O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e seu rival na disputa pela Casa Branca, Joe Biden, trocaram insultos nesta terça-feira (29) durante o primeiro debate entre os candidatos à presidência, questionando mutuamente as capacidades do adversário em uma noite tensa e caótica, a 35 dias das eleições.
Biden chegou a perguntar se Trump não calaria a boca em um determinado momento do debate, marcado por diversas interrupções.
Não houve aperto de mão quando os dois septuagenários subiram ao palco e, embora isso se deva às restrições pela pandemia da covid-19, a ausência do tradicional gesto cordial simbolizou a profunda divisão no país, em contagem regressiva para as eleições de 3 de novembro.
Trump, 74 anos, acusou Biden, 77, de ser "socialista", mas o candidato democrata retrucou afirmando que "todo mundo sabe" que o presidente "é um mentiroso".
O mandatário republicano interrompeu constantemente Biden e o corrigiu diversas vezes. O moderador do debate, o jornalista Chris Wallace, chegou a pedir a Trump que deixasse o oponente falar.
"Parece que estou debatendo com você (Wallace), não com , mas isso não me surpreende", respondeu Trump.
Irritado com as constantes interrupções, Biden perdeu a paciência: "Você não vai calar a boca, cara?", disse o ex-vice-presidente de Barack Obama. Trump, porém, manteve a estratégia de tentar desestabilizar seu adversário, que era gago quando criança e às vezes trava brevemente ao discursar.
- "Não há nada de inteligente em você" -
À medida que o debate avançava, a tensão também crescia. Trump chegou a dizer a Biden: "Não venha me falar de inteligência. Não há nada de inteligente em você".
Diante das contínuas interrupções e dos deboches de Trump, e apesar das tentativas de Wallace de manter a ordem e de respeitar os tempos de fala, Biden se queixou: "É difícil falar com este palhaço, perdão, esta pessoa".
Também acusou a Trump de ser o "cachorro" do presidente russo, Vladimir Putin.
O debate aconteceu em Cleveland, Ohio, um dos estados-pêndulo que pode mudar de preferência de uma eleição para outra e onde Trump foi vitorioso em 2016. Biden lidera atualmente as pesquisas no estado com 49% das intenções de voto, contra 45,7% para o atual presidente.
A pandemia, responsável por 204.762 mortes nos Estados Unidos, também se mostrou presente no debate. As poucas pessoas presentes no auditório usaram máscaras e os assentos foram separados para respeitar o distanciamento social.
Biden criticou a gestão da crise por Trump e tentou sensibilizar os eleitores: "Quantos de vocês levantaram hoje de manhã e tinham uma cadeira vazia na cozinha, porque alguém morreu de covid-19?".
- Trump evita pergunta sobre reconhecimento de resultado -
Biden se comprometeu a respeitar os resultados das eleições de 3 de novembro, "após a contagem de todas as cédulas", enquanto Trump evitou o assunto.
"Se for eu, tudo bem. Se não, apoiarei o resultado", prometeu o ex-vice-presidente.
Trump não respondeu a pergunta e, diante da possibilidade de que a pandemia provoque o aumento dos votos por correio, ele reiterou a acusação, sem provas, de que este tipo de votação pode implicar fraude.
O resultado pode não ser conhecido por meses, disse. "Isto não vai terminar bem", afirmou.
Questionado pelo moderador se condenaria sem reservas os supremacistas brancos, o presidente republicano não apresentou uma resposta direta: citou os "Proud Boys", um grupo nacionalista que prega a superioridade da raça branca, a quem pediu que "recuem e esperem".
Horas depois, os "Proud Boy" adotaram a frase de Trump, publicada ao lado de seu logo na rede social Telegram.
Trump chegou ao debate na ofensiva, decidido a recuperar o terreno perdido contra seu rival, que está em vantagem nas pesquisas há semanas. Também defendeu a decisão de preencher o quanto antes a vaga na Suprema Corte dos Estados Unidos deixada pela juíza progressista Ruth Bader Ginsburg, que faleceu na semana passada.
"Nós ganhamos a eleição, as eleições têm consequências", afirmou Trump, em referência à indignação dos democratas com a indicação da juíza conservadora Amy Coney Barrett para a vaga de Ginsburg.
"O povo americano merece ter voz sobre quem será indicado para a Suprema Corte", respondeu Biden.
Se confirmados os números das pesquisas, Trump poderá se tornar o primeiro presidente em 25 anos a não conseguir um segundo mandato, repetindo o feito de seu colega republicano George H. W. Bush, derrotado por Bill Clinton em 1992.
Trump também perdeu seu principal trunfo político nos últimos meses: uma gestão da economia que levou o desemprego ao nível mais baixo em décadas, mas que foi devastado pela pandemia que destruiu milhões de postos de trabalho.
Na última hora, uma bomba caiu sobre os republicanos: as revelações do jornal "The New York Times" que apontam que Trump pagou apenas 750 dólares em impostos federais em 2016, ano em que ganhou a presidência. O artigo indica, ainda, que as empresas de Trump sofrem "perdas crônicas", o que pode minar sua imagem como um poderoso empresário e bom administrador.
O presidente tentou evitar o tema durante o debate. Trump insistiu apenas em que pagou "milhões" de dólares de impostos, sem revelar detalhes.
Em resposta, Biden divulgou sua última declaração do imposto de renda e comprovou ter pago cerca de 300.000 dólares em impostos no ano passado. "O povo americano merece transparência", afirmou.
"Trump transferiu seu estilo pouco presidencial ao palco esta noite. Este foi um dos debates mais caóticos e repleto de ataques da história dos Estados Unidos", afirmou à AFP o analista Mitchell S. McKinney, da Universidade de Missouri.
Os dois candidatos voltarão a debater em 15 e 22 de outubro, em Miami e Nashville (Tennessee), respectivamente.