"Desenvolver o multilateralismo é um trabalho a ser realizado de forma colegiada", assinalou o ministro durante uma videoconferência ministerial do Conselho de Segurança da ONU organizada por seu par chinês, Wang Yi. "Nos últimos tempos, no entanto, somos testemunhas de tentativas de colocar em prática uma ordem internacional para impor a todos novas regras, elaboradas em instâncias não inclusivas", criticou.
"É nesse contexto que o governo americano deseja organizar a Reunião de Cúpula pela Democracia, mas corre o risco de tornar as relações internacionais ainda mais tensas e revelar as linhas de fratura no mundo, quando o que precisamos é de um objetivo comum", indicou Lavrov. "Certamente, serão os Estados Unidos que irão determinar a lista de países convidados para essa cúpula", ironizou.
Washington ainda não apresentou datas ou detalhes sobre o formato dessa ideia ao presidente Joe Biden. Sem citar a Rússia ou a China, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, havia afirmado que os Estados Unidos continuariam a se opor "com força aos países que minarem a ordem internacional fingindo que as regras aprovadas por todos não existem ou violando as mesmas à vontade".
- 'Cheque em branco' -
"Alguns estimam que os governos podem fazer o que quiserem dentro de suas fronteiras e que os direitos humanos são valores subjetivos. Mas afirmar a jurisdição nacional não dá um cheque em branco a nenhum Estado para escravizar, torturar, fazer desaparecer, limpar etnicamente seu povo ou violar os direitos humanos", assinalou Blinken, fazendo uma referência implícita à repressão aos uigures na China.
O chefe da diplomacia americana também atacou os países que não respeitam "a igualdade soberana" dos Estados reconhecida pela Carta da ONU, tentando "recriar as fronteiras de outro país", o que pareceu uma alusão à anexação da Crimeia pela Rússia.
"A criação de uma aliança para o multilateralismo por iniciativa da Alemanha e da França pode parecer natural, mas esses dois países têm outras intenções. Desejam publicar documentos para que a União Europeia seja a pedra angular do sistema multilateral", denunciou Lavrov. "É uma forma de impor a sua exclusividade, desafiando a igualdade entre os Estados", protestou o chanceler.
"A criação de alianças estreitas envolvendo questões que já são discutidas na ONU ou em órgãos especializados (como o chamado pelo respeito aos direitos humanos, assinado por 43 Estados) é prova de uma certa unipolaridade do Ocidente", estimou Lavrov. "Não vemos o mundo multilateral como uma forma de trabalharmos juntos para tomar decisões coletivas, e sim como uma forma de impor as próprias regras aos demais", insistiu o ministro russo, bastante elogiado por Wang Yi após seu discurso.
A China considera que "dividir o mundo em campos ideológicos vai de encontro ao multilateralismo", como havia dito antes o ministro chinês. Sem citar os Estados Unidos, ele estimou que os membros da ONU deveriam "buscar a igualdade e a justiça, não a hegemonia. Devemos nos concentrar em ações, não em discussões", apontou Wang, pedindo um sistema de governança mundial "mais justo e igualitário".
Sobre o compromisso da China, o ministro comemorou que seu país (segundo provedor financeiro da ONU, atrás dos EUA) tenha se tornado o maior contribuinte dos Capacetes Azuis (2.464 dos quase 100 mil mobilizados no mundo) entre os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança.
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