Presidente da empresa brasileira investigada pelo Congresso do Paraguai por buscar supostas vantagens na compra da energia excedente da hidrelétrica de Itaipu, o empresário Kleber Ferreira já foi condenado em duas instâncias na Justiça de São Paulo por dar um calote no mercado livre de energia no Brasil, em uma ação de cobrança que chega a R$ 713 milhões.
O calote ocorreu em 2008, dois anos antes de Ferreira abrir a Léros Comercializadora de Energia, empresa que é alvo de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Paraguai. O grupo investiga supostas irregularidades em uma ata bilateral de Itaipu assinada entre o governo brasileiro e o país vizinho. O pacto levou à atual crise política do governo do presidente paraguaio Mario Abdo Benítez.
Ferreira, o ex-sócio Francisco de Lavor e sua antiga empresa, a União Comercializadora de Energia Elétrica S/A, foram acusados pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), entidade que gerencia o mercado livre de energia no Brasil, de vender e não entregar R$ 208 milhões em energia. Por causa da venda sem lastro, a CCEE aplicou multas e outras penalidades à empresa, que somam cerca de R$ 505 milhões, cobrou a devolução dos valores na Justiça e expulsou a empresa da entidade em 2016.
"Vendeu o que não possuía, levantou o lucro obtido com a venda de energia e, ao invés de depositar na CCEE para que esta Câmara destinasse os valores aos agentes que foram impactados pela inadimplência da União, simplesmente optou por embolsar R$ 30 milhões", diz a CCEE no processo.
Em julho do ano passado, a juíza Mônica Gantus Encinas, da 3ª Vara Cível de São Paulo, condenou todos os réus a pagar todo o valor devido, mas determinou a realização de uma perícia técnica para auferir a quantia a ser paga. Em março deste ano, magistrados da 36.ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça paulista negaram o recurso da União e mantiveram a condenação. Na semana passada, os condenados apresentaram um último recurso ao Judiciário paulista e devem recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) em caso de nova derrota.
Na época do calote, Ferreira era sócio minoritário e diretor comercial da União, que tinha Francisco de Lavor, seu ex-sogro, como mandatário. "A gestão da empresa é minha.
Lavor relatou ainda que tem interesse em pagar as dívidas, mas contesta os valores. Segundo Lavor, a multa aplicada na época pela CCEE era mensal e cumulativa e o valor total do rombo é de aproximadamente R$ 30 milhões, em valores de 2008. "As multas da época eram absurdas, tanto que a regra mudou", disse ele.
Ande
A Léros é pivô na crise política que afeta o governo do Paraguai desde que o acordo para redistribuição da energia de Itaipu veio à tona, no fim de julho. A ata havia sido assinada em maio pelos dois países e foi cancelada a pedido do presidente paraguaio após a forte reação contrária ao acordo no país vizinho.
Um dos pontos mais questionados do pacto é a exclusão do item 6 da ata final. O dispositivo dava à Administração Nacional de Energia (Ande), estatal paraguaia, o direito de vender ela mesma a energia excedente de Itaipu no mercado brasileiro, sem a necessidade de intermediários como a Léros. Com a exclusão do item 6, apenas empresas privadas, como a que é presidida por Ferreira, podem comercializar a energia paraguaia no Brasil.
Nos dias 9 de abril e 9 de maio o empresário Alexandre Giordano, suplente do senador Major Olímpio (PSL-SP), foi de jatinho ao Paraguai acompanhado de Adriano Rosa, representante da Léros, para tratar sobre o negócio. Em mensagens entregues ao Ministério Público do Paraguai pelo ex-presidente da Ande Pedro Ferreira, o advogado José "Joselo" Rodríguez, que se apresentava como assessor jurídico do vice-presidente Hugo Velázquez, dizia que a Léros representava o "governo brasileiro" e citava a "família presidencial".
A Léros chegou a fazer uma proposta formal para ter o direito de comercializar a energia excedente de Itaipu.
O governo brasileiro nega ter influenciado no negócio. A oposição ao presidente paraguaio, Mario Abdo Benítez, quer o impeachment do mandatário por considerar que o acordo firmado com o Brasil - e depois cancelado- é crime de "traição à pátria".
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo..