O presidente Jair Bolsonaro está disposto a aceitar ajuda dos países e organizações internacionais desde que possa controlar os recursos de combate aos incêndios na Amazônia.
O governo está aberto a receber apoio financeiro de organizações e países desde que isto "não ofenda a soberania brasileira e que a governança desses recursos seja de nossa responsabilidade", declarou o porta-voz Otávio Rego Barros nesta terça-feira, horas após Bolsonaro condicionar a recepção da ajuda a um pedido de desculpas do presidente francês, Emmanuel Macron.
Sobre a proposta de uma cúpula regional dos países afetados, realizada por Peru e Colômbia, Otávio Rego Barros disse que Bolsonaro "participara dessas atividades", destacando que "a cooperação sul-americana é essencial neste combate".
Ao ser perguntado sobre um recuo do presidente em relação à ajuda externa, o porta-voz afirmou que "o presidente não recua, ele avança em direção ao bem estar da nossa sociedade".
O líder francês anunciou após a Cúpula do G7 em Biarritz, neste final de semana, que o grupo doaria 20 milhões de dólares aos países da bacia amazônica para se enfrentar a crise.
Mas o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, disse na segunda-feira que o Brasil rejeitaria a ajuda, enquanto Bolsonaro a condicionou a um pedido de desculpas de Macron.
"Primeiramente, o senhor Macron deve retirar os insultos que fez à minha pessoa. Primeiro me chamou de mentiroso. E depois, informações que eu tive, de que a nossa soberania está em aberto na Amazônia", havia declarado Bolsonaro.
Na véspera, o presidente francês citou a possibilidade de conferir um "estatuto internacional" à selva amazônica caso "um estado soberano adotasse de maneira concreta medidas claramente contrárias ao interesse de todo o planeta".
Perguntado sobre se Bolsonaro já não condicionava a recepção da ajuda a um pedido de desculpas de Macron, o porta-voz declarou que o Brasil vai receber os recursos estrangeiros, desde que o manejo "seja nosso".
A postura de Bolsonaro sobre a questão ambiental já havia provocado a paralisação do Fundo Amazônia, financiado por Noruega e Alemanha.
A recusa da ajuda do G7 havia alarmado os nove governadores dos estados amazônicos, que pediram a Bolsonaro que reavaliasse sua posição, em uma reunião em Brasília nesta terça-feira.
Wilson Lima, governador do estado Amazonas, ressaltou que o apoio internacional é bem-vindo. Helder Barbalho, do Pará, destacou a importância do Fundo Amazônia. Flávio Dino, governador do Maranhão, disse que os extremismos não são adequados para enfrentar uma temática complexa como a do meio ambiente.
A tensão com a França contrasta com os elogios que Bolsonaro recebeu de seu aliado dos Estados Unidos, Donald Trump, nesta terça.
"Conheço bem o presidente Jair Bolsonaro por nossa relação com o Brasil. Ele está trabalhando duro nos incêndios na Amazônia e, em todos os aspectos, está fazendo um ótimo trabalho para o povo brasileiro", tuitou.
Na mesma rede social, Bolsonaro agradeceu a Trump.
"Estamos tendo grande sucesso no combate aos incêndios. O Brasil é e continuará sendo exemplo para o mundo em desenvolvimento sustentável", afirmou Bolsonaro.
"A campanha de fake news fabricada contra nossa soberania não funcionará", acrescentou.
Na Bolívia, onde o fogo também afeta uma parte de seu território na Amazônia, o presidente Evo Morales agradeceu a ajuda do G7, mas a definiu como uma quantia "muito pequena".
- Questão de soberania -
Macron questionou na segunda-feira, no final da cúpula do G7 na França, a possibilidade de conferir um "estatuto internacional" à Floresta Amazônica, caso "um Estado soberano adotasse medidas concretas claramente contrárias ao interesse de todo o planeta".
A presidência francesa afirmou ainda que Bolsonaro "mentiu" quando assegurou que iria respeitar os compromissos de combater as mudanças climáticas.
O ministro da Casa Civil Onyx Lorenzoni sugeriu a Macron na segunda-feira que cuidasse de "sua casa e suas colônias", esta última em referência aos territórios franceses no exterior, que incluem o Guiana Francesa, na fronteira com o Brasil, exatamente no norte da Amazônia.
A tensão tomou contornos pessoais quando Bolsonaro fez um comentário no fim de semana no Facebook que continha uma mensagem ofensiva em relação à primeira-dama francesa Brigitte Macron. O presidente francês classificou os comentários de "extraordinariamente desrespeitosos".
Bolsonaro, ao ser indagado pelos jornalistas na terça, negou qualquer má intenção.
"Alguém que botou a foto lá, e eu falei para ele não falar besteira", afirmou o presidente brasileiro, que, no entanto, encerrou abruptamente a entrevista quando os jornalistas pediram mais explicações.
A situação levou o escritor Paulo Coelho a pedir desculpas em francês, em um vídeo postado no Twitter, pelo que chamou de "histeria de Bolsonaro em relação à França, ao presidente da França e a sua esposa".
"Enquanto a Amazônia está queimando, eles não têm nenhum argumento e apenas insultam, negam, dizem qualquer coisa para evitar assumir (sua) responsabilidade", acrescentou o escritor em referência às autoridades brasileiras.
- Mais incêndios -
Os dados de satélite do Instituto Nacional de Pesquisa (Inpe) contabilizam 82.285 focos de incêndio de janeiro até segunda-feira, 26 de agosto, 51,9% do total na Floresta Amazônica.
O número total marca um aumento de 1.650 focos de incêndio em comparação com o dia anterior e representa um aumento de 80% em relação ao mesmo período de 2018.
Mas o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, disse na segunda que a situação "está sob controle", observando que o destacamento de mais de 2.500 soldados, centenas de veículos e 15 aeronaves, incluindo dois aviões-tanque Hércules C-130, foram mobilizados para controlar as chamas em nove estados através dos quais a Floresta Amazônica se estende.
Porto Velho, capital de Rondônia, uma das cidade mais afetadas, acordou nesta terça-feira com o céu mais limpo graças a uma chuva de cerca de 10 minutos na tarde anterior.
O aeroporto, que na segunda-feira ficou fechado por cerca de duas horas por causa da fumaça, funcionou normalmente.
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