Jornal Estado de Minas

FACTCHECK: Médicos não recomendam chá de erva-doce para combater novo coronavírus

Uma série de publicações viralizou nas redes sociais brasileiras com a afirmação de que médicos estariam recomendando o consumo de chá de erva-doce para combater a nova variedade do coronavírus, pois a infusão conteria a mesma substância do remédio Tamiflu. Especialistas negaram, no entanto, essa relação e o medicamento não é indicado para o tratamento do coronavírus.



Detectada na China no final de 2019, a nova variedade do coronavírus já deixou mais de 200 mortos e cerca de 10.000 pessoas infectadas. A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou na quinta-feira a emergência internacional e vários países intensificaram as medidas de precaução para conter a propagação do novo vírus.

- O que circulou nas redes? -

As postagens dizem que o diretor de uma instituição identificada apenas como "Hospital das Clínicas" recomenda "tomar chá de erva-doce duas vezes por dia", já que "esta erva tem a mesma substância que o medicamento Tamiflu, o remédio usado para tratar a gripe A - H1N1. E aconselha-se tomar o chá como se fosse café, após as refeições".

Outra suposta fonte de informação é um infectologista do Hospital São Domingos, que também teria recomendado tomar o chá de 12 em 12 horas, "pois ele mata o vírus da influenza".

- Checamos -

No entanto, o Ministério da Saúde desmentiu em nota a alegação de que o chá de erva-doce tenha a mesma substância do Tamiflu, indicado para tratar casos de síndrome respiratória aguda grave e de síndrome gripal.



"As orientações de que o chá de erva-doce tem a mesma substância do medicamento Tamiflu são falsas! O chá de erva-doce não possui o princípio ativo do Tamiflu (fosfato de oseltamivir)", afirmou a pasta em seu site.

Esta informação foi reiterada pela farmacêutica Roche, responsável pelo desenvolvimento do Tamiflu, em nota enviada à AFP Checamos.

"O medicamento Tamiflu, desenvolvido pela Roche, é composto por fosfato de oseltamivir (...) além de alguns excipientes, que são substâncias que complementam a massa ou volume nos medicamentos produtos farmacêuticos. Deste modo, não há, na composição de Tamiflu, o anis estrelado ou a erva-doce".

A alegação foi igualmente negada em comunicado pelo Hospital São Domingos, de São Luís, no Maranhão, citado na mensagem viralizada, declarando que nenhum infectologista da sua equipe teria recomendado o uso do chá de erva-doce.

Também não é verdade que o Tamiflu (oseltamivir) seja recomendado para tratar o coronavírus, como explica em um informe a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI). Segundo a SBI, "o oseltamivir está indicado somente para tratamento e prevenção de infecção pelo vírus influenza".



À equipe de checagem da AFP, a Roche reforçou que o Tamiflu é indicado para "o tratamento e profilaxia da gripe".

- O novo coronavírus -

Por ter sido descoberto recentemente, ainda não há vacina ou medicamento específico para o novo coronavírus, conhecido como 2019-nCoV. Segundo a SBI, indica-se repouso e ingestão de líquidos, "além de medidas para aliviar os sintomas, como analgésicos e antitérmicos".

A OMS, por sua vez, recomenda, como precaução, manter a higiene das mãos, práticas alimentares seguras e evitar contato próximo com qualquer pessoa que mostre sintomas como tosse e espirros.

A associação entre a erva-doce - conhecida popularmente no Brasil como anis - e o Tamiflu pode ter origem no fato do anis estrelado chinês possuir um ácido que é utilizado na produção do oseltamivir, o princípio ativo do remédio, como explica o Conselho Regional de Farmácia do Estado do Paraná em uma postagem feita em sua página no Facebook.

O CRF-PR esclarece, no entanto, que apenas o ácido do anis estrelado não tem o mesmo efeito do medicamento, uma vez que são necessárias várias reações químicas complexas para transformá-lo em oseltamivir. A erva-doce não é, ainda, relacionada na botânica ao anis estrelado chinês.