O único pedido é que seja feita justiça, mas parece difícil alcançá-la em um país onde 94% dos crimes contra as mulheres ficam impunes, segundo a Conavim, entidade governamental que trabalha em sua prevenção.
"Se a autoridade liberar, onde irei para me proteger? Onde irei me esconder, se for ameaçada de morte? Onde estão as autoridades que deveriam proteger?", diz Oliva, de 58 anos, à AFP.
A mulher se move lentamente com a ajuda de um andador devido aos golpes do ex-companheiro, que lhe deixaram hematomas nos braços, mas também o desejo firme de punição.
Seu caso é apenas mais um entre milhares de uma tragédia que não para. O governo registrou 423 feminicídios entre janeiro e maio, um aumento de 7,1% em relação ao mesmo período de 2020, que encerrou com 967 casos.
O caminho de Oliva para chegar à audiência foi difícil.
Com voz cansada, ela diz que a polícia do estado central do México reduziu o ataque a uma briga de um casal e não coletou um depoimento completo.
Mas com a ajuda de uma ativista, o lento aparato da justiça começou a se mover. Surpreso ao vê-la com um andador, o juiz observou fotos dos espancamentos e mensagens ameaçadoras do agressor e sua família.
"O que a justiça está esperando? Ele me matar?". O homem foi colocado em prisão preventiva.
- "Nossa palavra é colocada em dúvida" -
Em uma prisão no leste da capital, Daniela Sánchez acompanha uma mulher a uma audiência contra seu agressor.
Funcionária pública, aos 37 anos, Sánchez busca justiça pelos abusos físicos e psicológicos que afirma ter sofrido de seu ex-companheiro durante anos.
"Desde o primeiro momento em que nos aproximamos deles (as autoridades), eles duvidam da nossa palavra, das marcas em nossos corpos", diz Daniela após exibir uma faixa e exigir punição com um megafone.
Para Fátima Gamboa, codiretora da organização civil Equis Justicia, o México necessita de um quadro institucional capaz de "responder a um fenômeno tão complexo, multifatorial e cultural como a violência contra a mulher".
Em uma análise de 120 julgamentos de todo o país, a ONG constatou que em mais de 80% dos casos os juízes não se pronunciaram sobre a violência de gênero, nem analisaram se as condições de risco persistiam e não ditaram medidas de proteção para as vítimas.
"Não é uma administração da justiça com perspectiva de gênero", diz Gamboa.
O governo tem implementado diversas iniciativas para prevenir e erradicar a violência contra as mulheres, como os Centros de Justiça - que, segundo ele, já assessoraram 100 mil pessoas este ano - ou os abrigos para mulheres em situação de risco. Também realiza acompanhamento especial a duzentos homicídios.
Enquanto isso, na Cidade do México, todos os assassinatos de mulheres são inicialmente investigados como feminicídios.
- Batalha "exaustiva" -
Para Gris, 34 anos, o processo contra o ex-parceiro foi cansativo.
Bêbado, o homem invadiu a pequena cozinha que formou com outras mulheres para fugir do desemprego e da violência sexista, acentuada durante a pandemia da covid-19.
Segundo a denúncia, o agressor as espancou e destruiu os móveis. Desde então, Gris - que prefere não dar seu nome completo - está decepcionada com a justiça.
"É triste, cansativo", lamenta.
A lista de denúncias é longa: a polícia demorou 45 minutos para chegar, o agressor ainda está em liberdade e o caso foi classificado como violência doméstica.
Chío, uma das cozinheiros, pergunta o mesmo que Oliva e Sánchez: "O que é necessário neste sistema para que possam realmente iniciar uma investigação com dignidade em relação às mulheres?"
audima