Jornal Estado de Minas

Pesquisa sobre 'aids dos coalas' revela evolução genética em ação

Coalas selvagens afetados por um retrovírus mortal estão combatendo a doença no nível genético, disseram cientistas nesta quinta-feira (10), um raro processo evolutivo que está se desenvolvendo diante de nossos olhos.

O retrovírus KoRV-A começou a infectar o marsupial entre centenas e alguns milhares de anos atrás, começando no norte da Austrália e se espalhando para o sul, e pode ter se originado em morcegos.





O vírus está ligado à Síndrome da Imunodeficiência Coala (Kids, na sigla em inglês), que é semelhante, porém menos potente que a aids em humanos, e torna os animais suscetíveis a cânceres fatais e infecções secundárias, como a clamídia, que os torna inférteis.

Os retrovírus funcionam inserindo seu genoma em um genoma hospedeiro, mas, diferentemente do HIV, o KoRV-A também entra nas células germinativas do animal que produzem espermatozoides e óvulos, o que significa que é transmitido através de gerações.

Tais infecções por patógenos nas células germinativas são muito raras, mas pesquisas recentes sugerem que elas são um importante impulsionador da evolução: a última vez que ocorreu em nossos ancestrais humanos foi há três milhões de anos, e 8% do nosso genoma vem de vírus antigos.





Às vezes, os vírus são cooptados para fins úteis, incluindo um que foi responsável pela evolução da placenta em nossos ancestrais mamíferos há cerca de 100 milhões de anos.

Em um novo artigo publicado na revista Cell nesta quinta-feira, uma equipe de cientistas da Faculdade de Medicina da Universidade de Massachusetts e da Universidade de Queensland revelou um tipo de "imunidade genômica" em coalas recém-infectados.

Isso contrasta com o combate à infecção pelo sistema imunológico, como os animais normalmente combatem as doenças.

Suas descobertas sugerem que as células germinativas reconhecem um passo essencial no ciclo de vida viral e o voltam contra o invasor para suprimir a infecção do genoma, sendo capaz de distinguir a diferença entre suas próprias células e o vírus.

"E parece funcionar, mas não muito bem", disse à AFP William Theurkauf, da UMass Medical School e principal autor do artigo.

Theurkauf fez uma analogia com um humano que pegou uma gripe: você se sentirá doente mesmo quando seu corpo estiver combatendo a doença. Não fosse a resposta imunológica inicial, todas as infecções acabariam levando à morte.





O que os coalas ainda precisam evoluir é uma segunda fase de resposta na qual pequenos ácidos ribonucleicos especializados (RNAs), que desempenham papéis reguladores cruciais em vários processos, são produzidos para desligar o vírus.

"Então, estamos vendo a resposta inicial", disse Theurkauf. "A questão é: podemos encontrar coalas que passaram para a próxima fase em que eles realmente o estão desligando?"

Não está claro se isso já aconteceu em alguns coalas ou, se não, quanto tempo levará para a espécie evoluir a resposta. Se isso não acontecer, o vírus "poderia ser um mecanismo de extinção", acrescentou.

Como alternativa, um dia os humanos poderiam intervir para acelerar a evolução via engenharia genética, em vez de esperar que os coalas cheguem lá sozinhos - embora a ciência ainda esteja muito distante disso.