De início hostil a uma Europa supranacional por tradição gaullista, Jacques Chirac acabou se unindo à construção europeia, acompanhando a transição para o euro, mas sofrendo um amargo fracasso político durante o referendo sobre a Constituição Europeia em 2005.
"Não ao desaparecimento internacional da França", proclamou Chirac em dezembro de 1978 de um hospital de Paris, onde foi internado após um acidente de carro, criticando o "partido estrangeiro" em referência à postura pró-europeia da UDF de seu rival, o presidente Valéry Giscard d'Estaing.
Em campanha pelas eleições europeias de 1979, o ex-primeiro-ministro se elevou contra "esta Europa da impotência", "não europeia, mas dominada pelos interesses germano-americanos". Sua lista "Defesa dos interesses da França na Europa" chegou em quarto lugar.
Depois de se opor à adesão de Espanha e Portugal ao bloco em 1986 em nome dos interesses dos agricultores, Chirac acabou se convertendo ao projeto europeu. Em 1992, quando uma parte de seu partido RPR fazia campanha contra o Tratado de Maastricht, ele convocou o "sim" no referendo.
"Neste momento, Jacques Chirac compreendeu que, para ser presidenciável, tinha que ser europeu", comenta o historiador Jérôme Pozzi, especialista em gaullismo. "É um casamento de conveniência", completou.
Pierre Sellal, antigo embaixador francês na UE nomeado em 2002 por Chirac para ficar Bruxelas, reconhece que o ex-presidente "não era um europeu de vocação, mas de dever".
"Nunca foi um federalista fervoroso, nem um supranacionalista alocado", comentou.
"Mas era consciente de ter recebido uma herança, em particular do general de Gaulle: a reconciliação franco-alemã e o mercado comum", acrescenta este ex-diretor de gabinete do ex-chanceler francês Hubert Védrine (1997-2002), para quem o presidente entre 1995 e 2007 "nunca falhou com a Europa nos momentos decisivos".
- "Sinto muito" -
A trajetória europeia de Jacques Chirac é marcada por um fracasso, porém, que freou a União Europeia. Em 29 de maio de 2005, os franceses rejeitaram, em referendo, o tratado que estabeleceria uma Constituição Europeia.
Chirac, que assumiu o risco de organizar esta consulta para ratificar o tratado, entoou, após sua última cúpula europeia em 2007, seu mea-culpa por este revés ao projeto europeu.
"Sinto muito por não ter feito tudo que podia", lamentou.
Para a historiadora Marion Gaillard, especialista em construção europeia, Jacques Chirac "não é alguém que tenha trazido uma visão de Europa", embora tenha desempenhado um papel importante na transição para a moeda única por seu apoio ao Tratado de Maastricht e ao relançamento da política europeia de Defesa.
A cúpula franco-britânica entre Jacques Chirac e Tony Blair em Saint-Malo (oeste da França) em dezembro de 1998 levou à criação da Política Europeia de Segurança e Defesa, lembra Marion.
Sua presidência pro tempore da UE no segundo semestre de 2000 foi alvo das críticas, assim como o Tratado de Nice, acordado em dezembro deste mesmo ano, por sua falta de ambição.
O ex-chefe de Estado francês criou uma polêmica em 2003, ao criticar países do Leste europeu, então candidatos à adesão ao bloco, por terem "perdido uma boa ocasião de se calarem" ao darem seu apoio aos Estados Unidos no Iraque.
Outra anedota célebre remonta a 1998, quando Chirac, então primeiro-ministro, criticou Margaret Thatcher durante uma cúpula europeia pelas exigências de sua colega britânica de uma redução da contribuição britânica ao orçamento comunitário.
"O mais esta dona de casa quer? Minhas bolas em uma bandeja?", afirmou, sem saber que o microfone estava aberto.