O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, pediu nesta segunda-feira (26) a seus concidadãos que boicotem os produtos franceses, em meio a uma disputa com seu contraparte francês, Emmanuel Macron, por suas declarações em defesa da publicação de caricaturas do profeta Maomé.
"Assim como na França alguns dizem, 'não comprem as marcas turcas', me dirijo daqui à minha nação: 'Sobretudo não deem atenção às marcas francesas, não as comprem'", disse Erdogan.
"Está sendo realizada uma campanha de linchamento contra os muçulmanos parecida à dos judeus da Europa antes da Segunda Guerra Mundial", acrescentou.
Em duas ocasiões neste fim de semana, o presidente turco questionou a "saúde mental" de Macron, denunciando suas posições frente aos muçulmanos.
No cerne da revolta de Erdogan estão as declarações que Macron deu na semana passada, prometendo que a França não abriria mão das caricaturas, nem da liberdade de expressão.
O presidente francês disse estas palavras durante uma homenagem nacional a Samuel Paty, o professor decapitado em um ataque de um extremista islâmico por mostrar caricaturas do profeta Maomé durante uma aula.
O presidente francês obteve apoio na Europeia, a começar pelo primeiro-ministro holandês, Mark Rutte. Os comentários de Erdogan contra Macron "são inaceitáveis".
"A Holanda se mantém firme junto da França na defesa dos valores comuns da UE. Pela liberdade de expressão e contra o radicalismo", escreveu no Twitter.
A chanceler alemã, Angela Merkel, tachou de "difamatórias" e "inaceitáveis" as declarações de Erdogan e expressou sua "solidariedade" com Paris.
O primeiro-ministro italiano, Giuseppe Conte, também as considerou "inaceitáveis".
O chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, e o primeiro-ministro grego, Kyriakos Mitsotakis, também expressaram apoio a Macron.
- "Chantagem" -
Mas no mundo muçulmano, onde qualquer representação de Maomé é tabu, as declarações do presidente francês geraram reações de repúdio.
Desde a noite de sábado, produtos franceses começaram a ser retirados das gôndolas dos supermercados de Doha, capital do Catar.
Na Jordânia, vários vídeos nas redes sociais mostravam produtos franceses retirados das prateleiras de supermercados ou substituídos por bens de outros países.
Os vídeos eram acompanhados de hashtags, como #FranceBoycott e #OurProphetisaredline" (Nosso profeta é uma linha vermelha).
Também foram feitas convocações a manifestações nesta segunda-feira na Faixa de Gaza e na terça em Amã. Durante o fim de semana, foram celebrados comícios na Tunísia e em algumas regiões da Síria.
"Não vamos ceder à chantagem", reagiu Geoffroy Roux de Bézieux, presidente da principal organização patronal da França, a Medef, que pediu às empresas francesas que coloquem seus "princípios" à frente dos negócios.
As empresas de alimentos, itens de luxo e cosméticos podem ser particularmente afetadas por este boicote nos países do Magreb e do Oriente Médio.
- Ataques de hackers contra sites franceses -
Dezenas de sites franceses na internet foram alvo nos últimos dias de ataques de hackers, que publicaram mensagens com propaganda islamita.
Mensagens como "Vitória para Maomé, Vitória para o Islã e Morte à França", além de uma montagem retratando Macron como um porco foram publicadas em páginas na internet de associações de aposentados, empresas ou prefeituras de pequenas cidades.
A ministra francesa da Cultura, Roselyne Bachelot, apelou nesta segunda-feira ao "apaziguamento". A França não está lutando "contra os muçulmanos franceses", mas contra "o islamismo e o terrorismo", assegurou.
Na véspera, o ministério francês de Relações Exteriores havia afirmado que "os chamados ao boicote são inúteis e devem parar imediatamente, assim como todos os ataques ao nosso país, que são usados como ferramenta por uma minoria radical".
Macron tuitou pouco depois: "Apreciamos a liberdade, garantimos a igualdade, vivemos a fraternidade com intensidade. Nada nos fará recuar, nunca".
Além de Erdogan, outros líderes muçulmanos criticaram Macron.
O Marrocos condenou "energicamente a publicação de caricaturas ultrajantes para o islã e o profeta".
Os talibãs, por sua vez, tacharam de "ignorantes e islamofóbicas" as declarações de Macron.
O Alto Conselho Islâmico da Argélia criticou uma "campanha virulenta" contra o islã e lamentou "o aparecimento de grupos" que, "em nome da liberdade de expressão, insultam o islã e seu Mensageiro".
"O Alto Conselho Islâmico (HCI) condena energicamente esta virulenta campanha contra o profeta Maomé", prossegue este órgão, cujos membros são designados pelo presidente da República.