Sua casa no noroeste da Síria está em ruínas, mas Hassan Jraybi e seus dez filhos decidiram voltar à cidade natal devastada pela guerra, como muitas outras pessoas deslocadas, que estão deixando áreas superlotadas por medo do novo coronavírus.
Aproveitando um cessar-fogo na província de Idlib, esse pai retornou para Ariha, onde se estabeleceu em um pequeno apartamento emprestado por um conhecido.
"Estávamos no norte [de Idlib], onde os campos de deslocados internos estão superlotados", explica o homem de 40 anos, corpulento e com a pele queimada pelo sol.
"Tivemos medo da disseminação do coronavírus. Decidimos voltar, mesmo com nossas casas destruídas", conta.
Oficialmente, nenhum caso de COVID-19 foi registrado na província de Idlib e seus arredores, a última grande fortaleza jihadista e rebelde. Cerca de três milhões de pessoas vivem nesta região.
As ONGs temem uma catástrofe humanitária, se o vírus se espalhar nesta área, especialmente nos campos lotados onde famílias vivem na miséria, com acesso limitado à atenção médica e à água limpa.
Apesar de sua casa ter sido reduzida a uma montanha de escombros, Hassan escolheu voltar para Ariha. E, todos os dias, percorre com seu caminhão-pipa as ruas devastadas da cidade, para vender água aos habitantes que, como ele, apostam em voltar.
- "Medo pelas crianças" -
A família de Hassan estava entre os quase um milhão de deslocados registrados pela ONU, que foram expulsos de suas casas por uma ofensiva relançada em dezembro passado pelo governo Bashar al-Assad e por seu aliado russo no noroeste da Síria.
Muitos fugiram para o norte da província de Idlib, na fronteira com a Turquia, considerada a mais segura.
Hassan e sua família viveram ali por dois meses, estabelecendo-se por um tempo em um campo de deslocados perto de Maaret Misrin.
No início de março, porém, quando a epidemia de COVID-19 se espalhava pelo mundo e uma trégua interrompeu a ofensiva do regime, centenas de famílias aproveitaram a oportunidade para voltar para Ariha.
É o caso de Rami Abu Raed, que passou dois meses com sua esposa e três filhos no norte de Idlib.
Lá, a família compartilhava seu alojamento com conhecidos.
"Em cada casa havia três ou quatro famílias morando juntas", conta esse pintor de 32 anos. "Não era viável, especialmente com o coronavírus. Fiquei com medo pelas crianças e voltei", confessa Rami.
Rami viveu dois anos em Ariha, após vários deslocamentos forçados pelas sucessivas ofensivas do regime. Hoje não confia na frágil trégua estabelecida em Idlib.
"O motivo dessa calma é o coronavírus. Se desaparecer, o regime retomará as operações", diz ele.
Por enquanto, Damasco parece concentrado no combate à epidemia, que oficialmente infectou 29 pessoas e deixou dois mortos nos territórios sob seu controle.
- "Quero voltar" -
Em Ariha, os primeiros sinais de uma reconstrução tímida começam a ser vistos. Vários homens trabalham para destruir telhados quebrados, enquanto outros alinham os blocos de concreto.
E, um pouco por toda parte, as crianças riem e brincam entre as ruínas.
Uma padaria foi reaberta, e as barracas da feira voltaram ao centro da cidade, onde vendedores de vegetais se instalam diante de pilhas de entulho.
Um Abdu e seu marido também planejam retornar à sua terra natal, Ariha, no final de abril. Antes, precisam encontrar um alojamento, porque sua casa foi destruída pelos combates.
O casal e seus cinco filhos, deslocados há dois meses, vivem atualmente em uma mesquita perto da fronteira com a Turquia, disseram eles durante uma recente visita a Ariha.
Um Abdu conseguiu retornar brevemente à sua cidade natal para visitar os túmulos de seus dois filhos, mortos em bombardeios nos últimos anos.
"Quero voltar especialmente por eles", confessa.
A mulher, na casa dos 40 anos, aproxima o rosto de uma lápide com os braços em volta dela. Sua filha de quatro anos, Malak, imita o gesto. Ambas usam máscara, como exigem os tempos de coronavírus.