Jornal Estado de Minas

BOGOTÁ

Protesto contra projeto de reforma tributária na Colômbia desafia restrições à covid

Dezenas de Milhares de pessoas protestaram nesta quarta-feira (28) na Colômbia contra um projeto de reforma tributária promovido pelo governo de Iván Duque, em meio ao maior pico de contágios e mortes por covid-19 no país.



"Não aceitamos a reforma tributária, estamos pensando em nossos filhos, em nós mesmos (...), ou morremos de vírus ou de fome", declarou à AFP Víctor Córdoba, sapateiro de 33 anos que vestia uma camisa com as cores da bandeira colombiana em Bogotá.

Sindicatos trabalhistas, professores, organizações civis, indígenas e outros setores inconformados rejeitam o projeto que está em andamento no Congresso, por considerarem que prejudica a classe média e é inadequado em plena crise desencadeada pela pandemia.

Em Bogotá, epicentro dos protestos, milhares de manifestantes avançam de diferentes regiões para o centro da cidade.

Ao ritmo de tambores e sob lemas como "parar para avançar, viva a greve nacional", multidões passam com alguns bloqueios nas ruas.

O Ministério da Defesa destacou 47.500 soldados em todo o país e denunciou alguns distúrbios em Cali (sudoeste). Indígenas Misak derrubaram naquela cidade uma estátua de Sebastián de Belalcázar, conquistador espanhol do século XVI.

Segundo o prefeito de Cali, Jorge Iván Ospina, uma pessoa morreu em atos "relacionados à manifestação". A prefeitura antecipou o toque de recolher previsto por conta da pandemia. Das 13h de quarta-feira às 17h de domingo, a mobilidade e o consumo de bebidas alcoólicas estão restritos.



Medellín (noroeste), Barranquilla (norte), bem como outras cidades aderiram com uma participação maciça.

Pela primeira vez, a Colômbia ultrapassou as 400 mortes diárias pelo coronavírus em 19 de abril e, desde então, os números não diminuem. Com apenas 17% das unidades de terapia intensiva disponíveis, o sistema hospitalar está sob máxima pressão.

- "Mais medo do governo do que do vírus" -

O novo dia de protestos foi convocado pelo Comitê Nacional de Desemprego, que desde 2019 organiza inúmeras mobilizações para exigir uma mudança de rumo do governo.

Mas algumas vozes pediram sem sucesso a suspensão das manifestações, que coincidem com a onda mais mortal da covid-19 em treze meses de pandemia.

Ontem, um tribunal administrativo ordenou adiar os protestos. Uma decisão apoiada pela Defensoria do Povo, que alertou sobre a "inconveniência de convocar mobilizações sociais neste momento tão perigoso para a saúde e a vida".

"Estamos cansados de todos os abusos que há sobre a população, cansados do nosso presidente não fazer nada a respeito. Temos mais medo do governo do que do vírus", lamentou Felipe Zapata, 24, em Bogotá.



Duque, que só tem mais um ano de mandato, possui uma popularidade de 33%, segundo a pesquisa mais recente da Invamer.

Embora sua reforma tributária tenha sido apresentada como uma ferramenta para amenizar a crise gerada pela pandemia, a iniciativa enfrenta obstáculos em um Legislativo sem maiorias. Inclusive o partido do governo, o Centro Democrático, aponta objeções no projeto.

- Reforma "impopular" -

Para o professor de Ciência Política da Universidade del Rosario, Yann Basset, o governo "está em situação muito difícil" porque "o descontentamento e a rejeição à reforma foram bastante generalizados e o governo não tem muita margem de manobra".

No entanto, Duque sabia que apresentar o projeto "um ano antes das eleições e também no meio de uma pandemia que gera muitos problemas econômicos e sociais (...) seria extremamente impopular", acrescentou o especialista.

O presidente pretende arrecadar o equivalente a cerca de 6,3 bilhões de dólares entre 2022 e 2031 com a reforma.



Entre as propostas que causam maior indignação está a taxação dos serviços básicos em áreas de classe média alta, dos funerais e criar um imposto de renda para quem ganhar mais que 656 dólares mensais, em um país onde o salário mínimo é de 248 dólares.

Com 50 milhões de habitantes, a Colômbia é o terceiro país da América Latina com maior número de casos (2,8 milhões), atrás do Brasil e da Argentina. Em relação ao número de mortos (72.200), só é superada por Brasil e México.

Em seu pior desempenho em cinquenta anos, o Produto Interno Bruto (PIB) do país despencou 6,8% em 2020. O desemprego alcançou o índice de 18,1% em fevereiro, quando a informalidade abrange quase metade da população.

Apesar das chuvas em Bogotá, as mobilizações continuaram pela tarde. Felipe Ospina, cineasta de 23 anos, garantiu que continuará protestando "até que desmontem essa reforma tributária".

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