistas conseguiram mobilizar grandes multidões - incluindo uma ocupação de dois meses em 2014 -, mas não conseguiram qualquer concessão importante por parte de Pequim.