Começa na segunda-feira, 17, uma nova fase da eleição americana, com as convenções partidárias - que oficializam as candidaturas. A primeira é a do Partido Democrata, que pela primeira vez ocorrerá de maneira remota, em razão da pandemia. Em seu discurso, Joe Biden pretende se colocar como candidato capaz de unir os EUA.
Nos últimos meses, Biden buscou uma composição com a ala progressista do partido, ao convidar assessores de Bernie Sanders e Elizabeth Warren - adversários nas primárias - para grupos de trabalho. Sanders e Warren discursarão em horário nobre na convenção.
Os democratas precisam de um comparecimento recorde em novembro, com apoio de jovens, mulheres e negros em escala semelhante ao que teve Barack Obama - coisa que Hillary Clinton não conseguiu.
O anúncio de Kamala Harris como vice da chapa presidencial é parte da busca para repetir a "coalizão Obama", como os democratas chamam a histórica aliança entre negros, jovens, mulheres e brancos do Meio-Oeste, que levou o primeiro negro à Casa Branca.
Kamala é a primeira mulher negra a concorrer como vice por um grande partido nos EUA e sua história pessoal como filha de imigrantes atende a anseios da parcela do eleitorado que cobra maior diversidade no Partido Democrata, ao mesmo tempo em que mantém a percepção de que o governo Biden será centrista e moderado.
Com discurso marcado para quarta-feira, Kamala terá boa parte das atenções da mídia e do público pelo caráter histórico de sua nomeação e pela perspectiva de que seja a potencial candidata democrata em 2024 - se vencer, Biden teria 82 anos e ainda não é certo que disputaria a reeleição.
Sanders discursará na segunda, no primeiro dia, que será encerrado com a fala de Michelle Obama. A programação da terça-feira prevê congressistas, como a estrela jovem Alexandria-Ocasio-Cortez, além do ex-presidente Bill Clinton. Quem encerra o segundo dia é Jill Biden, mulher do candidato.
Na quarta-feira estão previstos os discursos de Hillary, Warren, Kamala e do ex-presidente Obama. Biden aceitará a nomeação do partido no último dia, na quinta-feira, quando se tornará oficialmente o candidato democrata.
"A convenção é para todos, não importa em quem você votou no passado", disse a responsável pelo programa da convenção democrata, Stephanie Cutter, que batizou o encontro de "Unindo a América".
Em 2016, Hillary usou a convenção para pedir que os eleitores rejeitassem "forças" que ameaçavam dividir o país. O recado era para o então candidato Donald Trump, mas o discurso não foi suficiente. Quatro anos depois, Biden argumentará que o país já está dividido e precisa de uma reunificação.
O evento de quatro dias será online em razão da necessidade de isolamento social. A ideia é passar uma mensagem unificada de que todo o partido está ao lado de Biden e, mais importante, contra Trump.
"As pesquisas têm sido consistentes nos últimos meses, dando vantagem a Biden. O que vamos ver, portanto, é o que temos visto de Biden no último ano e meio: um discurso sobre seus planos e sua habilidade de restaurar a nação e unir as pessoas", afirmou Mark Feierstein, ex-assessor da Casa Branca durante a presidência de Obama.
Desta vez, a convenção será diferente da que confirmou Obama, em 2008. Na época, o candidato democrata estava tecnicamente empatado com o republicano John McCain e precisava usar o momento para reacender paixões entre o eleitorado.
Há uma semelhança, no entanto: tanto Obama, em 2008, como Biden, em 2020, buscam mostrar na convenção que são capazes de tirar o país do buraco. No caso de Obama, a crise era financeira. Biden tem a seu favor o fato de o adversário ser o atual presidente, que tem tropeçado durante as crises social, sanitária e econômica.
A média das pesquisas agregada pelo site Five Thirty Eight indica que 57,3% dos americanos desaprovam a resposta de Trump à pandemia - e 39,2% aprovam.
Os EUA são o país com maior número de vítimas da covid-19, mais de 5 milhões de infectados, 170 mil mortos e uma taxa diária de óbitos crescente, em razão da reabertura promovida de maneira desigual em diferentes partes do país. A aprovação de Trump se mantém em 41%, pouco abaixo dos 44% registrados no início do ano e antes do surto de covid.
Os democratas devem descrever Trump como uma figura polarizadora, inexperiente, com foco no próprio interesse e desprezo pelo conhecimento científico. Enquanto isso, Biden será apresentado como um político hábil e disposto a unir diferentes grupos sociais, comprometido com o serviço público, ao qual dedicou toda a carreira e assessorado por especialistas e cientistas.
Marcada para julho, a convenção precisou ser adiada para agosto em razão da pandemia e, mais recentemente, remodelada. Até o início do mês. Biden planejava fazer o discurso em Milwaukee, local do evento e maior cidade de Wisconsin, um importante Estado-chave. Mas a campanha democrata recuou e decidiu transmitir o discurso de Biden e dos demais de maneira virtual.
Uma das principais plataformas do democrata é mostrar que sua campanha trata com seriedade a pandemia, em oposição aos republicanos, o que fez Biden desistir da ideia de uma aparição presencial. Estádios lotados, barracas de venda de souvenir, voluntários, artistas e jornalistas do mundo todo andando pelas ruas darão lugar às telas de computador.
"Eles não falarão para grandes plateias, gritando e acenando. Então, a dinâmica será bem diferente, porque não terão a empolgação da plateia. Não está claro como os discursos acontecerão e se conseguirão manter o mesmo nível de entusiasmo", afirma Eric Heberlig, professor de ciência política da Universidade da Carolina do Norte e autor de livro sobre as convenções partidárias. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.