Jornal Estado de Minas

INTERNACIONAL

África corre contra o tempo para conter vírus

Desde que o coronavírus foi considerado uma pandemia, autoridades de saúde expressam preocupação com a África. O número oficial de casos confirmados ainda é baixo, 10 mil, mas o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) faz um alerta: é preciso agir contra o tempo para evitar uma catástrofe.

Nos 54 países do continente vive um sétimo da população mundial - muitos em guerra e pobreza extrema. "Temos de agir agora, informar sobre a doença, como preveni-la, preparar clínicas e hospitais para atendimento rápido e garantir que as pessoas tenham acesso ao básico: água e sabão. Se agirmos rápido, conseguiremos evitar o pior", afirma Crystal Wells, porta-voz do CICV no leste da África.

Até agora, a África do Sul tem o maior número de contaminados no continente, com mais de 1,7 mil casos e 9 mortes. No país, profissionais de saúde usam trajes de proteção e máscaras ao testar a população, que está confinada até dia 16 sob ordem do governo. O presidente, Cyril Ramaphosa, lançou uma campanha que mobilizou 10 mil médicos, enfermeiras e voluntários para impedir a disseminação da doença.

Mas a preocupação dos agentes comunitários está em outros países, principalmente pela precariedade dos sistemas de saúde. Os hospitais sofrem com falta de camas e respiradores, há poucos médicos e serviços como água corrente são raros em muitos lugares. Segundo o CICV, a situação é ainda mais grave porque não houve redução da violência em países em guerra, o que tende a sobrecarregar os centros de saúde.

"O surto está pressionando sistemas sofisticados de saúde na Europa e Ásia, com equipes médicas sobrecarregadas lutando para tratar seus pacientes, e instalações de terapia intensiva lotadas nos países ricos. Imagine o que acontecerá com os sistemas de saúde na África quando o vírus chegar", disse Winnie Byanyima, diretora do Programa Conjunto da ONU sobre Aids (Unaids).

Wells relata uma preocupação especial com alguns países, como o Sudão do Sul, que sofre com a guerra há muitos anos, tem comunidades devastadas, hospitais lotados de feridos por bala. "As pessoas lá morrem de outras doenças, como malária, que tem tratamento, porque não há acesso a um sistema de saúde adequado", afirma.

O fato de os conflitos continuarem exige que as organizações humanitárias continuem atuando. "As pessoas continuam contando com nossos sistemas para sobreviver, como a distribuição de comida. O que estamos fazendo é colocar as pessoas na fila em uma distância adequada, pedindo que lavem as mãos sempre", explica.

Em Burkina Fasso, país mais afetado do oeste da África, o número de deslocados pelos conflitos internos é o ponto mais alarmante porque, segundo o CICV, dificulta táticas de detecção da covid-19 e a manutenção do distanciamento social.

"A Somália também tem infraestrutura precária. Apenas 50% da população vive em regiões urbanas com acesso a sistemas de saúde adequados", disse Wells. Segundo a agência France Press, na Somália há menos de um médico para cada 10 mil habitantes e muitos já estão contaminados com a covid-19.

"No norte do Mali, mais de 90% das instalações de saúde foram destruídas pela guerra e as que sobraram estão lotadas por feridos", afirmou Wells. O governo do país impôs um toque de recolher para tentar evitar a propagação da doença.

O vírus, segundo o CICV, pode não ser controlado caso afete os países e comunidades mais frágeis da África. "Nosso maior medo é que se ele continuar a se espalhar e chegar em áreas que são muito pobres ou enfrentam crises em razão da violência, o controle da doença será quase impossível e os sistemas de saúde vão colapsar."

A Cruz Vermelha lançou um apelo, no mês passado, pedindo 800 milhões de francos suíços (US$ 823 milhões) para ajudar as comunidades mais vulneráveis do mundo. A verba será destinada também para fornecer mais suprimentos a estabelecimentos de saúde, expandir programas de saneamento e prevenção da covid-19.

Os governos africanos estão impondo restrições de circulação, medidas de confinamento, fechamento de fronteiras, mas o CICV pede que seja garantido o acesso a água e sabão e haja muita divulgação sobre a doença e a pandemia. "Notícias falsas podem levar à morte. Precisamos informar sobre o que é o coronavírus, o que faz e como pode ser combatido para que as famílias saibam como agir se alguém ficar doente."

O CICV considera essencial que os sistemas de saúde sejam melhorados porque em alguns locais as medidas impostas sob orientação da Organização Mundial da Saúde (OMS), como o distanciamento entre as pessoas, não poderão ser cumpridas. "Como manter a distância aconselhada quando se vive em um campo de refugiados e se dorme em uma tenda com mais 10 pessoas da família? Por isso, precisamos garantir as questões básicas", afirma Wells. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.