O arcebispo de Washington, Wilton Gregory, está prestes a fazer história: no sábado (28), ele se tornará o primeiro cardeal negro americano. Até lá, encadeia as entrevistas como uma estrela de Hollywood.
O prelado de 72 anos, que está atualmente em quarentena em Roma, não parece nervoso às vésperas da grande cerimônia, enquanto fala em videoconferência sobre a "importante escolha" que o papa Francisco fez ao mostrar "seu apoio à comunidade afro-americana".
"Sou apenas uma pessoa, mas, neste momento, sou um indivíduo simbólico", disse à AFP este homem de Chicago, com um grande sorriso.
Recorda, porém, que o padre Augustus Tolton, nascido no Missouri de pais escravos no século XIX e o primeiro padre afro-americano (ordenado em Roma porque foi rejeitado pelos seminários de seu país), poderia ser beatificado.
Em junho, o primeiro arcebispo negro de Washington não hesitou em criticar a tentativa do presidente dos Estados Unidos de "intimidar" a multidão por meio da religião. Donald Trump acabava de posar com uma Bíblia nas mãos em frente a uma igreja próxima à Casa Branca, um dia após a brutal dispersão de manifestantes antirracistas.
O prelado também é conhecido por defender a "tolerância zero" contra os abusos sexuais no clero, especialmente quando foi presidente da Conferência dos Bispos dos Estados Unidos no início dos anos 2000.
Neste contexto de escândalos que atingem a Igreja, a Santa Sé acaba de divulgar um relatório devastador sobre o influente ex-cardeal Theodore McCarrick, ex-arcebispo de Washington expulso do sacerdócio em 2019, após ser condenado por abuso sexual de menores e adultos.
"Um relatório triste, mas importante para o futuro", tendo em vista a revisão do processo de seleção dos bispos, afirma Wilton Gregory.
Outrora chamados de "príncipes da Igreja", no sábado, serão 13 novos cardeais escolhidos pelo papa Francisco.
- Reflexo da "diversidade da Igreja" -
Em quase oito anos de pontificado, o papa argentino de 83 anos selecionou a maioria dos "cardeais eleitores" (que escolherão seu sucessor) entre os prelados muitas vezes de acordo com suas ideias e com menos de 80 anos.
"O Santo Padre se esforçou para incluir no colégio cardinalício diferentes raças, línguas e culturas", felicita Dom Gregory.
"Ele nomeou cardeais em países que nunca tiveram. Claramente deseja um colégio de cardeais que reflita a grande diversidade da Igreja", acrescentou.
Conforme estabelecido, os novos cardeais se ajoelharão em frente ao papa no sábado para receber seu barrete e anel cardeal na suntuosa Basílica de São Pedro.
Devido ao coronavírus, a audiência será reduzida na cerimônia. A pandemia também impediu que dois prelados asiáticos fizessem a viagem.
Monsenhor Gregory viajou para Roma com um assistente, sem família, ou amigos, "apenas feliz por participar com o papa Francisco em um consistório que será incomum".
O futuro cardeal também tem a imagem de um homem moderado e de diálogo, em uma Igreja Católica norte-americana muito dividida entre progressistas e ultraconservadores, muitas vezes hostis ao papa.
"Isso deve mudar. As divisões que aparecem tão duramente na espera pública não correspondem à nossa vocação na Igreja", concluiu o arcebispo.