Os presidentes dos Estados Unidos, Donald Trump, e do México, Andrés Manuel López Obrador, trocaram elogios nesta quarta-feira (8), em um primeiro encontro cara a cara que ignorou as tensões entre os dois países desde a chegada ao poder do bilionário republicano.
A visita, concentrada em celebrar a entrada em vigor na semana passada do T-MEC, nova versão do acordo de livre comércio da América do Norte, em vigor desde 1994, foi marcada pelos elogios de Trump à "estreita" relação entre os dois países e o tom conciliatório de AMLO, como o presidente mexicano é conhecido pelas iniciais de seu nome.
"A relação entre Estados Unidos e México nunca foi tão boa quanto agora", disse Trump, após chamar López Obrador de "meu bom amigo" e qualificar o vínculo entre os dois como "muito transcendente".
"Estamos realmente comovidos de que tenha escolhido fazer sua primeira visita ao exterior (...) na Casa Branca", disse Trump no Jardim Rosado, depois de um encontro no Salão Oval e uma reunião com as comitivas.
Em sua primeira viagem ao exterior em 18 meses de governo, AMLO agradeceu Trump pelo tratamento "respeitoso" com o México. Parece que ficaram para trás as ofensas de antigamente.
Em 2016, Trump chamou os mexicanos de "estupradores" e "criminosos" e prometeu erguer um muro na fronteira entre os dois países. Em 2017, em seu livro "Oye, Trump" (sem tradução em português), López Obrador considerou uma "canalhice" a retórica anti-imigração de seu colega americano, que comparou à de Adolf Hitler.
Agora, AMLO celebrou que Trump não tenha adotado com o México a Doutrina Monroe, que sustentou intervenções de Washington na América Latina.
"Não pretendeu nos tratar como colônia, mas pelo contrário, honrou nossa condição de nação independente", disse.
E depois reiterou: "Os prognósticos falharam, não brigamos, somos amigos e vamos continuar sendo amigos".
- "Manter Trump satisfeito" -
A visita, que termina com um jantar com empresários poderosos, entre eles Carlos Slim, o homem mais rico do México e 25 vezes mais rico do que Trump, gerou polêmica.
O Canadá, terceiro parceiro do T-MEC, não só não esteve ausente. Seu primeiro-ministro, Justin Trudeau, declinou se somar, devido à possibilidade de sanções americanas ao alumínio canadense.
Também foi questionada por ser celebrada em meio à pandemia que castiga fortemente os dois países. Mas, além disso, ocorre em um momento em que Trump busca a reeleição em novembro e aparece atrás nas pesquisas do democrata Joe Biden, com quem López Obrador se negou a se encontrar.
A viagem do presidente mexicano foi considerado em seu país como um "apoio eleitoral" ao presidente republicano. Foi o que avaliou o ex-chanceler Jorge Castañeda (2000-2003).
"É chamativo que alguém reconhecido por muitos como um presidente de esquerda seja tão complacente com as posturas, sobretudo a respeito da imigração, e a retórica tão anti-México de Trump", disse à AFP Michael Shifter, presidente do Diálogo Interamericano, com sede em Washington.
"O propósito parece ser manter Trump satisfeito e assegurar que os Estados Unidos não faça nada contra os interesses mexicanos", observou.
- Tacos de beisebol -
O encontro foi "todo em um clima de cordialidade e respeito", assegurou o chanceler mexicano, Marcelo Ebrard, que tuitou fotos da "troca de tacos" entre os ambos presidentes no Salão Oval, visto que "o beisebol é um espaço comum".
Ele disse que os temas abordados foram os investimentos que o T-MEC trará, a coordenação para enfrentar a COVID-19, e a "visão dos dois presidentes sobre pandemia e recuperação econômica".
A porta-voz da Casa Branca, Kayleigh McEnany, disse a jornalistas que a possibilidade de o México pagar pelo muro que Trump quer erguer para frear a imigração ilegal e o narcotráfico não emergiu na reunião entre os dois mandatários enquanto ela esteve presente.
Também parecem terem sido mencionados temas espinhosos da relação bilateral: a colaboração do México para frear os pedidos de asilo dos migrantes centro-americanos, o destino de centenas de milhares de jovens mexicanos que chegaram ilegalmente aos Estados Unidos ainda crianças, a violência do narcotráfico, e a Venezuela, um assunto sobre o qual o colega de Ebrard, Mike Pompeo, disse esperar que o México fizesse mais pela democracia.
No Twitter, Biden disse que Trump "propagou o racismo" contra a comunidade latina nos Estados Unidos desde 2016.
"Precisamos trabalhar em associação com o México. Precisamos restaurar a dignidade e a humanidade em nosso sistema de imigração. Isto é o que farei como presidente", prometeu.
Talvez a maior primícia da visita tenha sido dada por Obrador mesmo antes de pousar em Washington. Ao viajar em voo comercial por sua política de austeridade, o presidente mexicano foi visto pela primeira vez em público com máscara, uma imagem de Trump ainda inexistente. Nesta quarta, nenhum dos dois usou a peça.