A nove dias para o fim de seu mandato, Crivella foi preso ao amanhecer em sua casa na Barra da Tijuca e, após audiência que confirmou sua prisão preventiva, foi levado a uma penitenciária na zona norte da cidade.
Horas depois e enquanto aguardava a definição do habeas corpus apresentado pela defesa, o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Humberto Martins, concedeu prisão domiciliar a Crivella, mas o prefeito terá de usar uma tornozeleira eletrônica, não poderá manter contato com terceiros e deverá entregar seus telefones e computadores, entre outras restrições.
Em seu argumento, Martins considerou que a prisão preventiva não é justificável e que Crivella, 63, faz parte do grupo de risco da covid-19.
A desembargadora Rosa Helena Penna Macedo Guita, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e responsável por autorizar a operação que prendeu o prefeito, determinou também o afastamento de Crivella do cargo, a quem apontou como "chefe de uma organização criminosa (...) que atuava dentro da prefeitura".
Crivella, que nas eleições de novembro, em que foi derrotado, teve o apoio do presidente de extrema-direita Jair Bolsonaro, declarou ser alvo de "perseguição política".
"Fui o prefeito que mais atuou contra a corrupção no Rio de Janeiro". Em seguida, ele pediu "justiça".
- Organização criminosa-
No total, foram emitidas sete ordens de prisão, seis delas cumpridas.
Entre os detidos está Rafael Alves, acusado de ser o chefe do suposto "QG da propina" na prefeitura, irmão de Marcelo Alves, ex-presidente da Riotur.
Também foi detido Mauro Macedo, ex-tesoureiro de campanhas de Crivella e primo de Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), de quem o prefeito do Rio é sobrinho.
De acordo com a investigação do MP do Rio de Janeiro, iniciada em 2018 com a delação de um doleiro, empresas que desejavam assinar contratos com a Riotur pagavam propinas ao empresário Rafael Alves.
"A organização criminosa arrecadou dos empresários pelo menos R$ 50 milhões, foi o que conseguimos apurar. Agora, quanto foi para cada um, aí realmente é algo que não temos essa previsão", disse em coletiva de imprensa o vice-procurador-geral Ricardo Ribeiro Martins.
Esses pagamentos eram efetuados apesar de a prefeitura "não ter dinheiro nem para pagar o 13º salário" de seus funcionários e acumular atrasos salariais nos hospitais e outras instituições municipais, acrescentou.
- Mandato polêmico -
O desacreditado prefeito da "Cidade Maravilhosa" cederia sua cadeira em 1º de janeiro a Eduardo Paes (MDB, centro-direita), que o derrotou em novembro por quase 30 pontos percentuais (64% a 36%). A breve transição ficará a cargo do presidente da Câmara Municipal, Jorge Felipe (DEM, centro-direita).
Durante o mandato, Crivella, de 63 anos, foi objeto de várias tentativas de processos de impeachment por sua má gestão.
Este último foi motivado por um escândalo denunciado pela TV Globo e apelidado de "Guardiões de Crivella", grupo de funcionários públicos que intimidava jornalistas ao fazer reportagens em hospitais municipais sobrecarregados pela pandemia.
O estado do Rio, com sua capital de 6,7 milhões de habitantes, é proporcionalmente o mais afetado pela pandemia que já deixou mais de 188 mil mortos no Brasil.
Crivella também foi acusado de misturar política e religião e de favorecer os membros de sua igreja.
Em julho de 2018, segundo o jornal O Globo, ele teria prometido em um encontro com pastores evangélicos que os fiéis da IURD teriam prioridade para cirurgias de catarata em clínicas municipais.
Recentemente, o MP abriu uma investigação pelo suposto uso da Igreja Universal do Reino de Deus para lavar dinheiro procedente de corrupção.
Em sua gestão, Crivella deu as costas aos grandes eventos turísticos marcados pelos excessos de álcool e sensualidade, como o carnaval, de importante impulso econômico para a região.
- Corrupção crônica no Rio -
Esta prisão é mais um episódio sombrio na história do estado do Rio de Janeiro, que enfrenta uma permanente crise de segurança.
O governador do estado, Wilson Witzel, está temporariamente destituído por suspeitas de corrupção na área da saúde, em plena pandemia de coronavírus.
Com Witzel, cinco dos seis governadores do Rio em funções desde 1998 tiveram problemas com a Justiça, e quatro deles foram presos em algum momento.
O caso mais emblemático é o de Sérgio Cabral (2007-2014), preso desde 2016 e condenado a quase 300 anos de prisão em diferentes casos de corrupção, incluindo um relacionado às obras de reforma do estádio do Maracanã para a Copa do Mundo de 2014.
RIO DE JANEIRO