No início de janeiro, Carlos Paya embarcou no que chamou de "grande ilusão": um cruzeiro pelo mundo. Mais de cem dias depois, aportou em terra firme pela primeira vez em cinco semanas nesta segunda-feira (20) e encontrou um mundo atormentado pelo coronavírus.
"Estávamos acompanhando a situação pela televisão, nos noticiários, mas o impacto da chegada é tremendo. Sair com máscara, luvas ... Não nos acostumamos à ideia, talvez em alguns dias, mas ainda é um choque", explicou o turista por telefone.
A viagem terminou em Barcelona, onde o cruzeiro 'Costa Deliziosa' desembarcou parte dos passageiros após uma longa navegação desde a Austrália.
Algumas horas depois, ele chegou de trem à sua casa em Valência, 350 km ao sul. "Desabei quando encontrei a cidade vazia, sem pessoas, sem carros ... Era em parte bonito, mas vê-la assim é de partir o coração".
O jornalista esportivo e sua esposa sonhavam em navegar pelo mundo há anos e decidiram quando ele foi diagnosticado com uma doença degenerativa.
Eles embarcaram em 5 de janeiro em Veneza, no norte da Itália, quando o vírus que atacaria primeiro a China era desconhecido do grande público.
"Tivemos uma noção do problema assim que deixamos Bora Bora ( Polinésia Francesa, no Pacífico)", explicou Carlos. "Do paraíso, vimos o mundo se transformar em um inferno", acrescentou.
- Arca de Noé -
As escalas na Ásia foram substituídas pela navegação no sul da Austrália, que, em seguida, fechou suas fronteiras. A única escolha foi partir para a Europa, em paradas técnicas ao longo do caminho.
"Os primeiros dois terços do cruzeiro foram maravilhosos e o restante foi tão estranho que acredito nunca mais viverei nada parecido", disse o turista que elogiou repetidamente a tripulação.
Para Paya, viajar no luxuoso navio de doze andares, com 1.800 passageiros e 900 tripulantes e sem nenhum caso de coronavírus a bordo, foi como viver em um mundo à parte, uma "Arca de Noé".
"Não podemos reclamar. Estávamos em um lugar onde era possível interagir, comer juntos, ir ao teatro, coisas que não podem ser feitas em lugar nenhum", explicou o passageiro que comemorou seus 59 anos a bordo.
Mesmo assim, eles não estavam imunes ao que aconteceu fora dos 300 metros de comprimento do navio. Muitos turistas eram italianos e espanhóis, para quem "a tragédia teve um duplo impacto".
Embora alguns preferissem permanecer a bordo, longe dos perigos de contágio e onde as restrições eram menos severas, Carlos e a esposa ficaram felizes por voltar para casa e para o filho de 21 anos.